É o maior orçamento da história do FC Porto. A SAD convocou os accionistas para votarem, a 13 de Novembro, num orçamento que prevê gastos operacionais de 114,2 milhões de euros - quantia que exclui as transações com passes de jogadores.
O problema (desafio, se preferir), como era defendido desde o início, não estava no investimento em contratações para 2014-15. Houve operações avultadas, mas em termos de tesouraria sem grandes implicações imediatas. O grande problema seriam os custos com pessoal e os fornecimentos e serviços externos. Os números propostos são os maiores da história da SAD e confirmam isso mesmo.
Para se ter uma ideia, a SAD pretende gastar, em 2014-15, 157,269% do dinheiro obtido em 2013-14 nas receitas operacionais. Um valor verdadeiramente astronómico e insustentável num contexto de futebol português, sobretudo tendo em que conta que o FC Porto não consegue sobreviver com as suas receitas operacionais e vai transitar (será proposto na AG) para 2014-15 um prejuízo líquido superior a 38 milhões de euros. Gastar mais do que 150% do que se ganha (embora isto não inclua as transações de passes) fala por si sobre o risco orçamental para a próxima temporada.
Comecemos pelas receitas operacionais. Em 2013-14, o FC Porto recebeu 72,613 milhões, sensivelmente menos 6 milhões do que em 2012-13. Já em 2014-15, a SAD prevê receber 89,222 milhões, repartidos pelos seguintes pontos:
Este aumento de cerca de 17M€ deve-se essencialmente à Champions. A SAD vai receber em 2014-15 dois prémios de participação acumulados e prevê já o apuramento para os oitavos-de-final. Em 2013-14 a Champions só rendeu 9,55M€, em 2014-15 a previsão é de 28,23M€.
Entre as principais rúbricas: As vendas? Baixam. A bilheteira? Sobe cerca de 700 mil euros. Direitos televisivos? Praticamente o mesmo. Publicidade? Desce (e em 2014-15 ainda entra a PT...). Corporate Hospitaly (Porto Comercial/Euroantas)? Mantém-se. O FC Porto basicamente não consegue evoluir em termos de receitas operacionais, pois a Champions é a única subida assinalável - e é uma falsa subida, pois inclui a receita a dobrar. Felizmente, o apuramento para os oitavos está bem encaminhado... Mas ir aos oitavos vale quase tanto como um ano de patrocínio da PT.
Tendo em conta o prejuízo líquido de 38 milhões que transita de 2013-14 e o défice operacional que a SAD apresenta já a abrir o orçamento de 25 milhões de euros, poderíamos falar da necessidade de fazer qualquer coisa como 63 milhões de euros em vendas no próximo exercício. E não se tratam de valores brutos, pois é preciso pagar impostos (as transferências incluem IVA), comissões, prémios de fidelidade e para efeitos contabilísticos abater o valor previsto enquanto activo antes de calcular a mais-valia (quem não sabe a diferença entre encaixe líquido e mais-valia depois surpreende-se). Jackson, Alex Sandro e Danilo? Certamente que a SAD já terá em vista uma solução. Apresentando um orçamento deste risco, não se admitiria de outra forma.
E agora os custos operacionais. Em 2013-14, excluindo as transferências, o FC Porto pagou o seguinte:
A época 2013-14 custou 95,175 milhões de euros. Os custos com pessoal foram de 48,885 milhões de euros. A redução deve-se exclusivamente ao facto do FC Porto não ter sido campeão, então os jogadores não receberam o prémio correspondente a tal (todos os clubes celebram um contrato colectivo, com os capitães de equipa, para prever o pagamento de prémios em caso de títulos - no FC Porto, é cerca de 200 mil euros por jogador).
Esta é a maior fatia da despesa do FC Porto. A outra são os fornecimentos e serviços externos, de 42 milhões de euros. Os custos são discriminados da seguinte forma...
Agora vamos a 2014-15. A SAD prevê que sejam estas as despesas operacionais...
Sim, o FC Porto vai gastar em salários 71 milhões de euros. Um aumento de cerca de 22 milhões de euros face a 2014-15, e o preço de ter construído um plantel vasto em soluções (ninguém disse que seria barato). Agora que estamos em finais de Outubro, claro que é fácil enumerar que as contratações de A ou B foram desnecessárias, ou que C e D seriam mais adequadas. Mas no planeamento da pré-época, foi construído um bom plantel, com profundidade e qualidade, e com soluções de sobra para Lopetegui (que também ainda há-de potenciar contratações que foram feitas).
Ou seja, o FC Porto vai gastar em salários em 2014-15 basicamente tanto quanto as suas receitas operacionais em 2013-14. Mas este não é o dado mais preocupante. O dado mais preocupante é que o FC Porto vai violar a recomendação da UEFA na relação salários vs. receitas operacionais.
Como o dr. Fernando Gomes explicou, e bem, a UEFA recomenda, dentro das normas de fair-play financeiro (diferença entre regras e recomendações, sendo que as recomendações destinam-se a um melhor cumprimento das regras), que os custos com pessoal não excedam os 70% das receitas operacionais.
Em 2012-13, o FC Porto apresentou 69%, quase o limite. Em 2013-14, baixou para 67%. Mas em 2014-15 vai aumentar para 79,5%. Haverá capacidade/plano para baixar bruscamente a folha salarial já em 2015-16? Dificilmente. A tendência da massa salarial no FC Porto tem sido para aumentar, e o clube não consegue gerar receitas que suportem esse aumento.
O que é que suporta isso? As transferências, as mais-valias. Mas os jogadores contratados são cada vez mais caros (a qualidade paga-se). E os salários cada vez mais altos. E as percentagens de passes são cada vez mais reduzidas. O modelo entra numa fase em que se combate a si próprio: o FC Porto tem que gerar e valorizar activos, mas adquirir e rentabilizar esses activos torna-se cada vez mais caro. Para 2014-15, temos aquilo que todos, todos os adeptos pediam: um grande plantel. Mesmo assim, ainda há quem não esteja satisfeito. O orçamento para 2014-15 revela o preço de ter esse grande plantel. Um grande desafio desportivo e financeiro, diria que o mais importante da história da SAD.
Para completar a questão da subida da massa salarial em 22 milhões de euros. De 2013 para 2014...
1) Foram criados 7 postos de trabalho no Museu;
2) O FC Porto passou a ter mais 6 contratos profissionais com atletas, 58 no total (a subida na massa salarial desde 2012 deve-se em grande parte à equipa B, onde muitos jogadores ganham salários ao nível da equipa A - tema para depois).
3) Os órgãos sociais passaram a ser compostos por oito elementos, um novo.
4) Continua a haver 33 vendedores nas lojas e 31 técnicos desportivos.
5) E o maior aumento: os cargos administrativos passaram de 120 para 159.
É este o orçamento para 2014-15, que se perpectiva que seja aprovado por larga maioria na AG. Como este não podem declarar inconstitucional, resta aos portistas comentarem de sua justiça.
PS: Em 2013-14, houve um défice operacional de 22,5M€. Não se ouviu um pio. Agora, em 2014-15, há um défice operacional de 25M€ previsto, então já se fala em all-in mesmo que o orçamento exclua todas as transacções com passes de jogadores. Portanto, são 2,5M€ que separam uma época onde ninguém se lembrou de questionar o orçamento de outra em que surge o alarido por all-in? Bom saber.