sexta-feira, 1 de dezembro de 2023

(Nem) tudo é sobre Pinto da Costa vs. Villas-Boas

Não há um elefante na sala. Há uma manada. Todos os caminhos vão agora dar a Pinto da Costa vs. Villas-Boas. Curioso quando nenhum dos dois é, à data, oficialmente candidato às eleições, embora ambos e respetivas «tropas» já se posicionem nesse sentido. E como os atos eleitorais do FC Porto não são mais do que uma mera formalidade há 40 anos, é algo novo na vida de muitos portistas e vai ser forçosamente o tema dominante nos próximos meses.


Ao contrário do que muitos possam advogar, não há «altura certa» para falar disto. O FC Porto, felizmente e por norma, está sempre a competir por algo até abril. Achar que há tertúlias que têm que ser limitadas ou quase tabu porque a equipa tem que estar «concentrada e unida» é insultar a capacidade de Sérgio Conceição e dos seus atletas em manterem o foco nos objetivos desportivos. Quanto a isso, podemos estar descansados. No balneário só há dragões, não há urnas nem candidatos. Nenhum futebolista fica acordado a ver a CMTV ou a fazer scroll nas redes sociais para perceber qual é a estratégia financeira da SAD e sobre em quem recai o sentido de voto.

É a altura certa para falar disto porque é a altura em que emergem duas coisas que não se viam há 40 anos: a SAD com receio de um candidato e um candidato capaz de aglomerar a contestação crescente face ao desempenho da SAD. Prova disso é que uma simples Assembleia Geral para aprovação das contas 2022/2023, com objetivos e graus de complexidade bem diferentes da AG para alteração dos estatutos do clube, deu mais ares de um Pinto da Costa vs. Villas-Boas do que outra coisa qualquer.

E a afluência é testemunha disso. Foi uma vitória de Pinto da Costa, porque as contas foram aprovadas. Mas foi também uma vitória de Villas-Boas, porque tomou a palavra e mostrou que a sua candidatura não vai recuar apesar das tentativas de intimidação e ataques de que tem sido alvo. Nada diz «estamos em período eleitoral» como ver dois candidatos terem vitórias na mesma noite. 

E sim, os portistas estão investidos neste tema. Basta ver os números ou ler as reações ao último texto d'O Tribunal do Dragão. Houve 819 sócios a votar numa noite de quarta-feira. 53% de aprovação, 187 votos contra e 198 abstenções. Embora as contas tenham sido aprovadas e que a SAD se tenha congratulado com isso, basta ver o passado recente para sentir a contestação crescente: na aprovação das contas de 2021/22, não houve um único voto contra e apenas 5 abstenções; já em 2020/21, houve apenas uma abstenção. Os resultados são diferentes, mas a equipa diretiva é a mesma. 

Há hoje mais adeptos a contestar Pinto da Costa nos palcos de decisão; mas isso não significa que não haja mais gente também a apoiar Pinto da Costa. Até à data, nenhum apoiante de Pinto da Costa sentia que o seu cargo estivesse sob ameaça. Hoje isso é uma realidade. Daí que não haja dúvidas que Pinto da Costa terá, em 2024, muitos mais votos do que os que teve em 2020; se isso significa que terá maior percentagem de votos, só o tempo o dirá.

Os dois tomaram a palavra na AG: AVB para criticar o desempenho da SAD, Pinto da Costa para criticar AVB. Entramos no campo da opinião, claro: Villas-Boas teve uma intervenção pertinente e objetiva. Falou de factos, de números. Não foi para lá falar de ninguém, mas sim das contas da SAD. Nada do que AVB disse é desmentível. Chegando ao final da sua intervenção, patinou: o desafio de AVB à SAD, ao dizer que só aprovaria as contas mediante a devolução dos prémios, soou prontamente a populismo. Villas-Boas tinha acabado de enumerar o descalabro financeiro da SAD e de revelar que chumbaria as contas como forma de protesto; dizer logo a seguir que afinal aprovaria as contas se a SAD renunciasse aos prémios que recebeu mostrou incoerência. As contas só eram passíveis de serem boas ou más mediante a remuneração variável de 1,6 milhões? Não. Eram más, ponto. E seriam más independentemente da SAD receber 10 cêntimos ou 10 milhões pelo seu desempenho. 

Pinto da Costa, no discurso final, visou diretamente Villas-Boas com acusações graves e que implicam esclarecimento. Primeiro, criticou AVB porque «veio para dizer mal». Não, AVB não disse mal: AVB enumerou números e factos. E se isso é dizer mal, é porque as contas são más. Mas a declaração chave foi esta: «Não venha ler papéis com números que lhe põem à frente.» Será que Pinto da Costa pode elucidar o universo portista sobre quem pôs esses números à frente de Villas-Boas? Parece saber coisas que não sabemos, até porque AVB ainda não apresentou nenhuma lista. Mais: levar um papel com números se calhar revela preparação; passar uma entrevista de uma hora a dizer «não sei», «não me recordo» ou «prefiro não responder porque não tenho a certeza dos números» revela outra coisa.

No dia seguinte, Pinto da Costa continuou e recordou as declarações de Villas-Boas, em que afirmava que não concorreria contra o presidente: «Se calhar achou que eu ia morrer mais cedo, mas ainda vai ter de esperar para ir ao meu funeral». Este sim, é o verdadeiro fait-diver. Porque os dois candidatos já disseram algo que agora têm que desmentir. Não vale a pena citar Pimenta Machado. 

Após a saída de Villas-Boas do comando técnico do FC Porto, Pinto da Costa deu uma entrevista ao L'Équipe em que dizia que iria sair da presidência do clube num prazo de 5 anos. Já lá vão 12. Em 2016, conforme citado pelo JN, disse que só se candidatou porque não havia mais ninguém. Quatro anos depois, apareceram Nuno Lobo e José Fernando Rio. Pinto da Costa disse então que afinal só não avançaria se um destes quatro nomes se candidatasse: António Oliveira, Rui Moreira, Vítor Baía ou... Villas-Boas. Pinto da Costa diz que AVB estava talvez a contar com a sua morte, mas também já se percebeu que Pinto da Costa só dizia isso porque não contava que realmente alguém o enfrentasse. 

Vale também sempre a pena recordar as palavras de Pinto da Costa no último dia em que foi às urnas, em 2020: «(AVB) é um sócio com as quotas em dia, não teve de ir a correr pagar cinco anos de atraso como alguns, tem capacidade e se tiver esse desejo e essa motivação, tem todo o direito e seria uma boa opção». Se é uma boa opção, tem que se tratado como tal; feliz do portista que tiver a possibilidade de escolher entre 2 boas opções nas próximas eleições.

Não haverá nada mais pertinente, por isso, do que ter um debate entre Pinto da Costa e André Villas-Boas antes das eleições em abril. Com ou sem papéis, frente a frente, olhos nos olhos um com o outro e sob o olhar dos portistas. De recordar que Pinto da Costa recusou, em 2020, entrar em debates com Lobo e Rio no Porto Canal. Aliás, disse que não recusou, simplesmente «não teve tempo», embora tenha dado 4 entrevistas antes do ato eleitoral - O Jogo, JN, ao Portal dos Dragões e... ao próprio Porto Canal. É por isso melhor começar a pensar em libertar já a agenda. Está só em causa o futuro do FC Porto. E para o FC Porto é sempre preciso tempo.

2 comentários:

  1. Foi pena o deslize contraditório e populista no fim do discurso. De resto, críticas objectivas do lado de AVB, ataques de carácter do lado de PdC e pintistas. Até o discreto e quase inatacável Dr. Madureira botou faladura e crítica. Foi uma derrota estrondosa de PdC, tendo em conta que estavam lá muitos afilhados do Dr. Madureira e mesmo assim houve 385 potenciais votos contra, onde normalmente tem havido 1 ou 2 ou 5. Foi quase um empate técnico, apesar da mobilização das tropas pretorianas, que foi notória na deslocada cantoria. PdC está assustado e não consegue esconder o medo, disparando graçolas de mau gosto a torto e a direito contra AVB, dando-lhe uma importância desmesurada. Mas os pobres dos inválidos e indigentes dele dependentes, estão ainda + assustados.

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  2. O que verdadeiramente impressiona é a forma que alguns dos normais adeptos ficam cegos e não conseguem ver a falta de rumo que PdC demonstra. Com a lição bem estudada e sem deslizes emocionais, AVB consegue argumentar bem e ser capaz de corresponder, do ponto de vista verbal (pois ainda é só um potencial candidato), às reais necessidades do clube. O discurso de PdC está esgotado, vazio, sem ponta por onde pegar...

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