Um líder que joga limpinho

Uma questão: Nelson Semedo fez penalty sobre Pedro Santos no Benfica x SC Braga? Fez. O árbitro assinalou o devido penalty? Assinalou. À partida estaria tudo esclarecido, mas aparentemente há alguma indignação por ter sido assinalado um penalty contra o Benfica, por ter soado a «gozo».

De facto, é difícil compreender. Gozo seria não ter assinalado aquele penalty, como tantos outros ao longo do último ano. Fosse 1 de abril, 25 de dezembro ou 30 de fevereiro, aquele penalty tinha que ser assinalado, porque era falta. Mas há quem esteja indignado por Nuno Almeida o ter feito.

Não vamos entrar num campo psicanalítico, mas aparentemente alguns preferiam que aquele penalty não tivesse sido assinalado, e que assim fosse mais uma das faltas cometidas por jogadores do Benfica que não deram direito a penalty - que é precisamente o que vinha sendo criticado no último ano.

A diferença entre a UEFA e Portugal

O problema não foi o penalty de ontem: foram aqueles que estiveram por marcar durante um ano inteiro, e que poderiam ter reflexo na classificação. Alguns adeptos talvez preferissem poder continuar a dizer que «o Benfica não tem penaltys contra há um ano», mas assim têm que fazer reset na contagem. O problema não é esse: se é penalty, é para marcar.

Há coisas bem mais pertinentes a ser discutidas. O Benfica deixou de ser a única equipa da Europa a não sofrer penaltys, mas ainda é o único líder dos campeonatos europeus que não sofreu uma única expulsão. Nem uma. A única equipa a aproximar-se deste tamanho fair-play é o Dortmund, 2º na Alemanha.

Na verdade o Benfica é a equipa mais disciplinada do nosso campeonato: apenas 59 cartões em 28 jogos. E aqui surge este interessante case study: como é que o Benfica consegue ser a equipa mais disciplinada da Liga e a mais indisciplinada da Europa?

Entre as equipas que estão na Liga dos Campeões, o Benfica é a equipa que tem mais faltas (116, mais 18 do que o PSG, o 2º da lista) e a que tem mais cartões (25, mais 8 do que o PSG, também 2º da lista). E não ficamos por aqui: o Benfica é também, a par do Bayern Munique, a única equipa ainda presente na Liga dos Campeões que já teve um jogador expulso.

Que mestria tática é esta que leva o Benfica a ser a equipa mais faltosa e indisciplinada da Liga dos Campeões e a que joga de forma mais limpinha em Portugal?

Outro case study será perceber a mudança de comportamento do Benfica essencialmente desde 2012. Nas últimas épocas, o Benfica esteve sempre entre as equipas mais disciplinadas da Liga. A saber:

Em 2014-15, foi a 3ª mais disciplinada, com 81 cartões, 1 um duplo-amarelo e 1 vermelho.

Em 2013-14, foi a 2ª mais disciplinada, com 66 cartões e 2 duplos-amarelos.

Em 2012-13, foi a 2ª mais disciplinada, com 57 cartões, 3 duplos-amarelos e 3 vermelhos

A época 2011-12 foi um momento de transição. Nessa época o Benfica foi a 7ª equipa mais disciplinada, com 88 cartões, 4 duplos-amarelos e 1 vermelho.

Antes era bem pior: em 2009-10, o Benfica foi apenas a 9ª equipa mais disciplinada, com 87 cartões, 1 duplo-amarelo e 2 vermelhos. Em 2008-09, muito pior: 11ª equipa mais disciplinada (ou seja, top 5 das mais indisciplinadas), com 81 cartões e cinco duplos-amarelos. Por fim, em 2007-08, o Benfica tinha sido a 5ª mais disciplinada, com 65 cartões, um duplo-amarelo e dois vermelhos.

Conclusão: até 2012, o Benfica nunca esteve entre as equipas mais disciplinadas na Liga (chegou a estar fora do top 10). Mas desde a época 2012-13, o Benfica esteve sempre entre as 3 equipas que menos cartões veem. 

Muitas coisas poderão explicar este fenómeno. Mas fica apenas a menção a uma pequenina coincidência: a época 2012-13 foi a primeira completa com Vítor Pereira no Conselho de Arbitragem.