segunda-feira, 31 de outubro de 2016

E isto, é da nossa conta?

Ficámos recentemente a saber, através do presidente Pinto da Costa, que o Benfica ganhar um campeonato à conta das arbitragens, não só pelas decisões dentro de campo como pelas ofertas que violam os regulamentos fora dele, é algo que não diz respeito ao FC Porto - mesmo que seja o FC Porto o lesado nesta história.


Assim sendo, é caso para perguntar. O que se passou no Bonfim, já diz respeito ao FC Porto? Passámos de uma situação em que o FC Porto podia terminar o clássico na liderança da Liga para uma situação em que o Benfica pode sair do Dragão com 8 pontos de avanço. O Benfica nunca, nunca teve 5 pontos de avanço sobre o FC Porto à 9ª jornada. É a primeira vez, e com uma quantidade anormal de lesões no plantel. 

Podemos resumir tudo isto ao penalty não assinalado? Não. Mas é um facto que o FC Porto foi lesado nesse jogo por essa decisão. O problema é que o FC Porto já entrou naquele ciclo vicioso anteriormente aqui comentado: sempre que houver 2 ou 3 vitórias consecutivas, vai haver muita confiança, vão chover elogios ao treinador, dizer que afinal o plantel tem valor suficiente e que os críticos têm é que estar calados; ao primeiro deslize, volta a cair tudo em cima do treinador, porque não presta, porque não é Porto, porque é uma vergonha o jogador A, B e C jogarem nesta equipa. Já não vamos sair deste ciclo vicioso. Vai estar tudo, tudo dependente dos resultados. Mesmo que não consigam compreender que a diferença entre um bom e um mau resultado pode ser um ressalto, uma defesa, uma bola no ferro, um penalty - a exibição é exatamente a mesma!

O FC Porto tinha 27 vitórias consecutivas sobre o V. Setúbal e ganhou todos os jogos no Bonfim desde 1998. Até sábado. Tudo por causa do penalty? Não, certamente não. O problema não é apenas o que aconteceu ao minuto 84, mas também o que aconteceu até ao minuto 84. A equipa construiu as suas oportunidades, podia perfeitamente ter ganho o jogo. Não foi aquele jogo estéril onde o FC Porto não dava ares de ser capaz de ganhar a um V. Setúbal que só pretendia defender. Mas foi novamente um jogo em que o FC Porto demonstrou pouquíssima clarividência, e poucos sinais da mesma a partir do banco. 

Fomos prejudicados? Sim. Tivemos ocasiões para ganhar? Sim. Jogámos ao nível exigido nesta fase? Não. O FC Porto tem alguma coisa a ver com a obra de João Pinheiro em Setúbal? Não sabemos. Que o diga o presidente Pinto da Costa, ou então alguém do FC Porto que faça algo mais do que aquilo que qualquer adepto pode fazer: sacar um frame, ir ao paint, fazer uma bolinha e meter no Facebook. É essa a resposta do FC Porto? Fazer aquilo que qualquer adepto pode fazer? Terminemos, que isso também não deve ser da nossa conta. 





Danilo Pereira (+) - É incansável em campo e os elogios à sua postura também. Ganhou metros no terreno e deixou claramente a impressão que poderia ir mais além, mas tinha instruções para não subir em demasia, pois era o único a segurar o meio-campo. E com a saída de Herrera (era o jogador com mais cortes, recuperações de bola e desarmes em campo até ao momento da sua substituição, mas lá está, estava a fazer um excelente trabalho defensivo, mas a colaborar pouco no ataque - por outro lado, quem tem Óliver, Jota, André Silva e Otávio à frente, devia reunir criatividade e versatilidade suficiente para fazer estragos), Danilo ficou ainda mais desapoiado. Cumpriu novamente e vem sendo o melhor jogador do FC Porto nas últimas semanas.


Felipe (+) - Sabemos que algo correu mal quando destacamos um central contra uma equipa defensiva como o V. Setúbal. Com Marcano desta vez numa noite má (cometeu imensos erros na saída de bola), Felipe limpou tudo à entrada da grande área, foi forte no jogo aéreo e ainda foi ao ataque tentar o golo. Exibição segura, limpa e bem conseguida. Os elogios à sua exibição acabam por ser uma crítica à equipa: o V. Setúbal pouco fez no ataque, mas ainda assim os dois jogadores que mais se destacaram foram de caraterísticas defensivas. Nota ainda para Layún, novamente o principal municiador do ataque e o jogador que mais lances de perigo criou. 





Desacerto (-) - O FC Porto rematou, rematou muito. Mas rematou quase sempre mal. Em mais de 20 remates do FC Porto, só 3 foram à baliza. Nesses 3 Bruno Varela brilhou, mas nem sequer podemos dizer que o guarda-redes do V. Setúbal fez uma super exibição, pois a verdade é que a esmagadora maioria dos remates do FC Porto saíam todos por cima ou ao lado. Em toda a segunda parte, pior ainda: Bruno Varela só fez uma defesa. Uma. Em 45 minutos em que o FC Porto jogou no meio-campo do adversário. Pouquíssimo.

Pinheirinho (-) - Façamos contas. O FC Porto entrou, ao longo da partida, 55 vezes na grande área do V. Setúbal. 55! Fez mais de 30 cruzamentos. André Silva e Diogo Jota não estavam a conseguir ganhar bolas de cabeça. Então, para que serve um ponta-de-lança de 1,91m, que só por acaso é o 2º ponta-de-lança mais caro da história do FC Porto? Pois é. Pinto da Costa chutou de pronto a responsabilidade da contratação de Depoitre para Nuno, mas alguém já percebeu que deu asneira. E essa conclusão é tirada da pior forma possível: não pelo que Depoitre faz em campo, mas por nem sequer lhe darem a hipótese de entrar num jogo em que as suas caraterísticas fariam sentido. Nos últimos 7 jogos, Depoitre só teve direito a jogar 25 minutos contra o Gafanha. Foi para isso que o sr. D'Onofrio andou em viagens-relâmpago, de rastos, a suar e a fazer a Madre Teresa de Calcutá corar de inveja?

A euforia (-) - Muitos leitores perguntaram por que é que O Tribunal do Dragão não fez comentários sobre o célebre quadro de Nuno Espírito Santo. Simples, pois aquilo foi um fait-divers, uma mão cheia de nada, uma teoria oca para entreter, um exercício de banalidade. De que falava Nuno Espírito Santo? De compromisso, de cooperação, de comunicação, de união, de determinação, de atitude. Ora, estas 6 caraterísticas não descrevem um jogador à Porto: o que descrevem é toda e qualquer equipa de futebol que se preze! Conhecem uma equipa de sucesso que não tenha tido compromisso? Onde não tenha havido união? Onde não tenha havido atitude? Não há compromisso sem determinação e atitude; não há união sem cooperação. Isto é uma teoria para um livro do Luís Campos, não para discurso direto de um treinador do FC Porto! Se Nuno tivesse feito aquela apresentação depois de uma derrota, os mesmos que lhe acharam graça provavelmente ridicularizariam a sua apresentação. Quando precisamos de quadros para explicar teorias, quando o maior problema é a prática... Mas há quem tenha visto nisto uma «aula». Aula? Se querem aulas, o melhor seria mesmo técnico-táticas.

A segunda parte vai de encontro a algo já aqui muitas vezes comentado: os portistas, sendo os adeptos mais exigentes do mundo, também se tornaram uma massa que se empolga com muito pouco. Aquele tal ciclo vicioso. Precisamos de ser otimistas, precisamos de estar motivados, mas a forma como se passaram a valorizar vitórias que outrora seriam vistas como normais ou banais é preocupante. Nuno falou em «euforia dos adeptos». Euforia? Euforia? Não, a sério, euforia!? O FC Porto ganhou categoricamente na Choupana, ao Nacional, por 4x0. Bom jogo. Ganhou contra o Gafanha, como seria de esperar em qualquer dia que ganhasse. Ganhou em Brugge com um penalty em cima do final, caso contrário já teria os oitavos da Champions hipotecados. E ganhou em casa ao Arouca, algo que também deveria ser encarado como normal. Nuno descobriu euforia nos adeptos depois destes resultados? Ou o treinador lê mal as coisas, ou foram de facto os adeptos do FC Porto que se habituaram a muito pouco.

quinta-feira, 27 de outubro de 2016

O orçamento do FC Porto 2016/17

O teor do último post terá sido mal interpretado por alguns leitores. O Tribunal do Dragão não pretende mudar o seu registo na bluegosfera: o exemplo do post de ontem, no caso com André Silva como figura, é apenas um exemplo de possível complementaridade aos conteúdos do blogue. Se há uma coisa em que este espaço aposta desde o início é numa diversidade de conteúdos (sempre tendo o futebol como denominador comum), e o exemplo de ontem era apenas mais um passo nesse sentido.

Disto isto, vamos ao orçamento para 2016-17. Os números podem ser comparados ora com base naquilo que era o orçamento há um ano, ora com base nos resultados do final da época 2015-16. Vamos tomar os dois últimos orçamentos como referência - comparar plano com plano, em vez de comparar resultado com plano, embora as duas coisas possam perfeitamente ser feitas.

Orçamento proposto para 2016-17
Há um ano, a SAD apontava para proveitos operacionais de 85,44M€. Agora, apontam para 98,415M€. É uma previsão animadora, pois a SAD consegue orçamentar receitas fixas quase nos 100M€. É claro que entre a previsão e a execução há um passo a dar (em 2015-16, a SAD ficou cerca de 10M€ abaixo da meta), mas o caminho para a sustentabilidade começa aqui: aumentar as receitas operacionais para reduzir a necessidade de venda de jogadores.

É claro que há uma receita que não é fixa: a Liga dos Campeões. Por norma, temos 3 equipas a jogar para 2 vagas. A presença na Liga dos Campeões não pode ser dada como uma meta garantida ano após ano. As receitas na UEFA não deveriam ser encaradas como essenciais para a sustentabilidade, mas sim como o extra que permita dar algum conforto à gestão da SAD.

No entanto, aparentemente bastará garantir os 1/8 desta edição da Liga dos Campeões. A SAD orça 30M€ de receitas na UEFA. Estão já garantidos 12M€ (+2M€ pelo playoff), 2M€ na fase de grupos (no cenário mais otimista, podem ser conseguidos mais 4,5M€ com três vitórias), e o apuramento para os 1/8 vale 5,5M€. Se a equipa conseguir essa meta, mais as receitas de market-pool, os 30M€ estarão quase conseguidos, o que reduz a pressão (não desportiva, mas financeira) de ter que assegurar o apuramento para a Champions 2017-18 (os 12M€ do apuramento não são incluídos neste orçamento, portanto). 

A SAD propõe-se a ultrapassar pela primeira vez os 15M€ em receitas de publicidade e as receitas de TV sobem 5M€ na previsão (não esquecendo que as receitas da PT/Altice já começaram a ser usadas na gestão de 2015-16). O aumento destas duas rúbricas é fundamental.

Quanto aos custos, não há redução por parte da SAD. Pelo contrário, a SAD prevê gastar mais em salários do que previa há um ano, com os custos salariais a terem uma estimativa de 69,5M€. Mas o pior está novamente nos Fornecimentos e Serviços Externos: uma subida de 5,6M€, para uns incomportáveis 38,5M€. Isto resulta em custos de 116,5M€

São portanto os custos operacionais mais altos da história da SAD, superando os que estavam previstos em 2014-15 (114,2M€). É também o terceiro orçamento suicida apresentado consecutivamente. No primeiro ano, a boa Champions, a valorização em massa do plantel e as vendas de jogadores como Jackson, Danilo e Mangala permitiram à SAD cumprir um orçamento de elevado risco. No segundo ano, o desastre anunciava-se e terminou com o maior prejuízo da história do futebol português. Agora, a SAD não só volta a arriscar como eleva ainda mais o risco. 

Ainda assim, como dado positivo nota-se a previsão de uma redução do défice operacional: de 22,3M€ para 18,1M€. Em 2014-15 o défice era de 25M€, por isso tem havido uma ligeira descida. Mas ainda insuficiente, sobretudo tendo em conta a extrema necessidade que continua a existir da venda de jogadores.

Vamos então ao problema... semântico. No orçamento de 2015-16, a SAD informou apenas de que precisava de um resultado com transações de passes de 72,59M€. Este ano expôs a informação de maneira diferente: necessita de proveitos de 115,781M€ e terá custos de 47,201M€. No final, aponta-se para um resultado operacional novamente na casa dos 18M€, para fazer face a juros que estão na casa dos 16M€ anuais.

Orçamento aprovado para a última época
A imprensa anunciou em massa a necessidade de fazer proveitos de 115,781M€ com jogadores. Nasceu logo a questão: são proveitos? São mais-valias? São vendas brutas? A verdade é que a SAD apresentou um cruzamento entre proveitos e custos, enquanto há um ano especificou apenas o resultado. Ou seja, podemos estar a falar de uma necessidade de um resultado com transações de passes de 68,58M€, uma redução de 5,5% face ao ano anterior. Um decréscimo muito reduzido, sobretudo se não der sinais de ser progressivo. 

O resultado com transações de passes de jogadores foi de apenas 7,1M€ na época passada, e na época anterior (na qual o FC Porto bateu o recorde de vendas) tinha sido de 51,12M€. Ou seja, o resultado esperado para esta época tem que ser maior do que o das duas últimas épocas juntas. Mas estamos a falar de resultado de transações, não de mais-valias. No que toca a mais-valias, na última época foram de 40,22M€, e em 2014-15 tinham sido de 86,4M€. Como nos orçamentos propostos pela SAD o termo mais-valias não é utilizado, temos que nos guiar pelo resultado da transação de passes. Por outras palavras, no final da época é bom que Jorge Mendes se prepare, pois é possível que tenha muito trabalhinho... E é bom que os corações dos portistas também estejam preparados, pois a ideia anunciada de manter os melhores jogadores durante mais anos não combina em nada com este orçamento. 

O resultado negativo de 2015-16 transita para este exercício, tal como o resultado de 2013-14 transitou para a época 2014-15. Nada de novo neste assunto. 

Quanto à última proposta da ordem de trabalhos, a entrada Eduardo de Vítor Rodrigues na SAD... Não aparenta ter grande lógica. Saiu Antero Henrique, administrador e número 2 (ou não, esse é o Maxi Pereira) da SAD, e o Conselho de Administração propõe para o seu lugar... um administrador não executivo. Portanto, tecnicamente Antero Henrique não é substituído no cargo de administrador executivo da SAD. Há várias formas de questionar isto, sendo uma delas: se não é necessário ninguém para substituir Antero Henrique nas funções executivas, então o que estava ele a fazer na SAD? Ou então, que polivalência é essa do restante Conselho de Administração que dispensa uma sucessão executiva?

É uma escolha de Pinto da Costa, que disse que não gostava de misturar política com futebol, mas o passado recente na composição do Conselho de Administração diz o contrário. Tirando o presidente, o CA passa a ter 3 administradores executivos e três não executivos. Até 2015 havia apenas, além do presidente, três executivos e um não executivo. Curiosidade para perceber em que medida a adição de dois administradores não executivos ao quadro da SAD vai ter influência.

Certamente que todos estarão na expetativa de ver os conhecimentos que Eduardo de Vítor Rodrigues tem de sociologia (área na qual fez todo o percurso académico) serem aplicados ao FC Porto. Era para isso que Auguste Comte, Montesquieu e Marx se levantavam de manhã: para que chegasse o dia em que a sociologia e o futebol se sentassem à mesa. O futuro dirá se um dia veremos o futuro administrador não executivo entregar um Dragão de Ouro a Marco António Costa. Mas é sem dúvida algo que se encaixa na realidade atual: sermos uns porreiros e uns amigalhões de quem um nos quis mal. O FC Porto perdeu o campeonato de 2014-15 por causa das arbitragens; os árbitros receberam ofertas ilícitas por parte do Benfica; mas o FC Porto não tem absolutamente nada a dizer sobre o kit Eusébio, e isso é reafirmado uma, duas, três vezes. O «Make love, not war» afinal não era uma ferramenta de combate à Guerra no Vietname, mas sim uma filosofia para o FC Porto atual. 

O presente orçamento e demais propostas do Conselho de Administração vão a votos a 17 de Novembro, em AG de acionistas, e será com certeza aprovado por larga maioria. Por norma, seriam manifestados desejos de cumprir este orçamento... para nunca mais ter que o repetir. Mas isso seria muito 2014. Ou muito 2015. 

Siga para o campo, pois vem aí um ciclo de jogos de máxima dificuldade e importância, nos quais o FC Porto vai jogar pelo 1º lugar e pelos 1/8 da Champions num curto espaço de tempo. Estar em crise mas ter oportunidade de estar na luta por todos os objetivos da época é uma crise que muitos desejariam ter. Há condições para inverter o rumo. Pelo menos dentro de campo. 

quarta-feira, 26 de outubro de 2016

Dez coisas sobre André Silva


- Entre os 18 maiores campeonatos da Europa, nenhum outro jogador de idade inferior a 21 anos (André vai festejá-los a 6/11) tem mais golos do que André Silva.

- Desde o bis no Jamor, André Silva fez 21 golos em 24 jogos, contando com a pré-temporada. 

- Sempre que André Silva marcou na Liga, o FC Porto ganhou (21 pontos em 21 possíveis).

- O penalty que André Silva marcou em Brugge permitiu ao FC Porto ganhar 1 milhão de euros... Ou seja, mil vezes mais do que o valor que o FC Porto pagou ao Salgueiros pela sua contratação (taxa de compensação de mil euros).

- Há 20 anos que um avançado português não fazia 7 golos em 8 jornadas pelo FC Porto. O último tinha sido Domingos Paciência.

- Na luta pela Bota de Ouro, tirando os campeonatos de coeficiente reduzido, só dois avançados têm mais golos do que André Silva (Dzeko e Modeste).

- André Silva foi o único jogador do FC Porto no espaço de 88 anos a fazer um hat-trick por Portugal.

- André Silva tem um golo a cada 138 minutos pela equipa principal na Liga. Média superior à de Hulk, Lisandro, Domingos, Postiga, Derlei...

- André Silva é o 3º jogador que mais corre no FC Porto nas competições europeias, atrás de Layún e Óliver.

- André Silva teve intervenção direta em 44% dos golos do FC Porto na Liga e nenhum outro jogador participou (com remate ou último passe) em mais golos. 

PS: Se apreciarem este tipo de posts, com menos análise/opinião e com uma compilação de curiosidades ou estatísticas (retiradas de sites como Goalpoint, UEFA, WTV, Opta, Zerozero, etc.), o Tribunal do Dragão passará a fazê-los com alguma frequência. 

domingo, 23 de outubro de 2016

Artistas em dupla e a solo

Contra uma das equipas mais irritantes deste campeonato, alérgica a tudo o que não seja jogar com linhas recuadas, 10 jogadores atrás da linha da bola e só sair do seu meio-campo em pontapé longo, o FC Porto passou sem problemas um teste contra um adversário que ganhou no Dragão no ano passado, no mesmo dia em que o Tondela foi tirar pontos a Alvalade. São estes pontinhos que podem fazer muita diferença nas contas finais. 

Desta vez sem Otávio, voltou a estar em evidência outro bromance no FC Porto: Jota e André Silva, um a construir e outro a matar, numa exibição positiva a todos os níveis, direta ao pódio das melhores da temporada. Agora vem aí o mais difícil: não a visita ao Bonfim, onde o FC Porto ganhou todos os jogos que lá disputou desde 1998, mas as receções a Brugge e Benfica. Uma coisa de cada vez.





Saber ter a bola (+) - Contra uma equipa que não procura ter bola, o melhor a fazer é... tê-la. O FC Porto entrou pressionante, a obrigar o Arouca a desfazer-se da bola na primeira linha e com bastante equilíbrio a meio-campo: Herrera mais adiantado (quanto mais perto estiver de Danilo, pior), Óliver constantemente a procurar a bola no espaço e Danilo Pereira, uma vez mais, a segurar o meio-campo pelo pescoço. Com Jota a baixar, Corona a sair para zonas interiores e André Silva a arrastar marcações, o FC Porto termina a primeira parte com 78% de posse de bola e, mais importante, não se limitou a trocá-la - apostou em circulá-la tendo a baliza como destino. Na segunda parte o FC Porto voltou a sofrer uma quebra, ao entregar a iniciativa de jogo ao Arouca e deixar o adversário ter bola, mas sem que isso significasse lances de perigo para o adversário. Casillas só teve que se preocupar em não morrer de frio.

Um liberta o outro
Jota & André (+) - Por muito que André Silva tenha a disponibilidade de cair nos flancos, progredir com bola e tentar arriscar no 1x1, nada será melhor do que ter o nosso Ás de trunfo no seu habitat na natural: no coração da grande área, prontinho para dar o último toque. No primeiro golo, não cometeu o erro de se precipitar no remate: atirou para o lado oposto do defesa e marcou com tranquilidade. No segundo, colocou-se no sítio certo, ao fugir para as costas do defesa do Arouca e ganhar o lance de cabeça. Oportunista, entre os principais campeonatos da UEFA só um jogador tem mais golos do que André Silva (Modeste, do Colónia). Se quiserem contar com a pré-época e jogos de seleções, são 21 golos em 24 jogos. 

Há a destacar a forma como Diogo Jota soube descobrir André Silva nos dois lances: o primeiro com alguma felicidade, mas no segundo a colocar a bola na perfeição. Jogo muito inteligente de Jota, que teve que se dividir entre municiador de André Silva e homem que recuava para Herrera aparecer na grande área. Além de conferir verticalidade, dinâmica e maior capacidade de largura ao ataque do FC Porto, dispensa que seja André Silva a ter que fazer essa função. Resultado: em dois lances em que era preciso o avançado cair na ala (que era o que André Silva fazia até há bem pouco tempo), foi Jota a fazê-lo... e André Silva assim pôde ficar na área, pronto a faturar.


A revolta de Brahimi (+/-) - O que têm em comum Quaresma, Hulk ou Brahimi? Deliciaram os adeptos com grandes golos, grandes jogadas. E levaram muita gente ao desespero por quererem fazer tudo sozinhos, por se agarrarem em demasia à bola. Um dia aplaudidos, no outro assobiados. Um dia, tanto Quaresma como Hulk perderam a cabeça e, a quente, ripostaram contra a bancada, com gestos que não são bonitos. Ontem foi a vez de Brahimi fazê-lo.

Entrou e lançou a jogada do 2x0. Depois tentou o lance individual, uma, duas vezes. Abusou, e para isso há um treinador para repreendê-lo no banco e mandá-lo soltar a bola. O que não era necessário era, uma vez mais, um jogador do FC Porto ser assobiado na própria casa quando a equipa está a vencer. Aqueles 90 minutos deveriam ser sagrados, de rumo único. Não estamos a falar de gestão desportiva, da política da SAD, de comissões ou de qualquer outro assunto debatível fora do relvado: estamos a falar de um jogo, de 90 minutos, da equipa. No final do jogo, podemos tomar as considerações que quisermos, fazermos as mais diversas análises técnico-táticas, criticar os jogadores que quiserem. Mas isso não deveria acontecer durante 90 minutos.

A hipocrisia de um assobio
Brahimi marcou aquele incrível golo pela mesma razão que foi assobiado minutos antes: por ser Brahimi, por ser individualista, por ter pensado o mesmo que Maradona ou Messi pensaram um dia: «Esta só acaba na baliza». Foi um brilhante golo, genial, e depois Brahimi pisou os limites nos festejos. E com razão: os mesmos que o assobiaram por ter tentado o lance individual estavam a aplaudir por Brahimi ter concluído... um lance individual. Hipócrita, no mínimo. Brahimi está a viver uma situação difícil no FC Porto - estava convencido (e não apenas ele) que ia sair, acabou por ficar sem ter lugar garantido no 11, e ainda encontra adeptos que em vez de tentarem colaborar na reabilitação do jogador o assobiam quando a equipa está a ganhar.  Assobiar um jogador capaz de fazer golos assim não rima com proveito. Até porque não há assim tantos. 

Outros destaques (+) - Mais uma exibição imaculada de Marcano, também com Felipe uns furos acima dos últimos jogos. Layún ganhou definitivamente o lugar do lado direito, embora neste flanco não possa ser tão influente nos movimentos interiores (ainda assim, lançou o lance do 1x0). Danilo Pereira está também a atravessar um grande momento, próprio de quem parece ter sido uma combinação dos genes de Costinha, Paulo Assunção e Fernando. Nuno, desta vez, bem a mexer na equipa: a equipa ressentiu-se da saída de Óliver durante algum tempo, mas Rúben Neves acabou por dar serenidade ao meio-campo e Brahimi entrou para participar em 2 golos.





O factor Telles (+/-) - O FC Porto fez 15 cruzamentos na primeira parte. Nove deles foram de Alex Telles. Não fez um mau jogo, mas há várias coisas que têm que ser limadas neste processo. Se Alex Telles cruza tanto, tem que cruzar melhor. Têm sido poucos os cruzamentos realmente proveitosos do seu pé esquerdo. Está a ter a capacidade de aparecer muitas vezes em zona avançada, mas os lances acabam invariavelmente com um cruzamento. É Telles que só cruza ou são essas as instruções que recebe?

Era sabido que Nuno quer os laterais a dar largura. Logo, isso explica que Alex Telles não faça movimentos interiores quando tem oportunidade. Até porque se há Otávio ou Corona naquela zona, Telles tem que dar o espaço interior. Mas é preciso alguma flexibilidade: se Alex Telles tem mais possibilidades de criar perigo cortando para dentro do que cruzando, então deve fazê-lo. Estar invariavelmente a meter bolas na grande área, quando só temos André Silva para jogar de cabeça, não tem muito proveito. A rever. 

15 minutos à Corona (+/-) - Corona entrou com tudo e logo nos minutos iniciais esteve perto de fazer um grande golo. Depois do quarto hora, quiçá até por alguma limitação física, desapareceu. Corona teve bola, conseguia passar pelos adversários, mas depois faltou sempre algo: não aparecia o passe, não aparecia o remate, não se enquadrava com a baliza. Em compensação, depois entra Brahimi com tudo. Corona e Brahimi têm alternado boas entradas a partir do banco com titularidades de subrendimento. Quando - ou se - os 15 minutos se multiplicarem, o FC Porto pode encarar o médio prazo com maior otimismo, não esquecendo que no final do ano Brahimi deve ir à CAN, e Varela ontem jogou os primeiros 11 minutos em 2 meses (e aparentava já haver adeptos fartos dele, embora não jogasse desde agosto). Por isso, arrebita, Tecatito, que bem precisamos.

quinta-feira, 20 de outubro de 2016

Formação, Manel e desculpas

Começando por não uma, não duas, mas três excelentes notícias. A renovação dos contratos de dois membros da nossa excelente geração de Diogos e de Afonso Sousa, neto de um campeão de Viena. Diogo Dalot é o protótipo de lateral-direito moderno. Não há memória do FC Porto ter, na sua formação, um lateral da sua idade e qualidade. Não é por acaso que aos 16 anos já tinha sido chamado aos treinos da equipa A por Lopetegui (tal como por exemplo Paulo Fonseca chamou Rúben Neves quando tinha 16). São chamadas que premeiam a qualidade e potencial de grandes promessas, muito diferente de por exemplo ver Musa treinar com a equipa A do FC Porto esta época (não jogou ainda nem um minuto na B). Quanto mais cedo Dalot começar a jogar num patamar acima, melhor. 

Uma boa aposta
Diogo Queirós, capitão campeão europeu de sub-17, é candidato a reeditar a escola de grandes defesas centrais do FC Porto. Forma boa dupla com o homónimo Leite, já tem uma estampa física considerável para a sua idade, lê bem o jogo e já tem sido um dos destaques da Youth League. Outro jogador que só tem a ganhar em subir de patamar mais cedo (a equipa B tem dado sucessivas oportunidades a centrais estrangeiros, sem grande sucesso - no curto prazo, é tempo de privilegiar a formação neste setor).

Sobra então Afonso Sousa. É mais novo, tem bons genes futebolísticos, jogador de recorte técnico e que joga com grande envolvência coletiva (um exemplo, vejam este golo marcado por Afonso ao Tondela, que também mostra como é que se abatem autocarros). Vai ter que ganhar dimensão física (ainda só tem 16 anos), essencial para a sua afirmação (há o exemplo de Vítor Andrade, um dos maiores talentos do FC Porto durante a formação, mas a quem faltou essa dimensão na transição para sénior - não é ainda um caso perdido, fica a nota). 

Assinaladas estas três boas notícias, falemos de um rapaz já muitas vezes mencionado neste espaço. Chama-se Rui Pedro, tem 18 anos e é o melhor marcador da UEFA Youth League. É há muito visto como um potencial avançado de futuro no FC Porto, tendo inclusive sido destacado para o Projeto Jogador de Elite. Pep Lijnders, na avaliação que fez dele, comparou-o desta forma com Gonçalo Paciência: «O Rui Pedro não faz o impossível, como Gonçalo, mas é melhor no domínio do possível».

Um pequeno Falcao
Por outras palavras, Rui Pedro talvez não tenha, ainda, a capacidade de inventar um golo com uma grande finta, uma rabona, um túnel ao adversário ou um slalom que só acaba na baliza. Mas tem aquela ratice que nos leva a descrever os avançados que estão sempre no sítio certo, que marcam em meia oportunidade, que se antecipam e movimentam na perfeição, que pressiona e está sempre a mexer-se no ataque. Há quem lhe veja coisas de Falcao, mas todos sabemos o quão perigosas são essas comparações.

Rui Pedro, para quem não se recorda, começou a época a jogar na equipa B. Uma aposta que fazia todo o sentido - os nossos melhores jovens têm que jogar em escalões acima. Mas depois do fim de agosto, Rui Pedro deixou de jogar na equipa B. Porquê? Chegou Areias, emprestado pelo V. Guimarães. O FC Porto nunca se pronunciou sobre o absurdo que seria enquadrar uma cláusula de compra de mais de 500 mil euros sobre este jogador, por isso vamos pular esta consideração. Meramente hipotética, claro. 

O FC Porto passou a apostar em Areias como ponta-de-lança da equipa B. É titular há 6 jornadas e marcou um golo. Rui Pedro voltou aos juniores. Logo, atrasam o desenvolvimento de Rui Pedro para estar a utilizar um jogador emprestado pelo V. Guimarães que, perdão, não justifica que o FC Porto secunde a aposta em Rui Pedro para estar a valorizar um jogador em nada superior a, por exemplo, Tomané. Com a pequena diferença de que Tomané ainda conseguiu ser titular em Guimarães, fez alguns golos, enquanto Areias não contou para a equipa A do Vitória... onde joga Marega.

Na última época fez 9 golos na equipa B, na anterior tinha feito 14. Justifica-se a aposta? Não. Qualquer avançado, jogando com regularidade no FC Porto B, marca uma dúzia de golos sem grandes problemas. Quem não se lembra de Dellatorre? Avançado brasileiro de qualidade sofrível, mas que conseguiu ser titular toda a época na equipa B, levando até a que muitos considerassem que valia a pena avançar para a compra do seu passe. O futuro, como sempre, foi bem esclarecedor. Mas rezam as crónicas que Dellatorre está a deslumbrar na Liga Tailandesa. 

Justifica-se?
Areias não é, à data de hoje e muito provavelmente de amanhã, uma solução que dê mais perspetivas de presente e futuro do que Rui Pedro. E pior ainda: Areias está emprestado pelo V. Guimarães! Nem sequer é um jogador do FC Porto! E já agora, quanto custaria mesmo ficar com Areias? Pois é. A gestão deste caso é tudo aquilo que o FC Porto não deve fazer na sua formação e equipa B.

Rui Pedro voltou aos sub-19 para estar num escalão que não oferece competitividade. Nos sub-19, já não vai aprender muito mais. À 10ª jornada, a equipa de juniores já leva 8 pontos de vantagem na liderança. Não vai haver estímulo competitivo até à fase final. Até lá, Rui Pedro podia estar a jogar na bem mais competitiva Segunda Liga, mas não, joga o avançado que não serviu para a equipa A do Guimarães. Isto não é ser simpático com Areias (na última vez que tivemos um Areias em campo, até ganhámos ao Chelsea de Mourinho), que de certeza quer lutar pelo seu espaço e ganhar o seu lugar, mas estamos a falar da gestão de ativos da formação do FC Porto. Areias nem sequer é jogador do FC Porto. E será uma surpresa se for no futuro. Podia ser o Areias, podia ter o Tomané. O problema é que Rui Pedro está a ser ultrapassado por quem não é melhor. 

E agora uma história. Era uma vez o Manel. O Manel tinha uma mercearia. Era um negócio rentável, bem sucedido. O Manel por vezes importava produtos caros, mas conseguia vendê-los a compradores que tinham mais dinheiro. Tudo corria bem ao Manel. Mas em 2014, o Manel viu-se perante um grande problema. A sua mercearia deu um prejuízo de 40,7 mil euros, o maior que alguma vez tinha dado. O Manel ficou em apuros, pois sabia que uma entidade que seguia as suas contas não ia admitir um prejuízo tão grande no ano seguinte. O problema nem era apenas o resultado líquido, mas sim o cruzamento entre passivo e ativo. 

O Manel fez o que nunca esperaram que fizesse. Hipotecou a sua casa. Isso iria permitir ao Manel que a sua mercearia ficasse com um ativo muito mais superior. O Manel deu por si a ter a sua mercearia com capitais próprios de 83,1 mil euros no final de 2015. Problema resolvido!, pensou. Em 2015, a mercearia do Manel até deu um lucro de cerca de 20 mil euros!

Mas passou-se mais um ano e o Manel viu a sua mercearia voltar a dar prejuízo. Foram 58,4 mil euros, o maior que alguma vez deu. E de repente, a hipoteca feita pelo Manel em 2014 começou a perder o seu efeito. Acontece que os 83,1 mil euros que tinha de capitais próprios em 2015 passaram, no espaço de um ano, a ser de apenas 25,8 mil euros. 

O Manel tem um prejuízo acumulado de quase 80 mil euros desde 2014 e conseguiu que os seus capitais próprios fossem reduzidos em quase 70% no espaço de um ano, tendo agora apenas 25,8 mil euros. Problema? Não. O Manel, otimista, está feliz, pois tem 25,8 mil euros. Fim da história. 

PS: Durante meses, O Tribunal do Dragão deu o seu contributo no caso dos vouchers, da Liga Aliança e em diversos temas a envolver léxicos como colinho, arbitragem e derivados do sistema. Hoje, é tempo de apresentar as devidas desculpas por se ter dado a todo esse trabalho. Tudo aquilo que contribuiu, diretamente ou indiretamente, fora de campo (ou dentro, ao ritmo do apito) para que o Benfica fosse tricampeão, não diz respeito ao FC Porto. Assim o afirmou o presidente, que diz que o caso dos vouchers, uma prática do Benfica que não tem defesa em nenhum regulamento, não diz respeito nem interessa ao FC Porto. Assim sendo, as desculpas por todo o tempo que os leitores d'O Tribunal do Dragão perderam a ler aqui sobre temas que não interessam ao FC Porto. Aqui fica uma informação mais útil e talvez mais importante: uma caixa de 48 pastilhas de Rennie tem um PVP de 4,95€. Coisas que importam. 

quarta-feira, 19 de outubro de 2016

A Champions é nossa amiga

Oh, se é! O FC Porto não se pode queixar de falta de sorte nesta edição da Liga dos Campeões. 4 expulsões desde o playoff, mais um penalty, mais um adversário francamente banal pela frente (ainda que jogar na Bélgica não seja historicamente fácil - quem não se lembra do terror que foi em tempos visitar o Anderlecht?) e, uma vez mais, se o FC Porto não conquistasse pontos seria por manifesta aselhice própria. Um penalty caído do céu salvou a noite, mas infelizmente mostrou que a grande exibição realizada frente ao Nacional já está em pergaminhos passados: não foi ponto de viragem, foi até ver a exceção. 

Não é que uma vitória tirada a ferros, em cima do apito final, não saiba bem. Sabe. Mas já tivemos amostras suficientes disso esta época. Como não vai dar para contar sempre com um penalty nos descontos, há muito mais para melhorar - essencialmente, o mesmo desde o início da época - do que para celebrar. 




Layún (+) - Mal defensivamente na primeira parte, absolutamente decisivo do meio-campo para a frente desde então. Galvanizou a equipa para a reviravolta, não só pelo bom golo que marcou, mas também pela forma como empurrou a equipa para a grande área adversária, onde entrou 9 vezes, além de ter recuperado 11 bolas. Foi também o jogador com maior acerto de remate (3/4). Tendo em conta que a nossa dupla de avançados rematou pela primeira vez nos últimos 15 minutos, isso diz tudo do papel que Layún desempenhou em terrenos mais adiantados.

Iván Marcano (+) - Impecável. Em 3 jogos de Champions, fez apenas duas faltas. Isso não faz dele um central macio, mas sim que sabe jogar limpo, é prático, joga simples e evitou por várias vezes males maiores para a baliza do FC Porto. Está a ser dos melhores do FC Porto desde o início da época, e não é por um défice de qualidade em seu redor: tem mesmo sido eficiente. Não bate com a mão no peito, não dá entrevistas, não escreve #somosporto todos os dias: Marcano limita-se a ser um bom profissional, empenhado e responsável. Que ousadia, Iván!


Danilo Pereira (+) - Ser o médio-defensivo do FC Porto é uma trabalheira. A Danilo Pereira, não lhe bastou as muitas bolas que recuperou (9) e os lances de corpo-a-corpo que disputou contra os mais corpulentos belgas (14). Com Óliver a correr muito (está no top10 com mais quilómetros na Champions), mas sem grande orientação, e Héctor Herrera a regressar ao 8 (não a posição, mas o seu limbo de exibições entre o 8 e o 800), foi Danilo a empurrar a equipa para a frente, procurando correr para terrenos que não deviam ser seus. Quase sempre bem no passe (89%), uma garantia de equilíbrio. 

Outros destaques (+) - As entradas de Brahimi e Corona foram absolutamente decisivas. Agitaram um jogo no qual Herrera e Diogo Jota não estiveram bem. O FC Porto ganhou velocidade, verticalidade, capacidade de rasgo nas e a partir das alas. Se jogassem sempre com a postura e empenho demonstrado ontem, Nuno dificilmente pensaria em abdicar do 4x3x3. Otávio voltou a estar em alguns dos principais lances de perigo do FC Porto (muito bem na desmarcação para Layún) e foi dos poucos a desequilibrar na primeira parte. Um par de boas intervenções de Casillas e nervos de aço de André Silva num momento de enormíssima pressão. Os penaltys não eram uma especialidade sua na formação, mas quem não treme num momento como aquele revela estofo para assumir essa responsabilidade. Claro que a conversa seria outra se o guarda-redes se tivesse lançado para a esquerda, mas um bom penalty é aquele que é rematado para o lado... de dentro. 




Outra vez, pequenos (-) - Não vale a pena repetir críticas a Nuno Espírito Santo. Tentou dar continuidade às coisas boas que o FC Porto fez na Choupana, mas nada foi igual. Vimos, essencialmente nos primeiros 60 minutos, uma equipa de posse de bola estéril, quase inofensiva no último terço, novamente com mentalidade de equipa pequena. O meio-campo foi um poço sem ideias. O FC Porto teve a felicidade de marcar um golo em contra-ataque e um de penalty, mas são circunstâncias e resultados que só podem maquilhar o resto.

O FC Porto dificilmente sairá deste limbo: quando a equipa ganhar, os adeptos, portistas de coração e com boa vontade face ao presente e futuro do FC Porto, vão tentar enaltecer as coisas boas, mesmo que elas não existam; vão repetir «assim sim!», que a equipa está a crescer, que afinal há qualidade e que há raça e crer na equipa; quando o mau resultado voltar a aparecer, recuperam as críticas antigas, tendo sempre Nuno Espírito Santo como alvo principal, por, pasme-se, estar a jogar exatamente da mesma forma que sempre jogou na sua carreira de treinador. Ninguém pode dar mais do que tem, mas confirma-se que é muito mais fácil revelar ambição como guarda-redes suplente do que como treinador principal.

Agora o Arouca, equipa mandada para fora da Taça pelo Real Massamá, que ganhou apenas um jogo esta época e joga à imagem do seu treinador: equipa atrás da linha da bola, borradinha, com esperanças de que o placar não chegue a mexer. Por outras palavras, tem tudo para nos moer o juízo.

segunda-feira, 17 de outubro de 2016

Feito, próximo

A Taça de Portugal é como o Martelinho: pode ser uma faca de dois legumes, muito em função do resultado. Nuno Espírito Santo optou por colocar a base dos melhores jogadores em campo, preferindo não correr muitos riscos (se é que era possível correr grandes riscos contra o Gafanha, em campo neutro, jogasse sem jogasse).

Não é propriamente incomum os treinadores do FC Porto usarem uma base mais consolidada de jogadores no primeiro jogo de Taça, ao invés de mudar meia equipa. Até Villas-Boas não prescindiu de Hulk contra o Limianos. Nuno fez a sua escolha, a equipa passou o jogo-treino sem dificuldades e a única interrogação em torno das suas escolhas é o que se dirá a jogadores como Sérgio Oliveira, João Carlos Teixeira ou Varela: se não servem para jogar contra o Gafanha, a que momento da época é que poderão mostrar utilidade à equipa dentro de campo?

Nuno também optou por dar continuidade ao 4x4x2 que tão bem funcionou contra o Nacional, ainda que dificilmente seja contra o Gafanha que uma equipa consolida ou deixa de consolidar o modelo e dinâmicas de jogo. O jogo contra o Club Brugge, amanhã, já será um teste bem mais difícil, no país onde todos aprendemos a detestar o Anderlecht. Aí sim, já será possível tirar sinais mais conclusivos, até porque em caso de um mau resultado (um empate dificilmente saberá bem) o apuramento para os 1/8 pode complicar-se. Bem mais do que ganhar ao Gafanha, pelo menos.




Iván Marcano (+) - Desta vez com Boly ao lado, voltou a fazer uma exibição irrepreensível e sai deste jogo como um dos melhores do FC Porto. Dizer que o nosso central foi o melhor contra o Gafanha, num jogo de Taça, não quer dizer que o adversário atacou muito, mas sim que Marcano soube ser prático e ajudar a equipa nos processos ofensivos: passou rapidamente no início de construção, controlou sempre o espaço em profundidade, deu indicações a Boly (bom ver Marcano assumir-se e ter voz na defesa), fez a assistência para o 2x0 e foi mais rápido e agressivo na recuperação. Contra o Gafanha, um bom ou um não tão bom Marcano podem não fazer diferença, mas contra o Club Brugge acreditem que fará.

Otávio (+) - Dá ao FC Porto o que tem faltado: rasgo individual. Aquele jogador que, qual Madjer, Deco ou Hulk, pega na bola, assume o lance individual, com objetividade, encontra um atalho para a baliza e faz golo. Brahimi pode fazer isso, Corona pode fazer isso, mas não o estão a fazer. Esse papel está a ser um exclusivo de Otávio esta época. Um belo golo e uma vez mais a destacar-se na forma como consegue distribuir jogo e crescer a partir do lado esquerdo. Os lances de perigo nasciam sempre dos seus pés.


A entrada de Corona (+) - Esteve com problemas físicos, teve 25 minutos para mostrar serviço, faz um golo e uma assistência. Objetivamente, não dá para pedir mais. Oportuno no 2x0, atento à movimentação de Depoitre no 3x0, volta a mostrar mais nos minutos em que é suplente utilizado do que nos jogos em que é titular. Nota para um bom regresso de Maxi Pereira à equipa. 




A rever (-) - Muitas vezes, jogar na Taça é uma missão ingrata para jogadores pouco utilizados. Admita-se isso. Se um jogar faz o primeiro jogo pelo FC Porto, por mais frágil que seja o adversário, se não revelar já bom entendimento com os colegas as coisas podem correr mal. Herrera não teve essa desculpa. Do meio-campo para a frente, Nuno Espírito Santo não mexeu, mas Héctor pareceu muitas vezes um corpo estranho à equipa. Muita hesitação na progressão e a soltar a bola, sem conseguir acelerar o jogo e pouco participante na circulação. Se o FC Porto rejeitou uma proposta de 30M€, não foi pelo jogador que vimos contra o Gafanha. Há também que insistir na melhoria da capacidade de meia-distância. Contra equipas que enfiam o Boeing 777 na grande área, ter capacidade de remate à entrada da grande área pode resolver muitos problemas.

Está feito, venha o próximo.

PS: O FC Porto, num salutar ato de transparência, publicou uma imagem de um contrato assinado por Helton e administradores da SAD que visa demonstrar que a rescisão já foi feita a 15 de Setembro. Há que acabar com o ruído, sem dúvida, pois criar ou alimentar polémicas com ex-capitães, independentemente dos argumentos de cada parte, nunca traz nada de bom. Só não se percebe o porquê do FC Porto fazer questão de mostrar uma rescisão assinada a 15 de Setembro, se no R&C de época 2015-16 o FC Porto já dava conta de uma rescisão ocorrida até 30 de Junho de 2016. Um R&C anual já deveria ser fonte de informação suficientemente esclarecedora para evitar dúvidas ou polémicas.



Helton é passado, um passado que será sempre recordado com carinho enquanto foi o número 1 da baliza do FC Porto, vencer o Club Brugge tem que ser o futuro. 

sexta-feira, 14 de outubro de 2016

«Senão, um dia, pode não haver recuperação fácil»

«É evidente que os recursos que estão afetos ao futebol vão sendo cada vez mais curtos para fazer face às exigências do futebol. Tem de haver sensatez e prudência nesse equilíbrio. Senão, um dia, pode não haver recuperação fácil».

Faz este fim-de-semana dois anos que Fernando Gomes, administrador da SAD do FC Porto, disse estas palavras no Porto Canal. Um apelo à contenção de custos e o reconhecimento de que ia ser necessário apertar o cinto.

Afinal, o FC Porto tinha acabado de apresentar um prejuízo de 40,7M€ em 2013-14. Os custos com pessoal eram de 48,8M€. Os custos operacionais foram de 95,17M€. Os proveitos operacionais atingiram os 72,6M€. O défice operacional de 22,5M€. Os salários cobriam 67% dos proveitos operacionais (a UEFA não recomenda mais de 70%). O passivo era de 233M€. O valor investido no plantel foi de 46,5M€. Os encargos sobre transferências foram de 4,8M€. A dívida total em empréstimos era de 139M€.

Há dois anos, Fernando Gomes tinha feito um reconhecimento geral da necessidade de reduzir os custos, não só aplicável ao FC Porto como à generalidade do futebol português. Dois anos depois, através do R&C de 2015-16, podemos concluir que o FC Porto não só não reduziu os seus custos comparativamente a 2014 como foi capaz de aumentar de forma abrupta todas as alíneas.

O prejuízo de 2015-16 foi de 58,4M€. Os custos com pessoal aumentaram 27M€. Os custos operacionais aumentaram 30M€, para 124,4M€. Os proveitos operacionais tiveram um ligeiro aumento para 75,8M€. O défice operacional dobrou para os 48,6M€. A totalidade das receitas operacionais não chega para cobrir 100% dos salários. O passivo está à porta dos 350M€. O investimento total no plantel foi de 78,4M€, dos quais 15,16M€ em encargos. A dívida total de empréstimos chegou aos 178,35M€ (dos quais 10M€ após a operação Euroantas). Uma realidade um bocadinho ao lado daquela a que Fernando Gomes apelava em 2014. 

Já no início do ano, Fernando Gomes falava do acordo do FC Porto com a PT/Altice. «É um grande acordo que permite sobretudo que o FC Porto, enquanto empresa, possa ser gerido de forma menos contingente. Até agora, os encargos operacionais eram sempre superiores aos proveitos operacionais, sem contar com as mais-valias das transações de passes de jogadores. A partir de agora podemos vir a deixar de ter de tomar decisões sob pressão. Permite gerir o clube de outra forma, mais objetiva económica e financeiramente e sem estar tão dependente dos ganhos ocasionais em janeiro e no final da época. É essa a grande vantagem». Ainda não chegámos a 2018, mas o contrato com a PT/Altice já parece uma espécie de oásis no deserto, insuficiente para matar a sede.

E ainda na entrevista ao Porto Canal, Fernando Gomes afirmou: «Este ano, fizemos um aumento de capital que superou o capital social negativo e resolveu os nossos problemas do fair-play financeiro. Não é preciso um grande resultado para, no próximo ano, cumprirmos o fair-play financeiro».

Chegamos a 2016 e o FC Porto falhou o fair-play financeiro. Não podia apresentar um prejuízo de mais de 8,6M€, apresentou de 58,4M€. Em 2014, a SAD apostou na absorção do Estádio para resolver o problema dos capitais próprios. Dois anos depois, revelou-se incapaz de gerar as receitas necessárias para cumprir com o fair-play financeiro.

O fair-play financeiro não era só para cumprir num ano, mas sim ano após ano. Enquanto aguardamos que a UEFA fale sobre o que poderá acontecer ao FC Porto, é bom lembrar que a época 2016-17 vai ser ainda mais difícil do que a época anterior no que toca ao FPF.

Em 2014-15, 19,3 milhões de euros de lucro. Em 2015-16, 58,4 milhões de prejuízo. Logo, à partida para esta época, a SAD já vai ter que apresentar 9,1 milhões de euros de lucro para não violar as regras para o triénio que acaba em 2017. Isto apenas para cumprir o fair-play financeiro, não para tapar todos os buracões da época passada. Resta aguardar para conhecer em que medida as deliberações da UEFA podem ditar novas regras/limites financeiros para o FC Porto cumprir no curto prazo.

Por fim, apetece perguntar: por onde andaram as palavras ditas por Fernando Gomes em 2014 nos últimos dois anos? 

quarta-feira, 12 de outubro de 2016

34 coisas a reter do Relatório e Contas 2015/16

- No orçamento proposto há um ano, a SAD pretendia fechar o exercício com um lucro de 1,793 milhões de euros. Terminou com um prejuízo de 58,411 milhões de euros, o maior da história do futebol profissional em Portugal. 

- O FC Porto apontava para receitas operacionais de 85,433 milhões de euros. Ficou-se pelos 75,811 milhões de euros, muito por causa das receitas da UEFA (a SAD esperava 27,437M€, mas terminou com apenas 11,603M€). Na generalidade das restantes rubricas, merchandising, bilheteira, direitos televisivos e publicidade, a SAD ficou ligeiramente acima das expetativas e cumpriu com o que estava orçamentado. Nas receitas operacionais, o problema foi por isso a Liga dos Campeões - não é possível continuar a dar por garantido, orçamento após orçamento, que o FC Porto vai estar sempre presente na Champions. 

- Nos custos operacionais, eram esperadas despesas de 107,76 milhões de euros. Os custos acabaram por bater o recorde de 124,325 milhões de euros. A folha salarial ficou quase 7M€ acima do que estava previsto, algo verdadeiramente preocupante e negativo, sobretudo tendo em conta que em janeiro saíram alguns dos mais bem pagos do FC Porto, casos de Tello, Imbula e Osvaldo. Custos com pessoal de 75,79M€ são uma violação do que já era incomportável. A SAD diz que a subida se deve essencialmente às indemnizações de Julen Lopetegui e José Peseiro (dois exemplos em que erros de gestão desportiva têm consequências financeiras - um pelo momento da saída, outro pela chegada). 

- Os Fornecimentos e Serviços Externos voltaram a disparar: a SAD gastou sensivelmente mais 6M€ do que estava previsto, ao chegar aos 38,662M€ de despesa. 

- Toda a receita da atividade corrente da SAD não chega para pagar os salários da época 2015-16. 

- A SAD tinha que apresentar um resultado de 72,591M€ com transações de passes. Após custos, amortizações e perdas por imparidade, a SAD apresentou apenas 7,102M€ (no que toca a mais-valias, contando com Alex Sandro, as mesmas chegaram a 40,22M€). 

- A SAD pretendia fechar o exercício com um prejuízo de 22,323 milhões nos resultados operacionais sem vendas de jogadores. O prejuízo foi mais do dobro do que estava orçamentado, 48,614M€

- Nos últimos três exercícios, o FC Porto acumulou um resultado negativo de quase 80M€ - pior que em todos os anos anteriores de atividade da SAD juntos. 

- O ativo subiu para 375M€, uma subida de 15,81M€, algo que se deve unicamente ao valor do plantel, que subiu quase 25M€ na rubrica de ativos tangíveis. 

- Em contraste, o passivo sofreu uma subida abrupta, de 73M€, atingindo agora quase os 350M€. O passivo corrente aumentou cerca de 25% no prazo de um ano, estando agora nos 202 milhões de euros. 

- A SAD explica o prejuízo com uma «decisão estratégica de não transferência de alguns ativos da sociedade, com finalidade de competir ao mais alto nível em 2016-17». Buster Keaton, Charlie Chaplin e Harold Lloyd dão por eles a pensar que deixaram muito por fazer no mundo da comédia. 

- A SAD informa, pela primeira vez, que Helton rescindiu o contrato que tinha com o FC Porto. Assim sendo, já não é um profissional assalariado pelo clube e já não tem qualquer ligação a este emblema.

- O capital próprio mantém-se positivo, mas desceu 57,25 milhões de euros no espaço de um ano, um espelho do prejuízo apresentado. Os efeitos da operação Euroantas, cuja cedência do clube para a SAD também fazia parte de uma «visão estratégica e ponderada», estão cada vez mais reduzidos. 

- Face à subida do passivo, e tendo em conta que um dos empréstimos obrigacionistas conhecerá o prazo para reembolso neste exercício, a SAD diz que «o Conselho de Administração está a estudar a realização de uma operação financeira para reestruturação deste passivo, de forma a assentar uma parte significativa da sua dívida no longo prazo».

- Pela primeira vez, a SAD decidiu pronunciar-se sobre o falhanço do fair-play financeiro. A SAD não podia apresentar mais de 8,6 milhões de euros de prejuízo, o que significa que falhou o FPF por cerca de 50 milhões de euros. Resta agora aguardar que a UEFA se pronuncie sobre as punições a aplicar ao FC Porto - e que o Conselho de Administração responda depois por elas e que assuma as responsabilidades pelas mesmas. Aqui a culpa - se preferirem, a responsabilidade - não é dos blogues, não é da imprensa, não é dos adeptos, não é do árbitro, não é do Marega, não é do Lopetegui e não é do Trump: é do Conselho de Administração da SAD. Democraticamente reeleito por 79% dos associados votantes, diga-se. 

- Maicon saiu para o São Paulo por 12M€, gerou uma mais-valia de 9M€ e o FC Porto indica que comprou 50% de Inácio por 3M€. Mas o FC Porto pagou no total 6M€ ao São Paulo. Se Inácio custou 3M€ por metade do passe, a que se devem os restantes 3M€ pagos ao São Paulo?

- O FC Porto pagou 15,162 milhões de euros com encargos com transferências na última época. O FC Porto detalha as compras de 11 futebolistas (há 5M€ pagos por jogadores que não são discriminados) e pagou comissões a um total de 25 entidades diferentes. 

- A SAD tem 60% do passe de Víctor García, pois já tinha adquirido 10% no último trimestre de 2014/15, além dos 50% que comprou depois à Northfields. 

- A SAD tem a receber 50,69M€ de outros clubes no prazo de um ano. Entre os novos devedores, entram o Stoke (13,37M€), o Portimonense (615 mil), o Atlético Paranaense (500 mil) e a Real Sociedad (300 mil). Nota para a Doyen, cuja dívida em relação ao FC Porto aumentou no último ano, para os 2,877 milhões de euros. 

- A SAD já começou a antecipar as receitas do novo contrato com a PT/Altice (que só entra em vigor em 2018), ao utilizar 10M€ como garantia para um empréstimo junto do Montepio.

- A SAD antecipou 13,37M€ da receita de Imbula, ao recorrer ao Macquarie Bank, banco australiano.

- A SAD está mesmo apostada na antecipação de receitas - tentar tapar os buracos do presente comprometendo o futuro. Outro exemplo foi o contrato com a Unicer: foi renovado em abril e, no mesmo mês, a SAD usou-o como garantia para um empréstimo de 4,2M€ junto do BIC. 

- No R&C Individual, a SAD dá conta de adiantamentos de 4M€ em 2014-15 e de 27M€ em 2015-16 nas receitas televisivas. No R&C Consolidado, os adiantamentos apontam para 36,9M€ em 2015-16 e 9M€ em receitas do patrocinador principal.

- Fernando Gomes disse, no início de janeiro, que o contrato com a Altice ia permitir «gerir o FC Porto de outra forma». É esta a forma de que falava?

- O FC Porto deve 37,743M€ no prazo de um ano a outros clubes.

- Em dezembro, o FC Porto tinha uma dívida corrente de 1M€ e uma não corrente de 1,8M€ ao Portimonense, pela contratação de Danilo. Neste momento (a 30 de junho), a dívida não corrente mantém-se (1,8M€), mas a dívida corrente já é de 2,75M€. O que significa que o FC Porto comprou mais jogadores ao Portimonense - ou através do Portimonense -, mas não há detalhes sobre isso. Gleison é um desses casos.

- Nos Fornecimentos e Serviços Externos, destaque para um aumento de 601 mil para 3,5 milhões de euros do FC Porto em despesas com os direitos de imagem dos seus jogadores. Há mais 2M€ de despesas que não são discriminadas. Nota para uma descida na «Publicidade e Propaganda» para sensivelmente metade, agora de 1,06M€.

- Nos custos com pessoal, o plantel mantém-se na casa dos 54M€. As remunerações dos Órgãos Sociais subiram para 1,97M€, apesar dos vencimentos de Pinto da Costa (520 mil euros) e administradores da SAD (287) se manterem inalterados. As rescisões com Lopetegui, Helton, Peseiro e restantes staff saíram caro, pois a rubrica ascende a 4,4 milhões de euros. 

- Em 2015, o FC Porto tinha 329 profissionais no Grupo. Neste momento, são 431, com destaque no aumento dos administrativos (de 133 para 217), dos técnicos desportivos (37 para 54) e dos atletas (77 para 85). No Museu, saíram sete pessoas, estando agora 25 ao serviço do FC Porto. 

- O FC Porto teve proveitos de 2,769M€ com empréstimos de jogadores. Em sentido inverso, teve custos de 3,347 com empréstimos de jogadores. 

- A SAD incluiu uma alínea em que dá conta de operações realizadas com Alexandre Pinto da Costa, filho do presidente, na envolvência da Energy Soccer em transferências e renovações de contratos. A Energy Soccer faturou 465 mil euros com comissões nas saídas de Rolando e Quaresma, na compra de Fede Varela, na renovação de Leandro Silva e na assinatura do contrato profissional com Rui Pires (menino a seguir com muita atenção). Estão pendentes 108 mil euros. Saúda-se que a SAD apresente estes detalhes das contas, mas deveria ser aplicável a todos os membros do Conselho de Administrações que negoceiam com familiares. 

- A SAD diz que os custos de Alex Telles, Depoitre e Boly implicaram um valor global de 19M€. Tendo em conta que Alex Telles, segundo o Galatasaray, custou 6,5M€, a SAD confirma que investiu 12,5M€ em Depoitre e Boly. 

- Fernando Gomes diz que foram rejeitados 95M€ por André Silva, Danilo e Herrera. Tendo em que conta que Fernando Gomes diz que tal permitiria apresentar resultados positivos, então foram propostas apresentadas até 30 de junho. Assim sendo, André Silva tinha uma cláusula de rescisão de 25M€, por isso houve um total de 70M€ propostos por Danilo e Herrera. Tendo em conta que Danilo tem uma cláusula de 40M€, ou andaram a oferecer propostas acima das cláusulas, ou o FC Porto rejeitou uma proposta de pelo menos 30M€ por Herrera. É a vez de Cervantes, Dumas e Dickens sentirem as suas obras incompletas. 

- O FC Porto justifica-se com esta frase: «Demos um passo atrás, para darmos agora dois ou três em frente». Esperemos é que tenham reparado que já têm o abismo debaixo dos pés.

domingo, 9 de outubro de 2016

Mudança de paradigma

Na sequência deste post, a segunda parte da revolução anunciada pelo - ou através do - JN no FC Porto com a entrada de Luís Gonçalves na estrutura. Foi escrito que o FC Porto vai passar a privilegiar ao máximo a contratação de jogadores portugueses para os sub-19, e a contratação de estrangeiros passará a ser feita só em circunstâncias excepcionais. 

Jornal de Notícias, 07/09/2016
É uma necessidade, sobretudo quando tendo em conta que, nos últimos sete anos, não foi contratado um único jogador para os Sub-19 que se tivesse afirmado no FC Porto, ou que tenha neste momento um papel ativo na equipa principal. 

Para já, podemos ver com agrado que o plantel de juniores do FC Porto para esta época é na sua esmagadora maioria composto por portugueses. Há cinco estrangeiros no plantel. Mário Évora, guarda-redes cabo-verdiano que provavelmente nunca sairá do estatuto de suplente; Ayou Abou, marroquino ex-Barcelona que faz a segunda época no clube; Moses John, um desconhecido nigeriano que ainda não jogou; Yan Dinghao, um médio chinês - não há futebolistas chineses com qualidade para o FC Porto e pouco leva a crer que Dinghao inverta a história; e por fim James McArthur, um ganês que dificilmente sairá com mediatismo maior do que aquele com que chegou. De resto, tudo portugueses e um bom arranque de época (11 jogos e 10 vitórias, duas delas na Youth League). 

Se tivermos como referência os jogadores que foram recrutados para os Sub-19 nos últimos sete anos, vemos que tem havido uma incapacidade imensa em encontrar juniores com qualidade para chegarem à equipa A do FC Porto. A saber, e lista é longa:

Adivinha quem é
Yero, Gilmar, Rody, Engin, Bacar Baldé, Katalic, Renato, Abdoulaye, Cristian Atsu, Rafinha, Fábio Nunes, Samir Abdr, Romário, Ebo, M'Bola, Mikel, Rafael Floro, Thibaut Vion, Sagna, Víctor Garcia, Kokovic, Li Shuai, Rúben Alves, Jonathan, Ricardo Tavares, Pius, Elvis, Fidélis, Gudiño, Chidera, Leonardo Ruiz, Tony Djim, Malthe, Lumor, Matheus, Chidera, Ayoub, Luiz Sousa, Mouhamed, Oleg, Xavi, Dinghao, Moses, Fali, McArthur. 

Ufa. A maioria destes jogadores são desconhecidos para os adeptos. Muitos não sabem de onde vieram, muitos não sabem para onde foram, muitos não sabem sequer que passaram pelo FC Porto. Os processos de contratação da maioria destes jogadores são desconhecidos, mas se para se contratar jogadores conhecidos como Casemiro ou Dani Osvaldo são necessários contratos de scouting, o que esperar de miúdos desconhecidos que chegam dos 4 cantos do mundo?

Estamos a falar de jogadores que chegaram do Senegal, Gana, Costa do Marfim, Zâmbia, Nigéria, Venezuela ou Equador. E de toda esta lista, só seis jogadores chegaram a alinhar pela equipa A, a saber: Chidozie, Víctor García, Mikel, Abdoulaye, Yero e Cristian Atsu.

De todos estes, aquele que acabou por desempenhar o papel mais relevante na equipa A foi Cristian Atsu, apesar ter sido muitas vezes opção para Vítor Pereira sobretudo por o nosso último treinador campeão não ter muito por onde escolher (1 golo e 4 assistências em 32 jogos). Podia ter crescido mais no FC Porto, mas foi mal acompanhado na gestão da sua carreira e pouco mostrou desde que saiu do FC Porto. 

Mas é um exemplo do quão fragmentado já pode estar um jovem africano quando chega ao FC Porto. No momento da transferência para o Chelsea, a Energy Soccer, de Alexandre Pinto da Costa, ficou com 150 mil euros. E um fundo, cujo nome não foi revelado, ficou com 25%. Assim a mais-valia pela venda ao Chelsea ficou abaixo dos 2M€, com a curiosidade de depois a SAD ter utilizado o valor da conta a receber do Chelsea (1,5M€) para o ceder à Good for Sports Limited, a uma taxa de 8%. 

Sete anos de FC Porto
Um caso ainda mais demonstrativo é o de Mikel Agu, que tem mais renovações de contrato do que jogos pela equipa A. Mikel está agora a jogar com regularidade em Setúbal, embora nunca tenha revelado estofo e qualidade para ter espaço na equipa A (os melhores jogos que fez na equipa B foram como central). Está desde 2009 no clube, sempre a ter oportunidades de treinar no plantel principal, mas nunca mostrou estar em condições para dar o passo competitivo que faltava (com ou sem lesão, não faria parte das opções de Lopetegui para 2014-15). 

Do passe de Mikel, é sabido que a SAD cedeu 10% do seu passe ao SIF, em 2012, por cerca de 100 mil euros. Desde então, o passe do jogador já passou por diversas fragmentações: 10% ao Megapp FC, 25% a uma entidade chamada Sans Souci, e depois mais 10% cedidos ao SIF; à luz de um protocolo com a Sans Souci, a SAD cedeu 25% da receita líquida de uma futura venda. Qual a pertinência/razão de todas estas operações? Qual o sentido de ser necessário fragmentar tanto e tantas vezes o passe de um jogador que chegou ao FC Porto em 2009 e que esteve dois anos à espera para ser inscrito (não podia jogar antes dos 18 anos)? Não vale a pena falar dos já conhecidos casos de Rúben Neves ou André Silva: é essencial manter a totalidade dos passes dos nossos jovens mais promissores. 

Yero pode eventualmente ser recordado como um dos jogadores mais altos da história do FC Porto, e pelos 57 minutos em que representou a equipa principal. Uma prova de que a ordem do substantivo pode fazer toda a diferença: a diferença entre um grande jogador e um jogador grande.

O sexto empréstimo
Abdoulaye, um jogador que conseguiram convencer que tinha propostas de Liverpol, Dortmund e Benfica, voltou a renovar e a ser emprestado pelo FC Porto. Estamos a falar de um jogador sem quaisquer qualidades para jogar a este nível e que já foi emprestado seis vezes. Algo a repensar no futuro imediato do FC Porto é chegar à conclusão que há jogadores que, por mais vezes que sejam emprestados, nunca se vão valorizar a ponto de ser possível lucrar algo com uma transferência. Abdoulaye é um desses casos. Em final de contrato, era uma oportunidade para deixar o jogador ir à sua vida. Mas não. Continua emprestado.

60% do passe de Abdoulaye eram propriedade da Unifoot, de José Caldeira, segundo o R&C da SAD de 2010-11. Mas no R&C de 2012/13, o FC Porto informou que comprou 60% à Pearl Design, com um custo total de 1,1M€. Estávamos a falar de um júnior africano sem escola, que ainda assim implicou um investimento considerável. 

Curiosamente Abdoulaye partilha com Chidozie o dia de nascimento - 1 de janeiro. E quanto a Chidozie, que renovou até 2020 (a renovação justifica-se, falta saber se o mesmo se aplica aos eventuais custos do seu passe), é possível recuperar a avaliação feita no final da época passada. 

«Sub-19, equipa B e equipa A na mesma época. Foi um carrossel de emoções para Chidozie, lançado às feras na Luz. O Tribunal do Dragão foi da opinião de que Diogo Verdasca, tendo o mesmo número de oportunidades que Chidozie, faria igual ou melhor. Opinião que se mantém, mas José Peseiro escolheu confiar em Chidozie, que acusou toda a sua inexperiência ao longo destas semanas.

A grande exibição de Casillas contra o Benfica disfarçou muita coisa. Chidozie comete os erros próprios da idade e da sua inexperiência. Bruno Alves, Jorge Costa ou Ricardo Carvalho não jogavam no FC Porto aos 19 anos por um motivo. O mesmo que penalizou Chidozie: inexperiência e falta de devida preparação. Repare-se que Chidozie nem sequer teve um parceiro consistente ao lado, o que não ajudou. Não houve jogo em que Chidozie não cometesse erros graves de posicionamento. Mais culpa das circunstâncias do que propriamente do jogador, que fez o que podia, sem a preparação devida.»

Chidozie tem jogado pela equipa B e aparece como 4º ou 5º central (mediante um possível recuo de Danilo) da equipa A. Continua a ter algumas caraterísticas interessantes, mas tudo dependerá do acompanhamento e espaço competitivo que tiver nos próximos dois anos. No R&C da SAD, que deve ser dado a conhecer a 20s de outubro, poderá ser possível ver os eventuais custos envolvidos na sua chegada. Um júnior oriundo da Nigéria não pode custar milhões (basta dois para ser plural). 

A valorização de García
Sobra então Víctor García, um caso já aqui analisado e debatido. Esteve inicialmente emprestado ao FC Porto, com a possibilidade de ser comprado por um valor consideravelmente baixo, mas a SAD prolongou o empréstimo e Víctor García acabou por custar 1,8M€, por 50% do passe, pagos à já popular Northfields Sports, empresa muitas vezes envolvida e sempre paga bem em negócios do FC Porto na América do Sul - com a saída de Antero Henrique da SAD, fica a expetativa de ver se o FC Porto continuará a negociar com esta empresa ligada a Marcelo Simonian. Não deve haver muitos clubes a pagar 1,8M€ por metade de um júnior da Venezuela. 

Chidozie, Víctor García, Mikel, Abdoulaye, Yero e Cristian Atsu foram os sub-19 estrangeiros que conseguiram jogar pela equipa A do FC Porto nos últimos anos. É pouco, muito pouco. E tendo em conta que não se aproveitou um único jogador da equipa B que conquistou a Segunda Liga na última época, é lógico que urge repensar não só aproveitamento a ser feito da nossa formação, mas sobretudo o recrutamento que estava a ser feito. É essencial detetar os talentos portugueses mais cedo e questionar se vale a pena continuar a ter este tipo de abordagens em mercados como o africano. 

Um exemplo? Rafa e Diogo Jota, que ainda com idade sub-19 estavam no Feirense e no Paços de Ferreira, e que neste momento são os dois avaliados em potenciais 40M€ juntos (um pelo que poderia custar, outro pelo que poderá custar). E por vezes, muitos desses talentos estão fora do mapa dos três grandes até à idade de juniores. Exemplos: Raúl Meireles estava no Boavista, Rolando no Belenenses, Bruno Alves no Varzim, Ricardo Carvalho no Amarante, e a lista pode continuar, jogadores que conquistaram muitos títulos importantes no FC Porto.

Terá a Gestifute um departamento de scouting mais capaz do que o FC Porto? Não, certamente. Os empresários não podem ser mais rápidos do que o FC Porto, até porque atacar os jovens do mercado nacional sai muito mais barato do que recrutar sub-19s em África ou na América do Sul. A mudança de paradigma é mesmo essencial: o FC Porto tem que ser mais rápido a chegar aos jovens portugueses e trocar as prioridades.