Presidente reeleito, entrevista pós-eleições dada, tempo de análise. A começar pela
afluência às urnas, sem dúvida uma notícia que se saúda: o facto de o número de votantes quase ter dobrado, apesar de continuar a haver lista única. Quando o FC Porto passar a ser um clube minimamente modernizado e globalizado no
processo eleitoral, abrindo espaço para votar online e nas casas do FC Porto espalhadas pelo país, o número de votantes vai certamente disparar - algo que deve ser uma realidade (no máximo) já para 2020.
Pinto da Costa pareceu estar sempre mais satisfeito com o aumento do número do votantes do que preocupado com a grande quantidade de votos nulos. Embora admitindo que possa ter havido quem votou em 2013 mas não votou em 2016, de umas eleições para as outras houve 1145 «novos» votantes. Ora e desses «novos» votantes, há mais portistas a votarem em Pinto da Costa do que contra: 494 fizeram votos nulos, mas 651 votaram a favor.
Ou seja, mais portistas às urnas significou mais votos para Pinto da Costa. Nessa perspetiva, é natural que o presidente esteja satisfeito e desvalorize os votos contra. Mas uma coisa é o número de votos, outra é a percentagem. E 21% de votos nulos, equivalente a 505 votantes, é um número muito elevado e que serve claramente de alerta.
Vejamos. Nos cinco atos eleitorais do séc. XXI que antecederam este último, Pinto da Costa foi sempre reeleito, com as seguintes percentagens:
2013: 99,13%; 1258 votos (11 nulos)
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Um sócio a votar |
2010: 98%; nº de votos não divulgado
2007: 98,6%; 3820 votos (51 nulos)
2004: 99,3%; 1068 votos (8 nulos)
2001: 98,8%; 1258 votos (12 nulos)
Embora em 2010 não tenha sido divulgado o número de votantes (fica a ressalva), entre 2001 e 2013 foram contabilizados 82 votos nulos. Ou seja, no simples ato eleitoral de 2016, os votos nulos aumentaram 6 vezes mais do que no espaço espaço de 12 anos. Não é possível minorizar a quantidade de votos nulos, de todo, pois foi francamente elevada quando avaliada por este prisma. E confirma sinais já dados antes, como uma AG que não teve espaço na sala para todos os sócios (mais de 300, quando anteriormente marcavam presença 20 a 40); e a própria lista de apoio à recandidatura de Pinto da Costa, desta vez, recolheu apenas 10 mil assinaturas, ao contrário das 20 mil do passado recente (neste caso não se pode tirar ilações definitivas, pois não se sabe se quantas pessoas a Comissão de Apoio à Recandidatura abordou para assinarem).
Mas logo no anúncio dos resultados foi dito que a percentagem de votos nulos devia-se ao facto de muitos adeptos terem escrito mensagens de apoio a Pinto da Costa, e que por isso os seus votos foram inutilizados. De facto, houve movimentos de apelo ao voto nulo em alguns espaços da internet, e um grupo de associados fez questão de fazê-lo no próprio dia e imediações do Dragão - o «Acorda Porto». Dezenas de adeptos pelos mais diversos espaços ligados ao FC Porto na internet afirmam que fizeram votos nulos, e vários até tiraram fotos para as publicarem (não o deveriam fazer, pois o voto é secreto, mas o procedimento também pouco teve de secreto).
O que se desconhecia, de todo, é que alguns adeptos tenham optado por votos nulos para apoiar Pinto da Costa. Não só são visionários como, esses sim, estão de parabéns: cumpriram na íntegra o artigo 3 do Regulamento Eleitoral, ao votarem com o maior secretismo. Não criaram sites, não tiraram fotos aos seus boletins, não fizeram cartazes; chegaram, escreveram «Força Porto» e «Força Presidente», inutilizaram os votos e está feito.
Essa foi a justificação da mesa da Assembleia Geral, e como não podemos ver os votos, ninguém a pode desmentir. Mas cá fica a reflexão: porque é que nenhum dos votantes se lembrou, entre 2001 e 2013, quando Pinto da Costa venceu sempre as eleições com mais de 98% dos votos, de escrever mensagens de apoio a Pinto da Costa nos boletins? Só se lembraram de o fazer em 2016, logo quando houve um movimento de apoio ao voto nulo como forma de protesto? Assinale-se a coincidência. A percentagem de votos nulos deve ser levada muito a sério, por todas as razões enumeradas nestes parágrafos.
Quanto à entrevista, Pinto da Costa começa por dizer que não vê nos votos nulos um «cartão amarelo». E depois segue-se uma comparação infeliz e sem qualquer espécie de sentido, ao questionar o que sentirão o Presidente da República e o primeiro-ministro. Primeiro, Marcelo Rebelo de Sousa não é o maior presidente da história da República, nem sequer António Costa é o melhor primeiro-ministro de sempre; Pinto da Costa, esse sim, é o melhor presidente da história do futebol, logo comparar-se a esses dois nomes é reduzir-se a si próprio. Depois, nenhum deles concorreu sozinho para os respetivos cargos. Poderia ser apenas uma piada e uma forma de abrir uma conversa bem disposta, mas não fez qualquer espécie de sentido.
Pinto da Costa diz que não sentiu qualquer tipo de fúria dos adeptos, inclusive quando esteve a poucos metros das mesas de café onde os sócios estavam a votar. Mas o presidente esperava ser contestado naquele local? Não, os associados foram lá para votar secretamente, não foram lá para contestar o presidente - até porque quem vai às urnas não espera encontrar lá o candidato em quem vai, ou não, votar. Outra reflexão para futuras eleições: se houver dois candidatos à presidência do clube, poderá estar um deles em amena cavaqueira ao lado dos votantes? Certamente que não seria bem visto.
De destacar o pormenor de Pinto da Costa ter dito que «durante anos não faltam candidatos», mas a verdade é que ninguém, nos últimos 3 anos, manifestou qualquer desejo de ser já candidato - Vítor Baía deixou claro que gostaria de avançar quando Pinto da Costa saísse; já António Oliveira, a candidatar-se, será sempre também depois de Pinto da Costa sair (até lá continuará a fazer eternos elogios ao presidente; pois nas futuras eleições, provavelmente a massa associativa verá com muitos melhores olhos alguém que sempre defendeu e elogiou Pinto da Costa do que alguém que o criticou).
Diga-se que falar de sucessão um dia após Pinto da Costa ser reeleito não faz nenhum sentido. Agora que Pinto da Costa foi reeleito, só temos que nos preocupar com o trabalho do presidente a ser desenvolvido até 2020. Em 2013, Pinto da Costa disse que «quem vier a seguir só tem que não estragar». Mas se o presidente acaba de reestruturar a SAD e se o clube «bateu no fundo», então é porque há coisas que, se não estão estragadas, então têm que ser altamente melhoradas. Não há maior desafio para Pinto da Costa do que, daqui a 4 anos, continue ou não no FC Porto, poder dizer: «Quem vier a seguir só tem que não estragar».
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Entrevista ao Porto Canal, a 18-04-2016 |
Depois, Pinto da Costa passou para uma parte bastante agradável da entrevista e motivadora para todos os adeptos do FC Porto. Diz o presidente que não gostava que os filhos ou a mulher sucedessem ao seu lugar. Muito bem Pinto da Costa, desde logo a fazer afirmações com as quais todos os portistas se podem identificar. O único filho(a) de franca utilidade ao FC Porto é André André (o exemplo mais reconhecido; há também certamente outros frutos a ter em conta, como Francisco Ramos ou Afonso Sousa). O presidente deu ainda um voto de confiança a toda a sua estrutura, dizendo inclusive que vê nela gente como capacidade para suceder ao seu lugar.
Pinto da Costa pode e deve ter influência na escolha do seu sucessor no futuro. E deve exercê-la da seguinte forma: chegando ao dia das eleições e votando. Qualquer outra ação, como disse e bem, seria um atestado de mediocridade à capacidade dos sócios. Quando Pinto da Costa sair, e tendo em conta que foi através do presidente que (quase) todos os administradores chegaram ao FC Porto, mandam os princípios éticos e de serviço ao clube que acompanhem todos a sua saída. Depois, se algum deles quiser candidatar-se, então que o faça; o resto são os sócios a decidir.
Pareceu valorizar-se excessivamente a
vitória sobre o Nacional. Foi uma boa exibição, mas foi contra o Nacional, uma das piores equipas a jogar fora de casa no campeonato; e foi no Dragão, onde no passado recente todos os adversários caíam. Foi uma boa vitória, uma boa exibição, mas se a equipa não vencer em Coimbra já
ninguém se lembrará deste jogo. Se calhar, daqui a um mês, quem viu este jogo só se lembra de um jogador do Nacional: do guarda-redes, o que diz muito da sua qualidade este ano. Ah, e Chidozie não jogou neste jogo.
No que toca a contratações, as declarações de que Pinto da Costa deseja «duas ou três» contratações cirúrgicas foram importantes com vista à estabilidade no plantel. Não se pode pedir o título - ou torna-se difícil fazê-lo - quando se perdem 7 titulares de uma época para a outra (algo que foi francamente ignorado na projeção para esta época por muita gente). A questão dos eventuais regressos de ex-jogadores foi mencionada, e é natural que Pinto da Costa o vá tentar. O presidente anunciou que a equipa do próximo ano vai ser «uma equipa à Porto». E que melhor garantia disso do que fazer regressar jogadores à Porto? Veremos se se desenha alguma possibilidade de isso acontecer.
Curiosa a afirmação de que Hernâni, que aparentemente vai regressar, «está a brilhar no Olympiacos». De facto, quando Hernâni joga, deixa sempre a impressão de que merecia um pouco mais de oportunidades. Mas se não as tem, então é por algum motivo. Hernâni só foi 5 vezes titular no campeonato grego (contando apenas com os campeonatos nacionais, jogou menos do que Quintero no Rennes), mesmo com um treinador (Marco Silva) cujo modelo de jogo (contra-ataque/transição rápida/insistir pelos flancos) encaixava nas suas caraterísticas. Se a questão é Marega vs. Hernâni, nem merece discussão; que Hernâni tenha condições para se impor no FC Porto, restam muitas dúvidas. Mas essas devem ser dissipadas pela avaliação do treinador.
De qualquer forma, as afirmações de Pinto da Costa levam a crer que não se vão contratar Maregas, Hernânis ou quaisquer outros jogadores que: não tenham qualidade; não tenham caraterísticas adequadas; necessitem de grande período de adaptação; sejam com vista a melhorar o plantel mas não necessariamente o 11. Segundo o presidente, quem vier será para chegar, ver e jogar. Plano subscrito.
Pinto da Costa entrou depois num tema inesperado: o impacto que os pagamentos ao Estado têm no FC Porto. Em «
Não temos que pagar as contas do Benfica», já tinha sido aqui realçado que o FC Porto é sem dúvida um dos maiores clientes do Estado, enquanto outros beneficiam de perdões, isenções e afins. Mas a afirmação de Pinto da Costa de que o FC Porto paga 40M€ de impostos, tendo um orçamento de 150M€, merece algum enquadramento.
O presidente já tinha anunciado, em setembro, que o FC Porto pagou
31,68M€ de
impostos na última época. Agora refere-se ao pagamento de 40M€ no último ano. Numa SAD que teve despesas operacionais de 110M€, e cujos custos totais com aquisições da última época ascenderam a 53,3M€, falar em 40M€ de impostos requer um melhor enquadramento. Por exemplo, há que ter em conta a dedução do IVA, e o facto da responsabilidade do IRS ser aplicável a todos os jogadores e trabalhadores do FC Porto. Que o FC Porto é um clube sem apoios, sem dúvida; mas já o era há 10, 20, 30 anos.
Pela primeira vez, Pinto da Costa revelou os números da proposta da NOS que o FC Porto teve em mãos: 320M€. Se assim foi, confirma-se, se ainda havia dúvidas, de que o
negócio com a MEO foi o melhor possível para a SAD, com ou sem comissões - a acusação de Bruno de Carvalho que nunca teve resposta ou receptor. Mas falar do contrato de direitos televisivos como alternativa à falta de financiamento por parte dos bancos não faz sentido. Os bancos não dão receitas operacionais: antecipam verbas, financiam a atividade corrente da SAD, emprestam dinheiro; já as receitas televisivas sempre fizeram parte da gestão operacional da SAD.
Pinto da Costa realçou a importância que Reinaldo Teles e Antero Henrique vão ter na gestão do futebol nos próximos 4 anos. Assim sendo, esperamos ver Reinaldo e Antero Henrique, pelo menos uma vez por época, no Porto Canal a falar sobre cada época desportiva; se temos dois dirigentes que vão ser influentes no futebol da SAD, então há que ouvi-los, para não se esgotar tudo em Pinto da Costa e no treinador. Desde que o Porto Canal foi criado, quantas pessoas responsáveis pelo futebol do FC Porto vimos dar entrevistas além de Pinto da Costa?
Sobre o treinador, por esta altura o FC Porto já tem que saber se vai ficar ou não com José Peseiro. Jesualdo Ferreira também acabou 2009-10 a ganhar 8 jornadas consecutivas e a conquistar a Taça de Portugal, mas saiu. Logo, nada do que Peseiro possa fazer neste fim de época devia mudar a decisão da SAD (Pinto da Costa admitiu, e bem, que não pode ser a Taça a decidi-lo). Se quer mantê-lo, que seja pela convicção que têm à data de hoje, e não por aquilo que forem às últimas jornadas. Pinto da Costa não podia fazer outra coisa senão reforçar a confiança de um treinador que pode ganhar a primeira Taça para o Museu do FC Porto, mas uma coisa é o discurso para fora e para o balneário, outra é a posição interna da SAD.
Depois não podia faltar o «espaço L», que parece tornar-se obrigatório em todas as entrevistas de Pinto da Costa: falar de Lopetegui. A bem da verdade, quem puxou o tema foi Miguel Guedes, que recentemente culpou Lopetegui por toda a má época do FC Porto. Mas uma vez mais, perdeu-se mais tempo a falar de Lopetegui do que do presente/futuro treinador do FC Porto. Aqui não vamos regressar a este tema: se Lopetegui sentir que deve dizer algo, que o faça, pois está no seu direito.
Direito esse de que já usufruiu
Angelino Ferreira. Os adeptos do FC Porto sempre tiveram a sensibilidade de nunca misturar os assuntos pessoais e particulares de Pinto da Costa como a sua atividade no clube - e o mesmo se poderá dizer de todos os outros dirigentes, desde Reinaldo Teles a Antero Henrique -, mas foi isso que o presidente fez relativamente a Angelino Ferreira, ao falar na Gaianima. Também não seria nada bonito o ex-administrador vir agora dizer que Pinto da Costa ou Antero Henrique andam preocupados com a
Operação Fénix e com as acusações do Ministério Público, ou que Reinaldo Teles esteve ocupado com o BPN. Evitável e inoportuno. Uma realidade onde nos tornamos amigos de quem nos atacava (Carlos Pereira, por exemplo) e em que nos viramos contra quem trabalhou durante vários anos na SAD e é portista é algo no qual poucos portistas se devem rever.
A entrevista termina com o tema (lançado por Júlio Magalhães, diga-se) mais ansiado pelos portistas: Pinto da Costa a manifestar apoio político ao PCP e a discutir o momento do país. Era mais interessante do que, por exemplo, debater o enquadramento do fair-play financeiro para esta época, sem dúvida.
Presidente reeleito, entrevista de lançamento (goste-se ou não) dos próximos 4 anos dada. Este foi o caminho que os associados do FC Porto, ou a sua maioria, escolheram. A confiança foi dada, agora há que correspondê-la por parte da SAD. Mãos à obra - neste caso, à reedificação da obra a que chamamos FC Porto.
Pergunta(s): Reações à entrevista do presidente e que expetativas no lançamento do novo mandato?