terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

Derby à moda do Porto

Estas sabem melhor do que qualquer recital que termine em goleada. Um derby no verdadeiro sentido da palavra. A raça, a garra e o crer a terem que se sobrepor à qualidade durante grande parte do jogo. A motivação e determinação que crescem à medida que o campo inclina, com o patrocínio do jovem árbitro a quem um dia chamámos «um wonderboy apropriado para Maxi Pereira» - e que agora ironicamente o expulsou.

Boavista, aquele Boavista de que tanto gostamos: sarrafeiros, sujos, a olharem para nós como se tivessemos canela até ao pescoço. Esta é a imagem de marca do Boavista nos derbys. E que gozo nos dá vencê-los após estas circunstâncias. Não imaginamos um Boavista de nenhuma outra forma. Ajudam a apimentar os derbys desta forma, diga-se. 

Este tipo de jogos só servem para enrijecer os jogadores. Não viram ninguém a encolher-se, a tirar o pé, a deixar-se afetar pela pressão. Pelo contrário: foi uma prova cabal do espírito deste grupo de trabalho, que teve como consequência uma boa vitória.




Óliver e o golo (+) - Tão simples, tão difícil, tão bom: toda a inteligência de Óliver neste lance, mas também um exemplo de como toda a equipa foi capaz de estar bem colocada nesta jogada. É Marcano, longe de grande área, que vai junto à linha obrigar a puxar o lateral-esquerdo. Com isso, abriu-se um enorme espaço na zona interior para Corona - que está sempre em posição regular pois Brahimi e Soares estão a empurrar a linha defensiva. O passe de Óliver é sublime, pois foi capaz de esperar pelo melhor momento para aproveitar a melhor solução. O seu passe deixa para trás 3 jogadores do Boavista e coloca Corona numa posição perfeita para cruzar. Nuno pode imaginar mil e uma formas para o FC Porto jogar, mas pode ter a certeza de uma coisa: Óliver e mais 10. E com Óliver em campo, quem está à sua volta jogará sempre melhor.

As zonas de ação de Óliver contra o Boavista
A partir daqui, o cruzamento de Corona foi perfeito, a fazer a bola cair entre o guarda-redes e o último defesa, para Soares aparecer. E este não é um golo em que era preciso encostar: Soares está sozinho na grande área. Corona só o tinha a ele para finalizar. A bola foi lá direitinha, mas Soares soube atacar o espaço certo - Brahimi já estava, também ele muito bem, pronto para a segunda bola nas costas. Um excelente golo, e com uma boa jogada ganhou-se o derby.


Iván Marcano (+) -  O Boavista teve quatro tentativas de remate à baliza: duas foram defendidas por Casillas... e as outras foram cortadas por Marcano. Continua numa forma irrepreensível: o seu sentido posicional é simplesmente perfeito. Tem estado sempre bem colocado, chega a todas as bolas, voltou a ganhar todos os lances pelo ar e ajudou a que Boly também fizesse um jogo positivo. Um percurso à Pedro Emanuel: chega ao FC Porto numa idade já avançada, sem que dêem muito por ele, começa de forma algo intermitente na equipa, agarra o lugar e torna-se indiscutível não só pela sua qualidade, mas pela forma como personifica tudo o que os adeptos querem ver num central. Se quiser bater um penaltyzinho decisivo, a malta também agradece. 

Brahimi (+) - Brahimi completou 10 dribles durante a partida - a equipa toda do Boavista teve 9 e os jogadores do meio-campo para a frente do FC Porto também 9. Isto mostra bem a influência e o que distingue Brahimi. Mas não são fintas inconsequentes, ou voltas de 360º: Brahimi vai para cima dos defesas com objetividade, a partir do lado esquerdo, descompõe toda a defesa adversária e tentou sempre servir os colegas - não rematou nenhuma vez, algo que também lhe faltou, pois andou sempre à procura de alguém na grande área. Como é que conseguimos chegar até meio da época sem tirar proveito do seu talento, e mantendo-se na luta pelo título, será sempre um mistério.

A corrida de NES (+) - O melhor momento de Nuno Espírito Santo ao serviço do FC Porto: a forma como se impôs, de imediato, na defesa a um dos seus. Corona foi anjinho, podia ter ali arranjado sarilhos dos grandes (Talocha devia ter sido expulso, mas Corona podia ter prejudicado toda a equipa por ter reagido a quente - e acabou por estar na origem da expulsão do treinador), mas foi muito bom ver NES a reagir, de pronto, na defesa a um dos seus jogadores. Treinador que esteja sempre na linha da frente na defesa ao seu plantel, independentemente de todas as limitações táticas, terá sempre apreço pela sua liderança. Um gesto que valeu mais do que 50 conferências de imprensa monocórdicas e politicamente corretas. NES foi mais Porto naquele sprint do que em 70 repetições de «Somos Porto» ou «o Dragão é a nossa fortaleza». Um gesto vale mais do que mil palavras. 




A rever (-) - Brahimi estava a ser forte nos movimentos interiores - e com isso, ia abrir-se espaço do lado esquerdo. Normalmente, essa lacuna é preenchida com a subida do lateral-esquerdo. Mas o que vimos foi que Soares passou a maior parte do jogo encostado ao lado esquerdo. Uma vez mais, isso é expor Soares a um trabalho que não deveria ser o seu. Esse desvio de posição fez dele o jogador com mais perdas de bola e com apenas um lance ganho em 1x1 entre os 14 que tentou disputar.

Soares está de pé quente, tem que ser aproveitado na grande área. A primeira e única bola que lhe deram deu em golo. Estar sucessivamente encostado ao flanco acaba por o prejudicar, embora seja nítido, desde o início da época, que NES vai sempre pedir isso ao seus avançados. Soares está a superar as expetativas neste seu arranque no FC Porto, mas se querem fazer dele o que não é, isso acabará por prejudicar o jogador. Entre os 14 golos de Soares na Liga, 13 foram marcados no enquadramento entre a marca de penalty e a baliza (a exceção foi o golo ao Tondela). Junto ao flanco, está a ser o jogador com mais perdas de bola. Quanto mais perto estiver da grande área, melhor. 

Ainda neste âmbito, o FC Porto perdeu muito na segunda parte com a saída de Corona. Pois Corona estava a conseguir dar muita largura do lado direito. Com a entrada de Jota, o FC Porto afunilou demasiado o seu jogo - forçou Maxi Pereira a subir mais vezes e a falta de pernas fez-se notar na segunda parte. É certo que o FC Porto não tem outro extremo direito no plantel, não com as caraterísticas de Corona, mas era necessário procurar dar maior largura naquela fase.

Além disso, houve pouca gente a chegar a zonas de finalização. Entre os médios do FC Porto, só houve um toque na grande área adversária, de Óliver. Os três médios passaram a maior parte do jogo atrás da linha de meio-campo (André André começou por pressionar muito à frente, mas adiantava-se apenas no momento defensivo, deixando sempre um vazio que só Brahimi preenchia com os movimentos interiores). Corona e Brahimi não remataram nenhuma vez, o que mostra que o FC Porto, apesar de ter tido boas oportunidades, meteu pouca gente em zonas de finalização e faltou mais gente a rematar.

O Boavista, aliás, foi mais vezes à grande área do FC Porto do que o contrário - ainda que tenha criado menos lances de perigo, mas Casillas revelou-se, uma vez mais, decisivo no pouco que teve que fazer. Num derby, sobretudo jogado da forma a que o Boavista obrigou, é sempre complicado e o que importa é vencer. Mas vêm aí jogos em que a raça, o crer e a determinação não vão chegar. Não é preciso muito: basta multiplicar aqueles 15 minutos iniciais. 

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

Lógica por linhas tortas

Há dias em que o futebol tem lógica. A Juventus é pentacampeã italiana e vai a caminho de um inédito hexa, o que mostra bem que estão numa das melhores fases da história do clube. Só o que Pjanic e Higuaín custaram paga todo o plantel do FC Porto. A Juventus tem um dos melhores plantéis da Europa, com o equilíbrio perfeito entre experiência, maturidade e talento. São técnica e taticamente muito superiores ao FC Porto. Posto isto, a única surpresa para esta eliminatória será a Juventus não passar. Tal como ontem a surpresa seria a Juventus não se impor no Dragão.


Há dias em que o futebol tem lógica. A Juventus é melhor, foi melhor e ganhou o jogo. Não há portista que não entre numa eliminatória destas sem uma pontinha de esperança em vergar a lógica. Foi graças a essa atitude que Viena e Gelsenkirchen, ou Sevilha e Dublin, ou até Tóquio não são apenas nomes de cidades para nós. Mas os argumentos da Juventus são imensamente superiores, a todos os níveis.

Na Liga dos Campeões, o FC Porto já cumpriu os seus objetivos, com uma dose de felicidade já bem generosa: as três expulsões contra a Roma (agora provámos o efeito contrário) e o penalty em Brugge que pode muito bem ter invertido o rumo da fase de grupos. Sem estas incidências nestes dois jogos podíamos nem ter chegado a esta eliminatória contra a Juventus. Isso sim seria preocupante, pois passar a fase de grupos era um objetivo e uma necessidade. A partir daqui, ou se contraria toda a lógica e expetativas, ou acontece o que aconteceu no Dragão: o testemunho de uma equipa superior.

Ninguém pode exigir aos jogadores ou a Nuno Espírito Santo que eliminem uma das melhores Juventus da história. Muito menos quando, ainda há bem pouco tempo, o FC Porto atravessava reconhecidamente uma das fases mais negativas da história do clube. Estes opostos dificilmente terminarão com a eliminatória em festa.

Antes de defrontar a Juventus, o FC Porto tinha que ganhar ao Boavista. Continua a ter que fazê-lo. Não há que pensar em Turim mas sim nos 9 pontos que têm que ser feitos contra Boavista, Nacional e Arouca. A nossa luta é esta e já vai dar trabalho de sobra. 




A organização defensiva (+) - É o único traço verdadeiramente positivo da identidade da equipa esta época. Raramente apanham o FC Porto num momento de descompensação defensiva. Mesmo com dez, a Juventus poucas vezes entrou no último terço em superioridade, as tabelas poucas vezes tiveram consequência e Felipe (muito bem no jogo aéreo) e Marcano foram ótimos na missão possível: afastar a bola da grande área. Quanto à organização defensiva, só se pode elogiar Nuno Espírito Santo. E depois podem puxar pela memória e lembrar-se da última vez que disseram isto: «Naquele ano ganhámos o campeonato porque defendíamos muito bem». Pois.


Brahimi (+) - Do meio-campo para a frente, tudo o que de bom pudesse acontecer teria que nascer dos pés de Brahimi. Foi ele o único a tentar algo enquanto esteve em campo: seis dribles em progressão, nove duelos ganhos, um dos três remates do FC Porto (nenhum à baliza) e o único capaz de mostrar alguma habilidade na procura da baliza da Juventus. Com a sua saída desapareceram de campo as únicas ideias do FC Porto para tentar chegar ao golo. 

Herrera (+/-) - Não pela exibição, mas por aquela velha frase de que uma imagem vale mais do que mil palavras. O estado do pé de Herrera é sugestivo. Não o viram a queixar-se, não pediu para sair. Aguentou, não virou a cara à luta e honrou a braçadeira de capitão que tinha no braço pela sua atitude. Também é por isso que é capitão: um estatuto que tem que ser reconhecido e compreendido pelo treinador e pelos colegas, não pelos adeptos. Quem acha que esta atitude não é significativa talvez tenha o cérebro em pior estado do que o pé de Herrera. 




A ausência de Óliver (-) - Esta Juventus tem um rosto: Pjanic. Que delícia é vê-lo jogar. Todo o futebol da Juve passa por ele: seja no passe curto, na progressão, na variação de flanco ou no momento de esticar o jogo. Sem Pjanic, esta Juventus não seria a mesma. Uma espécie de FC Porto sem... Óliver.

Não havia ponta de fio de jogo no FC Porto do meio-campo para a frente, mesmo antes da expulsão de Alex. Ninguém a saber tratar a bola, a perceber o momento para a soltar, para apoiar, para solicitar os colegas. Nada. Ou Brahimi ia para cima dos defesas, ou nada acontecia. Não houve um único passe nos últimos 35 metros para situação de finalização - o mais próximo disso foi o cruzamento de Layún para Herrera. Nada. Não iam ser Danilo, Rúben ou Herrera a consegui-lo. E mesmo que André Silva tivesse continuado com Soares na frente, dificilmente haveria capacidade para imaginar uma jogada que desmontasse a organização defensiva da Juve.

Percebe-se a intenção de NES: quis jogar para o 0x0 e esperar que, em Turim, o FC Porto tivesse o espaço desejado para as transições rápidas e explorar o espaço em profundidade. Mas podem contar pelos dedos das mãos as vezes em que apanham a defesa da Juve em contra-pé, seja no modelo em que jogaram ontem, seja no esquema de três centrais. Não funcionou. 

O FC Porto anunciou a compra do passe de Óliver a 9 de fevereiro. Desde então foi três vezes para o banco, e ontem nem de lá saiu. Dá para compreender esta gestão de recursos? A SAD anuncia a compra do ativo mais caro da história do clube (a par de Imbula), e logo a seguir Óliver deixa de contar como titular para NES? Querer encontrar a melhor versão desde FC Porto sem Óliver é algo que nunca baterá certo. 

O abandono a Soares (-) - Soares estava a fazer a sua estreia na Liga dos Campeões. Há confiança pelos golos que marcou recentemente, mas ter que jogar contra Chiellini e Barzagli é um pouco diferente do Campeonato português. No momento da expulsão de Alex Telles, a decisão seria sempre difícil para NES. Saiu André Silva, mas a forma como Soares ficou completamente desamparado no ataque foi deveras preocupante. Pediram-lhe o impossível. Soares não seria nunca uma solução para jogar em profundidade, o que já retirou metros à equipa. Houve uma clara tentativa de colocar Soares a segurar a bola, mas depois o apoio nunca chegava. Isso fez com que Soares fosse o jogador com mais perdas de bola em campo, só tivesse arrancado 2 faltas (crítica extensível a toda a equipa - com 10, o FC Porto tinha que procurar os lances de bola parada), não tenha ganho nenhum lance de 1x1 e nem um esboço de remate para amostra. Sem culpas no cartório: Soares ficou sozinho no ataque para tentar ser o que não é. É mais um ajudar, mas não alguém que vai resolver tudo sozinho. Não é Hulk, é Soares. Não queiram fazer dele um salvador da pátria. O resultado esteve à vista: Casillas levou para casa uma camisola de Buffon sem pinga de suor.

Uma noite má (-) - Todos os jogadores têm noites más. E se calhar foi melhor tê-la contra a Juventus do que contra o Boavista. Mas algo se passou com Alex Telles, que fez 27 minutos irreconhecíveis para um jogador da sua já demonstrada valia. 8 perdas de bola, 7 passes falhados, 3 faltas e uma única chegada aos últimos 30 metros. Foi mau, ele sabe que foi mau, mas há que assumir que foi apenas isso: uma noite má, como calha a todos. Uma reação contra o Boavista será bem vinda, Alex. O outro Alex, que estava do outro lado, andou meses a ouvir coisas bem menos simpáticas nos seus primeiros tempos no FC Porto. 

Faltam 12 jornadas para o final do campeonato e é nelas que o FC Porto tem que pensar. Talvez nem o melhor FC Porto chegaria para bater esta Juventus. Mas no Campeonato português, mesmo sem o melhor FC Porto, estamos na luta e a depender de nós próprio. Talvez mais «apesar de» do que «graças a», mas as contas do campeonato são as mesmas: dependemos de nós próprios para chegar ao título. E não há o risco de aparecer nenhuma Juventus pelo caminho.

domingo, 19 de fevereiro de 2017

O Tondela não merecia isto

As críticas foram bem audíveis nos últimos dias. E trata-se, de facto, de uma grande injustiça. O Tondela, na visita ao estádio de um grande do futebol português, perdeu por 4-0. Mas o problema não esteve apenas no resultado final, mas em dois lances nos quais o Tondela foi claramente prejudicado.

Falamos de um penalty e de uma expulsão, imerecidas e injustificadas, que acabaram por prejudicar o Tondela no jogo em causa. Jogar no estádio de um grande do futebol português já é, por si só, complicado. Mas quando a equipa da casa beneficia de um penalty mal assinalado, e vê um jogador do Tondela ser mal expulso, só se pode lamentar o tratamento de que o Tondela foi alvo.

Passando às imagens, o lance em causa é este:


Neste lance, André Almeida não sofre qualquer falta de Pica na grande área. Não havia grande penalidade a favorecer o Benfica, nem o Tondela ficaria sem um dos seus defesas. O Benfica acabou por vencer por 4-0. Venceria de qualquer maneira? Certamente. Mas custa sempre ver um clube modesto, como o Tondela, ser assim prejudicado pela arbitragem em casa de um grande. Felizmente, Gilberto Coimbra, presidente do Tondela, reagiu de pronto a esta injustiça...

Hmm, afinal não. Criticou o Sporting e o Jorge Jesus depois de ir a Alvalade e queixou-se imenso da arbitragem agora que o Tondela perdeu com o FC Porto, também por 4-0. Contra o Benfica, por incrível que possa parecer, Gilberto Coimbra não se lembrou de condenar a arbitragem.

De certeza que não terá nada a ver com isto.


No que diz respeito ao FC Porto, uma vitória sem sobressaltos, ainda que não há-de ser sempre que, no espaço de 3 minutos, a equipa beneficie de um penalty e uma expulsão, momentos que certamente ajudaram a que, na segunda parte, o 4x0 até tenha sido pouco para todas as ocasiões que a equipa construiu. 

53 pontos em 22 jornadas, um saldo bastante positivo e acima das expetativas, sobretudo tendo em conta que, nas últimas 12 épocas, só por 3 vezes o FC Porto tinha mais pontos nesta fase: no segundo ano com Jesualdo Ferreira, na época com Villas-Boas e na segunda época com Vítor Pereira. Três épocas que acabaram em festa nos Aliados. Se há momento para acreditar é este, independentemente do que se passar na eliminatória com a Juventus.




Rúben Neves (+) - Tem que haver algo de extraordinário para Rúben Neves não ser titular no FC Porto. E há: chama-se Danilo Pereira, imprescindível pelo que acrescenta à equipa. Mas Rúben Neves tem a capacidade de dar ao meio-campo do FC Porto uma qualidade de circulação de bola, de amplitude de jogo e de cabecinha a construir (sem Óliver em campo, a sua importância neste aspeto foi ainda maior) incomuns.

Um exemplo. Nos últimos 4 jogos, Danilo Pereira fez 36 passes no meio-campo adversário. Rúben Neves, que joga na mesma posição, fez mais contra o Tondela. 

Rúben Neves vs. Tondela
São jogadores de caraterísticas muito diferentes, o que ajuda a explicar a diferença. Mas Rúben Neves tem essa capacidade: de empurrar a equipa para os últimos 45 metros. O facto do Tondela ter jogado com 10, e ter deixado de pressionar tanto, ajudou a essa subida, claramente, mas é uma capacidade intrínseca no futebol de Rúben Neves: obriga todas as linhas a subir, pela forma como circula a bola. Defensivamente, também não esteve longe do rendimento habitual de Danilo, com 19 ações defensivas, entre recuperações, desarmes e intercepções. O único problema de Rúben é este: só podem jogar 11 de cada vez. Mas pode ter o que nem todos tiveram: muitos anos de FC Porto pela frente.


André André (+) - O seu melhor jogo esta época. Esteve literalmente por todo o lado, impecável no passe (93%), recuperou várias vezes a posse no meio-campo adversário e manteve, em sintonia com Rúben Neves, a equipa equilibrada no meio-campo na transição defensiva. Uma exibição a fazer lembrar o seu grande momento de forma em outubro/novembro de 2015, tamanho que foi o pulmão que foi capaz de mostrar em campo.

André André vs. Tondela
A capacidade de criar (+) - Sim, jogar em superioridade numérica, contra uma das equipas com maiores fragilidades do campeonato, ajuda. Mas foi um dos jogos em que o FC Porto mais capacidade teve de levar a bola a zonas de finalização. Foram efetuados 18 passes que deixaram um colega em situação privilegiada para atirar à baliza e fazer jogo. Foi o recorde desta época, também com grande destaque para o número de entradas na grande área do Tondela (51). Dos 24 remates, 15 foram feitos dentro da grande área do Tondela, o que mostra a facilidade para criar situações de finalização. Além disso, foram efetuados 33 cruzamentos, ainda que desses só 8 tenham tido seguimento direto na grande área. Quando se cria oportunidades desta forma, ninguém terminará o jogo a lamentar a ineficácia: no meio de tantos lances, pelo menos um há-de entrar.

Outros destaques (+) - Mais dois golos para a dupla André Silva/Soares, a revelar um bom entendimento - Soares mais fixo no eixo central, André Silva sempre mais recuado e a cair muitas vezes nas faixas. O golo de Soares foi uma delícia de finalização, a colocar a bola onde quis. Já leva 4 jogos em 3 jogos, uma excelente média - os «dois pares de golos» que se pediam para ajudar o FC Porto na luta pelo título podem já estar feitos -, embora haja ainda muita coisa para melhorar quando é forçado a ir para o 1x1 (foi o único, a par de Rúben Neves, que não fez nenhum drible - não que tenha precisado para marcar) e na forma como tem que perceber as movimentações dos colegas (algo que o levou a ser o jogador com mais perdas de bola em campo). 

Há ainda a destacar que, dos 10 remates que André Silva e Soares fizeram, nove foram efetuados dentro da grande área. Ou seja, a bola está a chegar à grande área e aos pontas-de-lança. Quando assim é, tudo é mais fácil. Palavra ainda para um bom jogo de Corona.




A rever (-) - Os golos e a superioridade numérica na segunda parte ajudam a que isso se «esqueça», mas no primeiro tempo foi nítido, uma vez mais, o fosso que é criado entre o meio-campo e a linha avançada. Faltava muitas vezes alguém para ir receber a bola entre linhas e uma referência no eixo central. André André tinha limites para subir, pois só sobraria Rúben Neves no meio-campo, e Otávio aparecia poucas vezes em zonas interiores. Jogar com apenas dois médios obriga a uma disciplina e versatilidade na dinâmica da equipa que o FC Porto, com estas unidades, ainda não revelou da forma desejada. Isto provocou, algumas vezes, um desequilíbrio na zona central, algo que poderia ter sido muito perigoso - aos 30 minutos já tínhamos os centrais e o médio defensivo amarelados.

Quando se criam muitas oportunidades, a bola acaba por entrar. Mas a forma como foram desperdiçadas várias ocasiões, com André Silva, Soares e Otávio à cabeça, não é coisa para se repetir. Foram ocasiões que, falhadas noutro jogo qualquer, poderiam ter custado caro. Como por exemplo contra a Juventus.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

A «quebra» de André Silva

«Dois jogos de Francisco Soares de dragão ao peito, três golos do avançado brasileiro e, no mesmo período, nem um remate de André Silva para a estatística (...) Será que a parceria com Tiquinho está a limitar o futebol de André Silva? Nuno Espírito Santo identifica alguma quebra no internacional português? 'Não concordo com essa ideia. O André não está em quebra'». MaisFutebol

Vamos, então, avaliar essa famosa quebra de André Silva nos últimos dois jogos.

FC Porto x Sporting, minuto 6. Iker Casillas manda um dos muitos balões do FC Porto para a frente nesse jogo. Uma bola longa foi muitas vezes sinónimo de uma bola entregue ao Sporting. O que diferenciou este lance? É André Silva quem, de cabeça, consegue ganhar o lance e amortecer a bola para que Corona pudesse avançar para o 1x1.


O que acontece neste lance? Os dois centrais do Sporting, e também os 2 mais fortes no jogo aéreo, estão ambos preocupados com o raio de ação de André Silva. O que isso permite? Permite que Soares se solte da marcação de um central e que fique apenas com João Palhinha por perto. Golo. 


No lance do 2x0, todos apreciámos o grande passe de Danilo e a arrancada de Soares. Mas o que acontece antes? Minuto 39, o Sporting tem todas as suas torres na grande área adversária. Matheus Pereira recebe a bola junto à linha e tem como missão colocar a bola na grande área - é bom recordar que as duas maiores oportunidades de golo do Sporting nasceram de dois cruzamentos e dois cabeceamentos de Coates. Mas Matheus não consegue cruzar. Porquê? André Silva foi lá fazer o corte.


O lance prossegue com lançamento para o Sporting, nova bola para Matheus Pereira e nova oportunidade para cruzar para a grande área. Mas Matheus não conseguiu cruzar. Porquê? André Silva estava lá novamente a ganhar o lance. O resto já se conhece: contra-ataque, depois de uma bola dividida a envolver Brahimi, e golo.


Agora Guimarães. O que se pode constatar depois do toque de Herrera na grande área? O V. Guimarães tem 4 jogadores. Toda a gente está concentrada em André Silva e na bola. O que isso permite? Que Soares fique completamente sozinho, nas costas da defesa, e possa depois emendar o toque de André Silva para o 1x0.


Agora observemos as movimentações de André Silva contra o Sporting. 


Pois é: passou quase todo o jogo à saída do meio-campo, a trabalhar defensivamente, longe da zona em que pudesse fazer a diferença, a grande área. Passa mais tempo junto aos flancos, a procurar dar apoio aos laterais para a tabela ou a receber a bola em lançamentos, em vez de estar na grande área à espera do cruzamento. Jogo seguinte:


Contra o V. Guimarães, já pôde estar mais vezes perto da grande área adversária (teve lá três ações, e de uma delas saiu o golo de Soares). Ainda assim, esteve novamente a maior parte do tempo recuado, mais perto do meio-campo, a procurar dar sempre linhas de apoio aos médios. 

E agora, se repararmos nas zonas em que André Silva conseguiu fazer golos esta época...


... pois é: todos os golos de André Silva foram obtidos dentro da grande área, nunca com remates de longe. Se André Silva anda sempre longe da grande área, como esperam exatamente que faça golos com maior regularidade? Vale com qualquer grande ponta-de-lança que o FC Porto tenha tido. Se tivessem metido Jardel ou Fernando Gomes a fazer o que André Silva está neste momento a fazer, não teriam marcado metade dos golos. 

Não é Soares quem está a ofuscar André Silva: é André Silva que está a contribuir para que Soares possa brilhar logo nos seus primeiros jogos ao serviço do FC Porto, jogando sempre em apoio à equipa, mais perto do meio-campo, e longe da zona onde pode de facto ser letal e conseguir mais golos. 

E se isto é uma «quebra», então é uma quebra bastante apreciável, pois André Silva conseguiu ter intervenção direta em todos os momentos que permitiram ao FC Porto vencer dois jogos importantíssimos. Venham mais contra o Tondela (duas notas: não pensem na Juventus antes do Tondela; e não pensem que o Tondela é a Juventus. Seguindo essas duas regras, a vitória acontecerá com naturalidade). 

domingo, 12 de fevereiro de 2017

Identidade alternativa

No início da época, Nuno Espírito Santo disse à revista Dragões que queria uma equipa construída em dois princípios: a) «pressão intensa para recuperar a bola»; b) «chegar o mais rapidamente possível a zonas onde podemos transformar essa posse em golo».

Em Guimarães, ficou patente que já não é defeito, é feitio: o FC Porto desistiu de ser uma equipa que assume o jogo em posse, que constrói, que trabalha para abrir o espaço. Estamos em fevereiro, e não é nos últimos três meses da época que isso vai mudar. 

O FC Porto mostrou-se, em Guimarães, uma equipa forte e preparada na pressão ao adversário, capaz de matar a esmagadora maioria das jogadas de ataque antes dos últimos 25 metros. Uma equipa muito organizada e fiável na pressão defensiva. Para recuperar a bola e suster o adversário, excelente. O problema aparece depois: quando é preciso fazer alguma coisa com a bola. 


Foi a 5ª vitória consecutiva e o superar de um ciclo de jogos extremamente complicado, num período que coincide com um divórcio da posse de bola: 46% frente ao Rio Ave, 52% frente ao Estoril, 34% contra o Sporting e 42% em Guimarães. Não há comparação com as 4 primeiras jornadas do campeonato, no qual o FC Porto teve 60% contra o Rio Ave, 66% frente ao Estoril, 45% em Alvalade e 55% contra o Vitória de Guimarães.

O FC Porto não deixou o Vitória de Guimarães fazer quase nada durante os 90 minutos (a única defesa de Casillas foi a um remate em posição irregular) e voltou a ser muito oportuno no ataque, conseguindo muito com pouco: Soares aproveitou a única oportunidade que os avançados tiveram até à entrada de Diogo Jota e o mesmo Jota, com a ajuda de Alex Telles, aproveitou um erro de Douglas. 

O fato de macaco não ganha concursos de estética, mas mantém o FC Porto na luta pelo título. 




Matar a jogada (+/-) - Com as saídas de Óliver e Corona, o FC Porto jogou com um único criativo em campo: Brahimi. O resto da equipa dividiu-se na missão de matar cedo os ataques do Vitória de Guimarães, pressionando e tentando depois meter rapidamente a bola em Soares ou André Silva. Havia três vias para atacar: ou Brahimi pegava no jogo a partir do lado esquerdo; ou Alex/Maxi conseguia subir e o FC Porto aproveitava a profundidade; ou então era chutão direto para Soares ou André Silva. A construir, o FC Porto poucas vezes conseguiu jogadas de perigo, mas o pragmatismo e a forma como não se deixou o Vit. Guimarães avançar esteve lá. Atentos a este pormenor:


Estas foram as zonas em que o FC Porto fez faltas. Ou seja, nenhuma nos últimos 25 metros, o que mostra que o FC Porto nunca teve problemas em matar a jogada mais à frente. Daí que toda a defesa do FC Porto, Danilo incluído, só tenha feito 3 faltas em todo o jogo: porque do meio-campo para a frente formou-se uma barreira de combate que meteu o pé, o corpo, foi de carrinho, foi pelo ar e varreu quase todos os lances em que o V. Guimarães saía com perigo. Só Brahimi e Soares fizeram 11 faltas: e não foram momentos de antidesportivismo, mas sim de raça na pressão sobre o adversário. Ninguém se importou em jogar feio para servir um propósito maior: ganhar.

Iván Marcano (+) - Absolutamente imperial. Ganhou 100% dos tackles e lances aéreos, teve 12 ações defensivas (o mais interventivo em campo), bloqueou um remate e ainda foi ao ataque criar uma situação de golo. Se pouco se viu do V. Guimarães no ataque, foi muito por culpa dele. Uma exibição irrepreensível de um senhor jogador.


Alex Telles (+) - A quantidade de vezes em que lhe era pedido para meter a bola em profundidade faz com que seja o jogador com mais perdas de bola e passes errados em campo. Mas é injusto avaliar por esse prisma: Alex Telles segue a estratégia da equipa. Quando pôde subir pelo flanco, indo à linha em vez de fazer logo um balão de 40 metros para o ataque, fez a diferença: é dele o cruzamento para o 1x0 e a assistência, com toda a calma e inteligência do mundo, para Diogo Jota matar o jogo. Pensar numa dinâmica que permita a Alex Telles subir em vez de mandar o balão para a frente não era mal pensado: sem isso o FC Porto dificilmente venceria em Guimarães. 

A entrada de Diogo Jota (+) - Sozinho, fez mais remates à baliza do que todos os companheiros, o que diz tudo sobre a forma como a sua entrada agitou o jogo. Entrou numa fase em que o V. Guimarães já estava mais adiantado, o que abriu mais espaço para o FC Porto entrar em transição rápida. André Silva e Soares só tinham conseguido 2 remates e quatro toques na grande área adversária (dois deles no lance do 1x0), essencialmente porque não eram servidos. Diogo Jota, com a sua velocidade e objetividade, conseguiu sozinho - depois com a ajuda de Alex Telles - semear o pânico na defesa do V. Guimarães. Pode só ter mais 3 meses de FC Porto pela frente: se for sempre assim, deixará todos a suspirar por mais.




Desapoiados (-) - Um pouco ao início do que já foi referido: o FC Porto esteve bem a recuperar a bola. O problema aparecia depois de recuperar a bola: e agora, o que se faz com ela? A primeira parte foi particularmente sofrível neste aspeto. Soares e André Silva tiveram que inventar, entre eles, com ajuda de Alex Telles e Herrera, praticamente a única ocasião de perigo do primeiro tempo, onde o FC Porto poucas vezes foi à grande área adversária (seis, contra 14 do V. Guimarães).

Com pouca profundidade nos flancos (a não ser quando Maxi e Alex conseguiam subir - fizeram 6 dos 7 cruzamentos do FC Porto), Soares e André Silva raramente foram servidos na grande área. Depois, no meio-campo, não havia ninguém para o último passe em zonas interiores - ainda que Herrera tenha feito a diferença no lance do 1x0, ao ajudar a povoar a grande área. O único momento em que o FC Porto desequilibrava era quando Brahimi pegava na bola do lado esquerdo. 

O FC Porto esteve muito bem montado para o momento de recuperação, mas depois falta algo: o momento de construção. Uma estratégia que não surpreenderia, por exemplo, para uma eliminatória com a Juventus, mas que é incomum numa equipa a jogar para o título em Portugal. Nem sempre poderemos contar com o ressalto ou a bola perdida. Contra o Tondela, dentro de uma semana, espera-se um bocado mais - a garra só ganha campeonatos se vier acompanhada de qualidade.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017

A continuidade de Óliver (adenda)

«É um dia feliz para o FC Porto, que confirmou a contratação de Óliver Torres. Tendo em conta que a SAD não explicou os contornos da transferência (como é claro, nunca o FC Porto manteria um jogador emprestado por meia época, logo o empréstimo de ano e meio vai ao encontro do calendário financeiro, não do desportivo), e visto que ainda não está fechado tudo o que há para fechar com o Atlético, o negócio não pode para já ser comentado além da adição desportiva. E essa não poderia ser melhor». O Tribunal do Dragão, 25-08-2016

Esta semana começou com um fenómeno curioso: propagou-se, em massa, a notícia de que o FC Porto teria que comprar Óliver Torres. Era algo em relação ao qual os adeptos mais informados já estavam ao corrente, mas de facto o FC Porto não tinha anunciado, ainda, a existência da tal opção de compra obrigatória - pelo contrário, sempre se referiu a ela como opcional.

No comunicado à CMVM, a SAD falou apenas em «opção de compra». E quando o regresso de Óliver foi anunciado no site do clube, também só foi referido que a operação permitia aos «Dragões ficarem com a opção de compra». Esta semana, no Porto Canal, já se anunciou que a opção de compra era obrigatória, como se isso tivesse sido colocado no domínio público do futebol português no momento da sua transferência. Não foi, o que não se compreende.

Adenda: eis o comunicado do FC Porto enviado à CMVM, no qual se confirma a existência de uma «opção de compra», não qualquer tipo de obrigatoriedade de compra. E o termo «opção de compra definitiva» não pressupõe qualquer tipo de obrigatoriedade. Veja-se o exemplo do empréstimo de Tello, que também chegou com uma «opção de compra definitiva». Mas o FC Porto não comprou Tello, porque não estava obrigado a isso, uma vez que era, claro está, uma «opção».

E para que não restem dúvidas, vejam o comunicado à CMVM sobre Diogo Jota. O que diz? «Mais se informa que o contrato contempla a opção de compra definitiva dos direitos acima referidos». Exatamente a mesma informação que foi prestada no comunicado sobre Óliver Torres. E agora querem fazer crer que houve diferenças? Não. O FC Porto prestou a mesma informação sobre Óliver e Diogo Jota: que havia uma opção de compra definitiva dos direitos económicos. Agora dizem que a compra de Óliver é obrigatória e que a de Jota é opcional, depois de terem prestado, à CMVM, exatamente a mesma informação sobre ambos. Fica o esclarecimento, que o clube aparentemente não quis dar. 

Prosseguindo. Era uma questão de tempo, mas está formalmente anunciado: Óliver Torres fica no FC Porto. A qualidade do jogador não merece pinta de discussão, é uma excelente adição - neste caso, uma continuidade - ao plantel. O preço, de 20M€, é normal que inquiete os adeptos, aqueles que sabem que o euro e as finanças da SAD são sempre as mesmas, entre a bola ou não na baliza - se na Liga dos Campeões isso pode fazer uma grande diferença nas receitas, em Portugal, ganhar a Primeira Liga ou não, não provoca grandes alterações nas finanças dos clubes. Por isso, a história de «se formos campeões ninguém se preocupa com as contas» só pode ser encarada como uma valente treta, porque o que está em causa é sempre o futuro do FC Porto - e portista que se preze, para não dizer «verdadeiro», preocupa-se com o amanhã do seu clube.

O facto da SAD já ter anunciado a compra de Óliver levantou a questão sobre se a operação já terá implicações financeiras no segundo semestre de 2016-17. A SAD não o esclarece, mas atente-se a este pormenor: «O contrato de trabalho com o jogador, para as épocas seguintes, será efetivado após término do contrato de empréstimo em vigor». Tendo em conta que a amortização da transferência está diretamente ligada ao contrato que o futebolista fizer com a SAD (no caso, se for um contrato a 5 anos, Óliver «custa» 4M€ por época à SAD em amortizações), se Óliver só vai ter diretamente contrato com o FC Porto a partir de 31 de dezembro de 2017, então é uma operação para ser contabilizada a partir das contas de 2017-18.

A época 2017-18 vai entrar no período de monitorização de 2018-19 do fair-play financeiro, que mantém o tal limite de prejuízo de 30 milhões de euros na soma das três épocas que o antecedem. Nessa altura, já não serão aplicáveis os resultados negativos de 40,7 milhões de euros de 2013-14, época que entra no período de monitorização que está agora em vigor. Por isso, a operação de Óliver é considerada depois do referido prejuízo deixar de o ser. Ainda assim, manter-se-á sempre a grande preocupação do resultado negativo de 2015-16, de 58,4 milhões de euros, quase o dobro do que é permitido para um ciclo de três épocas.

Óliver tem condições para fazer render o investimento. Não está a ter a influência direta que teve na época com Lopetegui, mas isso não tem a ver com a qualidade do jogador, mas sim com a forma como está a ser utilizado na estratégia de NES. Óliver já começou por ser prejudicado por só ter chegado no final de agosto, não fazendo a pré-época, e está a ser muito limitado nas suas funções ao nível do meio-campo. Vejamos os últimos três jogos de Óliver ao serviço do FC Porto.


Se olharmos para os terrenos que Óliver pisou frente ao Sporting, o que mais se destaca é a zona na qual esteve mais tempo presente: no lado esquerdo à saída da grande área do FC Porto. Óliver tinha a função de ir pegar no jogo atrás, e esteve muito mais ativo no meio-campo defensivo do FC Porto do que no ataque - até porque tinha também uma missão defensiva de enorme responsabilidade. Óliver raramente pisou o último terço do meio-campo e não teve nenhuma ação na grande área do Sporting. Agora, os passes.


Uma vez mais, nota-se que Óliver teve um papel muito interventivo sobretudo na meia esquerda. Nos últimos 40 metros, Óliver só fez 5 passes no jogo contra o Sporting. Não é por não querer subir: é por não ter instruções para o fazer. No esquema utilizado contra o Sporting, que só usava dois médios de raíz, era impossível Óliver ter um papel mais influente do meio-campo para a frente. Vejamos agora o jogo frente ao Estoril.


Novamente, o mesmo padrão: Óliver tem ação sobretudo através da meia esquerda. Neste caso, também foi várias vezes ao lado direito, mas teve novamente um papel pouco interventivo perto da grande área do Estoril. E isso também se reflete nos passes que fez.


Nos últimos 25 metros, Óliver só fez três passes e teve apenas uma ação na grande área adversária. A tendência era sempre a mesma: ir pegar no jogo no lado esquerdo. Por fim, um jogo em casa teoricamente mais acessível, frente ao Rio Ave.


Onde está o maior raio de ação de Óliver Torres? Lado esquerdo, novamente ainda atrás da linha de meio-campo do FC Porto. E quanto à zona em que fez passes...


Imaginem que Deco tinha feito carreira no FC Porto a jogar pelo corredor esquerdo. Não dá para imaginar, pois não? Mas as ações de Óliver frente ao Rio Ave mostram que a esmagadora maioria dos seus passes foram efetuados no corredor esquerdo. Longe da zona central, longe das zonas de decisão perto da grande área. Os três passes que fez nos últimos 25 metros foram todos efetuados junto à linha lateral. 

Como curiosidade, vamos ver o último jogo em que Óliver marcou pelo FC Porto, na vitória frente ao Moreirense.


A diferença em relação aos últimos três jogos? Aqui, Óliver Torres teve na zona de maior intervenção o meio-campo do adversário, em vez dos primeiros 25 metros do meio-campo do FC Porto. Pôde jogar mais à frente, esteve um pouco mais influente em zonas interiores e também chegou à grande área - onde teve a hipótese de fazer o 1x0. 

Não, Óliver não está pior jogador: está simplesmente a ser usado de maneira diferente em relação àquele que era o seu papel na época 2014-15. Óliver está a jogar muito mais sobre a meia esquerda e mais distante da grande área, o que lhe retira sobretudo a possibilidade de fazer o último passe no meio-campo adversário. Até porque no que toca ao número de remates, a diferença não é assim tanta. Uma comparação em relação ao que foi o desempenho de Óliver na sua primeira época com o que está a ser nesta temporada.


O que se destaca? Menos passes de Óliver para ocasião, menor eficácia de passe no meio-campo adversário... e menos trabalho defensivo, apesar de nesta época estar a jogar em zonas mais recuadas. Há que ter em conta que Óliver teve uma eficácia brutal na sua primeira época no FC Porto - nesta altura, era o jogador com maior aproveitamento de remates enquadrados, com 69%, à frente de Danilo e Jackson (45%), e era também o jogador com mais eficácia em remates/golos, com 46%, à frente de... Martins Indi (33%). Desta vez, não está, simplesmente, a ter um papel tão influente perto da grande área do adversário. 

É algo que lhe falta, mas também é algo que o modelo de jogo utilizado nesta época torna impossível que Óliver o faça. A não ser que esperem que Óliver vá à meia esquerda no início de construção, corra para o meio-campo adversário, faça o último passe, corra para a grande área e o próprio apareça para finalizar. 

Já as contas do primeiro semestre terão que ser divulgadas até ao final de fevereiro, o que já permitirá fazer um melhor enquadramento entre esta operação, o fim do pagamento do Estádio do Dragão (faltavam três prestações inferiores a 3,5 milhões de euros, o prazo de pagamento terminaria no próximo ano) e o presente e futuro imediato das finanças da SAD. Até ver, dará jeito ter o melhor Óliver em Guimarães. Ou NES pode até sacrificar o melhor Óliver, desde que isso resulte num melhor FC Porto. 

terça-feira, 7 de fevereiro de 2017

Doze coisas sobre Danilo Pereira


- Sempre que Danilo Pereira marca, o FC Porto ganha (8 jogos, 8 vitórias). 

- Danilo Pereira tem tantos golos como cartões amarelos ao serviço do FC Porto no Estádio do Dragão (5/5). 

- Em média, só conseguem driblar Danilo Pereira uma vez a cada dois jogos no Campeonato. Ou seja, precisam de 180 minutos para conseguirem fazer uma finta a Danilo. 

- Danilo Pereira é o médio portista com melhor eficácia de passe na Liga dos Campeões (92%) e na Liga Portuguesa (87,8%).

- Isso não significa que Danilo só jogue curto ou para o lado: o passe médio de Danilo na Liga Portuguesa é de 20 metros, bem à frente de Óliver, Herrera e André André, todos com 18 metros. 

- Danilo é o médio com 17+ jogos disputados que mais lances de cabeça ganha em todo o campeonato, com 3,5 por jogo. Como curiosadade, só um jogador ganha mais lances pelo ar em todo o campeonato: Marcano (3,7).

- Nas últimas 3 épocas, apenas um jogador conseguiu recuperar 19 vezes a posse de bola no mesmo jogo: Danilo Pereira. 

- Danilo Pereira é o jogador que mais duelos ganhou nas primeiras 20 jornadas da Primeira Liga, com um total de 143 entre tackles, desarmes e jogo aéreo.

- Danilo Pereira sofre mais faltas do que aquelas que comete (38 contra 23). 

- Danilo Pereira é o jogador com o contrato de maior duração no clube, até 2022. A cláusula de rescisão é de 60 milhões de euros. 

- O FC Porto pagou ao Portimonense, controlado pelo empresário Teodoro Fonseca (que detinha 30% dos seus direitos económicos), 2,8 milhões de euros por 80% do passe.

- Deixando os números falarem por si: o rendimento de Danilo Pereira nesta época vs. o rendimento de N'Golo Kanté, para muitos, e com todo o mérito, o melhor médio defensivo da atualidade. Se é certo que a exigência da Premier League não se compara à da Liga Portuguesa, restam poucas dúvidas: a qualidade individual de Danilo Pereira roça a classe mundial.

Rendimento global

Rendimento defensivo

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017

O canto de Herrera e a defesa de Casillas

Três coisas diferenciam os dois clássicos que o FC Porto disputou esta época no Estádio do Dragão. Primeira: o FC Porto jogou muito, muito melhor contra o Benfica; Segunda: o erro de Herrera, contra o Benfica, fez notar defeitos nos quais poucos reparariam se o jogo tivesse acabado antes daquele pontapé de canto, enquanto desta vez Casillas evitou uma enxurrada de críticas que provavelmente se seguiriam devido à postura do FC Porto depois do 2x0; por fim, o FC Porto, não jogando bem, consegue um bom resultado contra o Sporting, ao contrário do que aconteceu frente ao Benfica, jogo em que mostrou até determinada altura o melhor futebol da época.

Não é tempo de vitórias morais: o FC Porto precisava de vencer, e venceu. Se era jogo em que se podia jogar mal, desde que se vencesse, era este. Este resultado permite tratar a luta pelo título como um assunto praticamente a 2 até ao final da época, ao mesmo tempo em que deixa o apuramento para a Liga dos Campeões muitíssimo bem encaminhado.


O mérito repete-se: o FC Porto tem mais pontos do que aqueles que tinha em qualquer uma das últimas três épocas, mas tem menos pontos do que o campeão em qualquer uma das últimas sete temporadas. No entanto, há que saudar que em 11 jornadas no Dragão o FC Porto só perdeu 2 pontos, precisamente frente ao Benfica. 

O Sporting é uma equipa extremamente limitada fora de casa. Basta dizer que só ganhou 3 jogos fora de portas no Campeonato, sempre por 1x0, e sempre por um detalhe quase sempre chamado Bas Dost, com dois golos em cima do apito do árbitro. Além de que tem uma diferença de golos negativa fora de casa. O FC Porto não podia falhar. E não falhou. 

Segue-se a primeira de 6 jornadas em que o FC Porto sabe o que tem que fazer para não estar com ouvidos ou esperanças noutros estádios: 18 pontos antes da visita ao Benfica. Aproxima-se o último terço do campeonato e o FC Porto tem, à data de hoje, as melhores condições que já teve esta época para lutar pelo título. Teve, contra o Sporting, a ponta de felicidade que faltou noutras alturas, ainda que seja importante perceber que não hão-de ser muitas as vezes em que se consegue tão bom resultado jogando tão pouco, sobretudo na segunda parte. 





Soares (+) - «Não será de estranhar se NES o utilizar já contra o Sporting, para tentar ganhar o jogador. Se Soares tiver a felicidade de contribuir ativamente para uma vitória no clássico, ganha desde logo um crédito enorme sobre a sua contratação», escrevia O Tribunal do Dragão no post do balanço do mercado. Assim foi, NES lançou logo Soares e foi uma aposta ganha para o clássico, com 2 golos na estreia. De notar que o FC Porto fez apenas 3 remates à baliza em todo o jogo, e desses 2 foram os golos de Soares.

Mas o que mais se fez notar foi a quantidade de vezes que o FC Porto solicitou Soares durante o jogo. Para se ter noção, Soares foi a 38 bolas durante o jogo (André Silva e Diogo Jota, juntos, não costumam ir a tantas num só jogo). É certo que perdeu a maioria dos lances que disputou (24 vezes), mas era difícil pedir mais: arrancou 8 faltas, fez 2 dos 6 passes do FC Porto para situação de finalização e conseguiu 2 golos nos 2 primeiros remates ao serviço do FC Porto. Um estreia de sonho e a confirmação: o clássico serviu para ganhar o jogador, tanto que NES até fez algo que nunca tinha feito esta época - substituir André Silva antes dos 65 minutos.


Casillas (+) - Tremeu num cabeceamento de Bryan Ruiz, não teve punhos de ferro para o remate de Alan Ruiz, e acabou definitivamente com um fantasma chamado... Manuel Neuer. A partir de agora, quando nos lembrarmos de uma exibição sobrenatural de um guarda-redes no Dragão, não nos recordaremos do festival de Neuer pelo Schalke 04. Acabou. Agora pensaremos na exibição de Casillas. Foi apenas uma defesa? Pois foi. Mas foi uma defesa que valeu um clássico, clássico esse que pode valer muito mais nas próximas semanas. No momento em que tudo, literalmente tudo ia cair, Casillas manteve o FC Porto de pé. Que mais se pode pedir a um guarda-redes?

Outra vez, a entrada (+/-) - Dois extremos criativos, dois avançados. Uma ideia clara de começar a pressionar logo no início de construção do Sporting. Abdicar de uma construção mais lenta logo no início para empurrar cedo o Sporting para o seu meio-campo. O FC Porto apresenta-se com unidades e plano de ataque, marca cedo, não deixa o Sporting fazer nada nos primeiros 20 minutos. Tal como contra o Benfica, NES não teve receio de preparar um FC Porto declaradamente ofensivo para o clássico, sem receio do adversário na entrada em campo. Mas uma vez mais, foi uma intenção que se esfumou por completo na segunda parte. A diferença é que desta vez houve Casillas.





Demasiados Rebelos (-) - O Estrela da Amadora tinha, na década de 90, um central chamado Rebelo. Um daqueles dinossauros rijos como já não há no futebol português, guiado pela máxima «ou passa a bola, ou passa o jogador». Rebelo não facilitava: estava lá para chutar a bola para longe. E jogo após jogo, ouvia-se na Reboleira: «Alivia, Rebelo!» E assim era, minuto após minuto: o Rebelo fazia questão de devolver a bola para o meio-campo adversário. Fez bem o seu trabalho.

Houve um fenómeno similar no Dragão: parecia não haver meio-campo, tamanha a insistência em que as bolas era diretamente chutadas em profundidade para as costas das laterais do Sporting. Pode ser uma boa jogada para surpreender o adversário, mas quando o FC Porto não faz outra coisa o jogo todo, é óbvio que há motivos para preocupação.

Danilo, Marcano e Felipe têm uma eficácia de passe acima dos 82% na Liga. São por norma certinhos na saída de bola. Contra o Sporting, Danilo teve 54,2%, Marcano 61,1%, Felipe 78,6%. Mais, Maxi teve 53,3%, Alex Telles 50% e Casillas 39,1%. Isto tem uma justificação: o FC Porto só procurava bater bola na frente para o flanco. Poucas vezes construiu jogadas pelo meio, tanto que Óliver Torres fez apenas 29 passes em todo o jogo e Danilo 24. Em média, Danilo costuma fazer 57 e Óliver 48.

Cada bola longa do FC Porto nas costas das laterais era uma bola entregue ao Sporting. O FC Porto bateu mínimos de posse de bola no campeonato no Dragão, com 34%, mas mais preocupante ainda, errou 37% dos passes que fez. É certo que o 1x0 nasceu, inicialmente, da intenção de uma bola longa, mas houve dois fatores que diferenciaram o lance: primeiro, André Silva ganhou a primeira bola de cabeça, coisa que poucas vezes os avançados do FC Porto conseguiram fazer; depois, Corona soube esperar pelo momento exato para meter a bola no sítio certo na grande área. Foi uma das poucas vezes em que houve cabeça no ataque do FC Porto, em que houve uma jogada desenhada que não fosse um balão para a frente.

O lance do 2x0 ajudou, e muito, a disfarçar uma exibição que estava a ser limitada: o passe de Danilo é soberbo, mas foi a diagonal de Soares a torná-lo ainda melhor. Se é certo que o FC Porto, apesar de tudo, quase não permitiu que o Sporting existisse na primeira parte, na segunda o FC Porto desiste por completo de ter a bola. Apareceram demasiados Rebelos em campo: o que importava era que a bola estivesse longe do meio-campo do FC Porto e que o relógio passasse. O Sporting entra 43 vezes na grande área, faz 18 cruzamentos, e apesar de não ter tido propriamente muitos remates perigosos viu o FC Porto dar-lhe por completo a iniciativa de jogo.

Ganhámos? Sim, que foi o que interessa. Mas bastava Casillas não ter chegado àquela bola, ou Rui Patrício ter chegado a uma das de Soares, que isto e muito mais cairia em cima da exibição da equipa e das opções do treinador. O ideal é que isto tenha sido um meio para um fim: o FC Porto usou armas diferentes para ganhar ao Sporting, mas não tenciona acabar a época a jogar resumido ao chutão para a frente. Se é verdade que no final funcionou, bastava a luva de Casillas ter escorregado e tudo seria diferente. Ganhámos quando importava, mas não vamos ganhar muitas vezes assim. Nem vale a pena tentar.


PS: Um à parte. Se dúvidas existiam para alguns, um exemplo perfeito de como Jorge Jesus nunca, nunca poderá vir a treinar o FC Porto. Nunca. Logo após um clássico, cair em cima de um miúdo que fez a sua estreia pela equipa principal num grande clássico revela um nível de asquerosidade do qual nem Jorge Jesus parecia ser capaz. É certo que o problema maior não é Palhinha: Jorge Jesus estava a deixar uma crítica maior a Bruno de Carvalho do que ao próprio Palhinha. Na prática, o que Jesus estava a afirmar é que não teve os reforços que queria, estava a deixar um recado interno. Por isso, «paga-se um bocadinho caro» ter uma equipa com uma grande base da formação. Acontece que Jorge Jesus estava habituado, no Benfica, a ter todos os jogadores caros que queria. E sem ter compras de luxo, não consegue ir além de um nível mediano que, no final, roça a mediocridade. Um treinador que culpa um jogador de não levar o guião correcto, quando o treinador é que é o responsável por passar o guião aos jogadores, diz tudo sobre o seu nível. Jorge Jesus, no Dragão, nunca. Ou então sim, desde que seja sempre como treinador visitante... e derrotado.