segunda-feira, 26 de agosto de 2019

Ode triunfal

Do inferno ao céu. Onze dias separam a derrota frente ao Krasnodar e o consequente afastamento da Liga dos Campeões da vitória do FC Porto, por 2x0, em pleno Estádio da Luz. Meia dúzia de sessões de treino. O mesmo plantel, o mesmo treinador, apenas um pouco mais de tempo de preparação. 

O mesmo grupo que ficou negativamente marcado na história do FC Porto por ter «quebrado» o recorde de presenças na fase de grupos da Liga dos Campeões presenteou os adeptos com aquela que foi, provavelmente, a mais brilhante vitória da história dos dragões no Estádio da Luz em jogos do Campeonato. Um sinal de que treinador e jogadores sentiram a responsabilidade, sentiram a necessidade de resposta, sentiram o peso do clube. Nada do que aconteceu na Luz vai mudar o que aconteceu frente ao Krasnodar, mas abre perspetivas renovadas para uma época na qual há quatro títulos para atacar.


Sim, esta foi muito provavelmente a melhor exibição da história do FC Porto numa visita ao Benfica em jogos da Liga. O resultado, por si só, já o defende: apenas por uma vez o FC Porto tinha conseguido, em jogos do Campeonato, ganhar por mais de um golo na Luz - na longínqua temporada de 1950/51. Mas como todos sabemos, os resultados não descrevem tudo. No caso do FC Porto, foram dois golos, mas podiam ter sido mais. No caso do Benfica, sim, o resultado foi demonstrativo: zero.

Foi isso que o Benfica foi durante 90 minutos frente ao FC Porto: zero. Porque a forma como Sérgio Conceição preparou o jogo e a execução tática dos jogadores em campo não permitiram mais do que isso. O FC Porto foi constantemente superior ao longo de 90 minutos. O Benfica, uma equipa de golo fácil no contexto de Campeonato português, muito forte nas diagonais, nos corredores e na profundidade foi reduzida a zero ocasiões de golo na partida. Marchesín só teve que esboçar uma defesa. Pizzi não teve para onde passar, Rafa não teve por onde correr, os corredores do Benfica foram barrados e a dupla de avançados foi reduzida a um papel fantasmagórico nas proximidades da grande área.

A estratégia de Sérgio Conceição foi perfeita. Taticamente, foi provavelmente o melhor jogo da sua carreira de treinador. Secou por completo o adversário enquanto preparou o FC Porto para ter as suas oportunidades - os momentos de procura de profundidade não existiram como modelo de «construção» da equipa, mas sim como arma de ataque ao último terço quando o espaço se abriu. O FC Porto teve um sentido posicional perfeito, roubou as linhas de passe e o espaço interior ao Benfica e teve uma pressão perfeita sobre o portador da bola. O Benfica não sabia o que fazer, não teve resposta e o FC Porto dominou por completo. Nunca é de mais recordar que o Benfica mantém uma grande base de jogadores da última época, enquanto o FC Porto apresentou-se na Luz com mais de meia equipa nova. No entanto, entendimento e sintonia só mesmo do lado azul e branco. 

Marchesín pouco teve para fazer, jogou mais com os pés do que com as mãos, mas transmitiu sempre serenidade à defesa e ganha cada vez mais peso como voz de comando. Corona, face a uma concorrência que inclui o inapto Saravia, o insuficiente Manafá e o inexperiente Tomás Esteves, provavelmente fixou-se como primeira, segunda e terceira opção para lateral-direito, no teste mais difícil que poderia ter na I Liga. Pepe e Marcano meteram Seferovic e De Tomás no bolso e formaram uma muralha à frente de Marchesín. Telles, pelo equilíbrio tático da equipa, teve liberdade para atacar, desequilibrou e cumpriu.

Danilo Pereira e Uribe foram uma das chaves da vitória e mostram ser insubstituíveis na equipa. O colombiano quase dispensou o período de adaptação e encaixou na perfeição no 11, com um papel de equilíbrio fundamental pela meia direita. Recupera, preenche, distribui. Já o capitão de equipa voltou ao seu nível e teve um sentido posicional perfeito no miolo, mas nunca se inibindo de dar amplitude ao jogo da equipa.

Romário Baró tem sido uma das apostas surpresa de Conceição e, se na Rússia pareceu «perdido» vários momentos na equipa, na Luz foi importante para o equilíbrio da equipa na direita e surgiu bem mais maduro em campo. Meia dúzia de treinos depois, mostrou um crescimento que talvez só se alcançaria com meses de trabalho. Não estamos a falar de um jovem talento que aparece com liberdade num clássico, mas sim num miúdo que carregava uma importante missão tática e que a conseguiu cumprir. 

Luis Diaz, por sua vez, está a revelar-se uma surpresa. Não por não trazer potencial da Colômbia, mas pela prontidão e rapidez com que está a ganhar espaço na equipa. É muito raro um jogador sair diretamente da Liga colombiana para um grande clube europeu (por norma dão primeiro o salto para México ou Argentina), mas Diaz está a ter um impacto tão precoce quanto brutal. Ganha metros com bola, é rápido e incisivo no 1x1 e sabe escolher que terrenos pisar. 

Zé Luís, o terceiro jogador a fazer 5 golos nos primeiros 5 jogos pelo FC Porto nos últimos 40 anos, já conquistou os adeptos. A qualidade e as caraterísticas do jogador faziam todo o sentido num clube como o FC Porto. Possante, capacidade técnica, jogo aéreo, capacidade de finalização e de trabalho de costas para a baliza, ataque à profundidade ou no espaço curto... O cabo-verdiano tinha, tem, tudo. No contexto e companhia certas é jogador de 30 golos por época. Não esquecer que era um jogador muito bem referenciado pelo departamento de scouting do FC Porto quando ainda estava no Gil Vicente. Esteve, como disse Conceição, a «marinar» na Rússia, mas no FC Porto encontra finalmente o espaço certo para revelar toda a sua qualidade. Não vai marcar em todos os jogos, mas com ele em campo o FC Porto estará sempre mais perto do golo.

Marega foi... Marega. Capaz de nos levar ao desespero com mais um falhanço em clássicos e, minutos depois, matar o jogo. Lutou e correu a toda a largura do campo, criou duas ocasiões de golo e entendeu o seu papel na reta final da partida: era o momento de ataque à profundidade, de cair nas costas da defesa do Benfica, e aí destaca-se a leitura perfeita de Otávio e a arrancada para o 2x0. 

Foram 90 minutos em que a equipa superou qualquer momento menos bom das individualidades. O discurso de Zé Luís no final da partida disse tudo sobre o entrosamento e a união que os jogadores levaram para este jogo. Cada jogador entendeu o colega e correu por ele. Sérgio Conceição aprendeu com os erros do último clássico e não teve medo de ser ambicioso. Não teve medo de ser melhor e de querer mais do que o Benfica. Vitória em toda a linha.

Entre todos os elogios a 90 minutos que merecem cada um deles, sobra isto: foram apenas 3 pontos. Ontem não estava tudo perdido e hoje não está nada ganho. O FC Porto continua fora do primeiro lugar e, ao mínimo deslize, pode passar novamente para trás do Benfica. O próximo adversário é um exemplo perfeito de que não podemos relaxar, nem com uma vantagem de 2x0 no Dragão. Equipa e adeptos recuperaram a confiança, mas como sabemos, esta tem sempre um prazo de validade que se esgota ou renova jogo após jogo. O Campeonato vai ser longo, mas do Estádio da Luz trazemos algo que bem nos pode acompanhar toda a época: quando o FC Porto eleva os seus níveis de competência ao limite, não há Benfica que consiga competir com isso.

sexta-feira, 16 de agosto de 2019

Carta aberta a Sérgio Conceição

Caro Sérgio,

Permite-me que recue até junho de 2017, quando te dei as boas vindas ao FC Porto e te desejei a melhor sorte como treinador principal. 

«Nenhum adepto sabe ainda se Sérgio Conceição vai jogar em 4x4x2 ou 4x2x3x1. Se vai jogar em posse, em transição rápida, se vai ser híbrido. Não é, até à data, um treinador que tenha diferenciado os clubes por onde passou com um estilo de jogo particularmente brilhante ou positivo. O Paços de Paulo Fonseca jogou melhor futebol que o Braga ou o Guimarães (apenas 8 vitórias em 2015-16) de Conceição, por exemplo. O que não é garantia de nada, mas que sugere uma coisa: o FC Porto não está, com Sérgio Conceição, a contratar um modelo ou uma ideia de jogo. 

Está, isso sim, a contratar sede de vencer e um homem que vai ao encontro das dificuldades, trocando o conforto pelo risco. Sérgio Conceição não é, provavelmente, a melhor escolha para treinador. Mas como homem, já começou a vencer pelo FC Porto: está disposto a queimar-se a ele próprio para ajudar a tentar a reerguer o clube que aprendeu a respeitar e a amar.»

Adivinha o que aconteceu, Sérgio. O esperado. Enquanto ganhamos, somos brilhantes, e ai de quem questione a exibição e todos os aspetos técnico-táticos quando o resultado é favorável. Agora, quando perdemos, tudo se resume ao treinador. Injusto, claro, mas já mais do que habitual.

És o 14.º treinador do FC Porto (contando com interinos e a passagem fugaz de Delneri) do pós-Gelsenkirchen. Sabes o que todos eles, exceto André Villas-Boas (que tão rápido teve enorme sucesso como saiu), tiveram em comum? Os adeptos, na sua aparente maioria, torceram a determinada altura pela saída do treinador. Ninguém escapou. Nem Co Adriaanse, nem Jesualdo, nem Vítor Pereira, que mais tarde se sagraram campeões. No FC Porto, qualquer treinador está a três ou quatro maus resultados de, para a generalidade, não servir e tomar mil uma opções que ninguém consegue compreender. 

Serão estas críticas justas, Sérgio? Vamos por partes.

Época 2017-18. O que fizeste? Adaptaste-te ao que tinhas. Sem reforços, mas como o tempo o revelou, esta temporada de contenção viria a revelar-se a mais cara da história da SAD. O futebol nem sempre foi o mais virtuoso, mas chegou para cumprir e superar as expetativas, consagradas com o título de campeão nacional e com a «nega» do penta ao Benfica. Tudo isto aliado a uma sempre importante qualificação para os oitavos-de-final da Champions. Título + passagem aos 1/8 da Champions? Perfeito, mesmo nunca gostando da Maregodependência e reconhecendo que bastava Herrera não ter rematado aos 89 minutos na Luz para mudar a forma como a massa olhava para a época.

Chega 2018-19 e, uma vez mais, levas o FC Porto a todas as decisões. É algo que só pode ser valorizado: com Sérgio Conceição, o FC Porto luta (quase) sempre, até ao fim, por todas as competições. A campanha na Champions teve resultados brilhantes, até cair nos quartos-de-final perante um Liverpool de calibre de campeão europeu. Nas Taças, tal como nas meias-finais de há um ano, a cruel ineficácia nas grandes penalidades, pela qual nunca um treinador pode ser sumariamente responsabilizado. 

E no Campeonato? Podias, devias, ser neste momento o treinador bicampeão nacional. É de uma insuficiência e injustiça tremenda lembrar esta época como sendo aquela em que o FC Porto desperdiçou uma vantagem de 7 pontos. É evidente que os pontos deixados no Minho e em Vila do Conde, já para não falar na receção ao Benfica, coincidiram com muita incompetência do FC Porto dentro de campo. Mas nem tudo se pode resumir a isso. Não podemos nunca ignorar que, da mesma forma que o FC Porto perdeu pontos quando não foi suficientemente bom, o Benfica também deveria tê-los perdido. O que aconteceu na Feira, em Braga ou em Vila do Conde manchou a história e a justiça do desfecho do Campeonato. 

85 pontos e 74 golos na I Liga 2018-19. Como mero termo de comparação, embora cada época tenha a sua história, o FC Porto campeão europeu de Mourinho fez 82 pontos e 63 golos. E aqui não há Decos ou Derleis. Para a história fica que perdemos. Mas não nos podemos esquecer de como a história foi sendo escrita. Sobretudo nós, as vítimas do som do apito, da doutrina divina e do som do Enter ao enviar e-mails. 

Mas de uma coisa não duvides, Sérgio. Poderias, neste momento, ser o treinador bicampeão nacional e eu dir-te-ia a mesma coisa: o teu modelo de jogo está completamente esgotado. O futebol como o imaginas, neste momento, tornou-se um modelo previsível, inconsequente e facilmente anulável por qualquer treinador do nosso Campeonato. Reafirmo-o, com sinceridade e preocupação.

Na primeira época, tivemos que te dar o mérito. Encontraste uma fórmula que funcionou. Longe dos tempos de um 4x3x3 com extremos virtuosos, um goleador no eixo, um meio-campo que combinava combatividade com classe. Mudaste tudo, apostaste numa dimensão mais física, pegaste na lista de dispensas e transformaste o FC Porto. Nesse momento, tiveste todo o mérito do Mundo, pois moldaste o FC Porto à tua imagem perante as circunstâncias.

Mas os tempos passaram e a ideia que foi ficando foi outra. Se calhar, esse não apenas o modelo que achavas que melhor servia o FC Porto naquela altura. Esse é o único modelo que concebes para o FC Porto. E, neste caso, não poderemos nunca estar de acordo, Sérgio.

Reforço o mérito que tiveste no teu trabalho nas duas primeiras épocas. Valorizarei um treinador que vai sempre às decisões e que luta sempre por títulos. Os adeptos mais exigentes dirão «não, no FC Porto só valorizamos quem ganha, não é quem vai às finais para perder!» E isso é ignorar as difíceis circunstâncias que encontraste no FC Porto desde a primeira hora. Poderíamos, neste momento, ter um Benfica hexa em Portugal. Não o temos pelo teu trabalho, Sérgio, pela forma como reinventaste a equipa. 

Defendi, por isso, que 2019-20 tinha que ser a tua época. Era a época em que finalmente irias construir o plantel, ter mais palavra na escolha de jogadores e de reforços, poderias trabalhar outra ideia de jogo. Mas não é isso que vemos. E é isso que temos que mudar.

Chega de tocar o bombo, Sérgio. O FC Porto, neste momento, resume-se a isto: eterna procura pela profundidade e jogo direto; bola que vai do defesa às costas dos laterais adversários; extrema dependência das bolas paradas; resistência a circular a bola, procurar espaço entre-linhas, tabelar em zonas interiores. A transição defesa-ataque é uma pobreza neste FC Porto. Digo-te agora, que és o treinador que caiu com o FC Porto para a Liga Europa, e dir-te-ia na época passada se fosses, como merecerias, o treinador bicampeão que esteve nos 8 melhores da Champions. 


Qualquer equipa adversária percebe que se fechar os corredores e não deixar que os avançados caiam nas suas costas anula o FC Porto. Prova disso é que um Gil Vicente que há uns meses estava no Campeonato de Portugal e que tem um camião de jogadores novos, cuja grande maioria nunca tinha jogado a este nível, conseguiu fazê-lo. Poderia ter sido diferente se tivéssemos aproveitado as oportunidades quando estava 0x0. Mas a crítica continuaria a ser a mesma: este FC Porto, com esta identidade e estilo de jogo, é curto. É previsível. É insuficiente. É, lamento, uma miséria a jogar à bola.

Fala-se demasiado em trabalho. Chega. Temos que falar em qualidade. Uma equipa dominadora, capaz nos quatro momentos do jogo. Organizada, equilibrada, com boa ligação entre os setores, onde um jogador saiba o que o colega vai fazer e como se deve posicionar. Saber que só podemos marcar se tivermos a bola e, se a tivermos, não vamos sofrer. Perceber que o espaço nas costas da defesa deve ser explorado perante a circunstância e oportunidade do jogo e não como jogada-padrão. 

E depois de tudo isto, reconheço. Será que tu próprio tiveste tempo para trabalhar novas ideias? Ou será que, perante as circunstâncias, tentaste trazer a base do ano passado para tentar ganhar no curto prazo?

Vejamos. O FC Porto perde 5 titulares no verão. Casillas, Felipe, Militão, Herrera e Brahimi. Perde a experiência de Maxi Pereira, e perde o 12º jogador mais utilizado e aquele que, insisto, foi o único nos 2 primeiros anos que manifestamente aproveitaste mal, Óliver. O teu melhor FC Porto teria que ter sempre Óliver no 11. O melhor futebol foi sempre aquele que teve Óliver em campo. Nunca compreenderei a forma como este jogador foi desaproveitado por ti. 

Adiante, há algo a ter em conta. A situação de Casillas foi um infortúnio, mas desde o ano passado que a SAD sabia que Herrera e Brahimi iam sair, Militão foi confirmado no Real em março e Felipe no Atlético em maio. As vendas que o FC Porto necessitava de fazer já tinham sido feitas em maio. Não temos aqui a desculpa da demora na chegada de reforços pela necessidade de antes sair alguém. Não, porque já tinham saído. 

Nenhum treinador tem o plantel composto no arranque da pré-época, mas a importância e a urgência da pré-eliminatória da Champions obrigava a SAD a uma rapidez que não pudemos testemunhar no mercado. Chegaram 7 caras novas, jogadores caríssimos e estamos perante o maior investimento da história do FC Porto no mercado de verão. São mais de 60 milhões de euros. E já vimos que os dedos estão apontados a ti. «Escolhemos o plantel dentro daquilo que ele queria», diz o presidente.

Mangala? Bruma? Pedro? Roger Guedes? Pavon? Rongier? Reine-Adélaide? Tudo nomes que fizeram correr tinta antes da chegada do arranque da pré-época. Temos que compreender que nenhum clube contrata todos os jogadores que quer. É normal passar do plano A para o plano B. Mas não podemos resumir a aposta no mercado a preferências de Sérgio Conceição. Não, se é o treinador da estrutura, a estrutura tem que partilhar responsabilidades com o treinador. Este não pode ser o plantel «dentro daquilo que ele queria». Tem que ser o plantel que o FC Porto quer. 

Uma equipa que perde tantos titulares e vai buscar jogadores a outro continente necessita de tempo. Tempo esse que, infelizmente, o FC Porto não teve e que custou caro. A derrota contra o Krasnodar mancha a época e uma era - o FC Porto deixa de ser recordista de presenças na fase de grupos. Mas a má preparação não esteve apenas na equipa. Héctor Herrera é um dos 10 jogadores com mais jogos da história do FC Porto na Champions. Goste-se ou não, a experiência na Champions tem um peso enorme. Onde estava o seu substituto na preparação para esta eliminatória? Amadorismo puro na gestão desde caso. Pinto da Costa admitiu a impossibilidade de renovar com Herrera em outubro. O seu substituto, Uribe, já depois de falhadas outras alternativas, não chega a tempo de estar devidamente pronto para a Champions. O próprio Marchesín mal tem tempo de conhecer os nomes dos companheiros antes de ser lançado às feras. Inqualificável.

E agora, Sérgio? A Champions já se foi e começamos o Campeonato a olhar para cima, já sob um clima de contestação e dúvida fortes. Qualquer treinador precisa de tempo para remodelar a equipa. Jamais a responsabilidade poderá ser resumida ao treinador. Mas tu próprio também terás que mudar, Sérgio.

Peço-te que faças o que fizeste na primeira época cá: adapta-te. Neste caso, é necessária uma mudança clara no futebol da equipa. Essa mesma mudança já deveria ter sido trabalhada desde o início de julho, mas não aparenta ser o caso. Ainda vamos a tempo. Estamos em agosto. Não há épocas ganhas nem perdidas em agosto. Mas o FC Porto, que à data de hoje tem uma equipa menos forte do que a da época passada, tem que evoluir. Só pode evoluir. Vamos defrontar um Benfica forte e dominante, dentro e, sobretudo, fora dos relvados. E não vai ser a tocar bombo que iremos longe. 


Tens que reconquistar o grupo e os adeptos. Os próprios jogadores «cansam-se» da insistência nos mesmos métodos. Tem que haver novos desafios, novos estímulos. Os jogadores têm que sentir que, treinando contigo, vão evoluir enquanto futebolistas, e não apenas serem formatados para este tipo de jogo. Têm que sentir que vão conquistar coisas. Têm que sentir que são temidos pelos adversários quando entram em campo. Têm que saber o que vão fazer. 

Sérgio, neste momento, tens no Olival o grupo responsável por ter «destruído» o recorde de presenças do FC Porto na fase de grupos da Champions. Pensem em todos os treinadores, jogadores e equipas que representaram o FC Porto desde a criação da Liga dos Campeões. Fizeram deste clube recordista e um nome ao qual todos se habituaram a ver na Champions. Em meros e míseros 35 minutos contra o Krasnodar, uma equipa que nunca sequer meteu os pés na Champions, destruíram tudo isso. 

Tens que dar a resposta. Tens que mudar a equipa, o estilo de jogo, tens que cativar os jogadores. Já frente ao Vitória de Setúbal, tem que haver uma resposta clara e contundente. É difícil, como sabias que era desde o primeiro dia. E esta época não será mais fácil do que as anteriores. Mas pegaste no FC Porto num dos momentos mais delicados da sua história, quebraste a hegemonia do Benfica e mantiveste o clube na disputa de todas as competições. Mas é tempo de mudar. Disseste que vinhas para ensinar, não para aprender. Mas tu próprio tens que aprender para evoluir. É impossível não teres aprendido alguma coisa nos últimos dois anos e, sobretudo, nos últimos dois jogos. É impossível não veres que a mudança é imperativa.

É verdade, nós não vemos os treinos. Mas aquilo que temos visto nos jogos também não pode ser o que tu vês nos treinos, pois é manifestamente fraco. O que se testemunhou em Barcelos e na Champions não pode ser o resultado de nenhum plano ou de trabalho, tamanho que é o caos e a desorganização.

Erros todos cometem. E todos têm redenção, exceto um: continuar a insistir no mesmo erro, à espera de resultados diferentes. Muda a equipa. Ouve os jogadores. Aceita a crítica. Podes cair enquanto treinador do FC Porto com as ideias de sempre ou reerguer novamente o clube aceitando a necessidade de mudar. Ninguém pode duvidar ou pôr em causa a tua dedicação e vontade de vencer no FC Porto. Arriscaste muito para teres sucesso aqui. Para ajudares o FC Porto a ter sucesso. E por ter noção do quão te dedicaste a esta causa é que não desisto de ti.

Reúne as tropas e prepara-te, pois há muito a ganhar esta época. Vocês são, à data de hoje, o grupo que tirou o FC Porto da lista de recordistas da Champions. Isso já não vão mudar. Mas podem mudar a forma como olharão para vocês em maio. Campeonato, Taça de Portugal, Taça da Liga e Liga Europa. Não vamos ganhar sempre, mas temos que lutar e jogar sempre para ganhar.