A ideia principal passava por uma newsletter para adeptos. Foi daí que nasceu o Dragões Diário. Um mês depois da sua criação, o Dragões Diário deixou de ser, pelo menos em termos mediáticos, uma newsletter para adeptos: passou a ser o principal mecanismo de defesa e contra-ataque para o FC Porto em termos de comunicação.
O impacto na comunicação social está a ser imenso. Faz capas de jornais, motiva respostas institucionais, rende milhares de page-views e faz disparar as vendas de Barral Dermaprotect. Os adeptos do FC Porto concordam quase todos com o mesmo: isto só peca por tardio. Mas há cuidados a ter em conta.
Questão: isto é a palavra do FC Porto ou a palavra de Francisco J. Marques? Tendo experiência e responsabilidades como diretor de informação, FJM está identificado com o clube, percebe como funciona e logo custa a crer que alguma vez desse alguma resposta que não estivesse em sintonia com o que pensa o estado-maior do Dragão. Mas não deixa de ser curioso que todos os textos sejam assinados por FJM, ao contrário do que acontece, por exemplo, em comunicados oficiais. Logo, é o FC Porto quem está a falar ou FJM? Aparentemente, FJM em nome do FC Porto. Se assim é, que seja para continuar.
Mas a assinatura a título pessoal já é uma imagem de marca sua. De recordar o que escreveu quando trocou o jornalismo (Lusa, JN, Público...) pela direção de informação do FC Porto. «Ao longo da minha carreira de jornalista escrevi textos simpáticos e
antipáticos para com o FC Porto, para com o Benfica, para com o Sporting
e para com todos os clubes. É a vida. É um facto indesmentível que
escrevi que o FC Porto se sagrou pentacampeão, que o FC Porto venceu a
Taça UEFA, que o FC Porto venceu a Liga dos Campeões, a Taça
Intercontinental, o tetracampeonato e nunca o fiz em relação ao Benfica,
mas a culpa não é minha. Juro.»
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Do Apito Dourado à Liga Aliança |
Era urgente rever a política de comunicação do FC Porto. Pinto da Costa intervém cada vez menos publicamente e nem sempre com a maior pertinência - em 2014-15, destaca-se a forma como se insurgiu contra as nomeações do Conselho de
Arbitragem, mas a determinada altura parecia mais interessado em (contra-)atacar Fernando Gomes do que a forma como a FPF, em odores de cumplicidade, (não) tem reagiu ao CA e à
Liga Aliança que comprometeu a verdade desportiva do futebol português como não se via desde o Apito Dourado. Com a diferença de que o Apito Dourado
parou convenientemente em Leiria, enquanto a Liga Aliança não vai além da capital. Já para não falar que o processo Apito Dourado assentou, essencialmente e factualmente, em dois jogos de alegado benefício ao FC Porto, contra Beira-Mar e Estrela da Amadora. Façam lá as continhas sobre de quantos
Apitos Dourados o Benfica beneficiou nas primeiras 22 jornadas do campeonato.
Ainda sobre o Dragões Diário, resta ter o cuidado de não banalizar a palavra do FC Porto. Diariamente, tem sido notícia um pequeno trecho do Dragões Diário. Quase sempre pertinente, mas se diariamente o FC Porto se insurgir sempre contra algo a sua palavra vai começar a merecer alguma indiferença. Há que guardar as críticas para as alturas mais pertinentes possível. Em 2014-15 já não há muito mais a fazer, mas a partir da próxima época há que ser tão seletivo quanto possível. Mesmo nos tempos de maior sangue na guelra de Pinto da Costa, passavam semanas e semanas sem que o presidente falasse. Mas quando falava, o impacto era imediato.
Se essa seleção for bem feita, o FC Porto só tem a ganhar. Era importantíssimo mudar de estratégia, pois temos que ter uma voz presente na defesa do FC Porto. Antero Henrique quase só dá uma entrevista anual em épocas de títulos (não fala desde a promoção ao Museu em 2013), as responsabilidades financeiras e perfil de Fernando Gomes não recomendam que seja ele a fazê-lo, Adelino Caldeira idem e Rui Cerqueira, apesar do papel no Porto Canal e no site/redes sociais do FC Porto, praticamente não se manifesta publicamente desde a conferência de imprensa com os erros de Duarte Gomes, em 2011. Precisávamos de uma nova voz, desde que FJM esteja sempre em sintonia, dentro de possível, com o estado-maior do FC Porto.
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O manto protetor |
É bom ver a urticária que vai provocando. O mesmo se aplica às conferências de imprensa de Lopetegui. Fica tudo tão incomodado com a palavra do treinador do FC Porto que ninguém pára para pensar na questão essencial: o que é que Lopetegui tem dito que é mentira? Tal como o Dragões Diário se assentou em factos para falar sobre a nomeação de João Capela (já aqui avaliada anteriormente), Lopetegui nunca saiu do campo dos factos/estatística ou da mera opinião pessoal. Nunca acusou um árbitro de querer errar propositadamente, de querer beneficiar o Benfica, de querer prejudicar o FC Porto. Nunca acusou ninguém de ser desonesto e sempre o afirmou: no dia em que tiver provas do contrário, pede para sair de Portugal, tal como José Mourinho o fez em janeiro de 2004, após um clássico com o Sporting. Aliás, Lopetegui vai-se limitando, nas conferências de imprensa, a responder a perguntas. Se os jornalistas lhe fazem essas perguntas, é porque sabem que algo de errado se passa, mas é sempre mais fácil puxar pela boca do treinador do FC Porto em vez de escrever o que todos vêm e sabem.
A maior excepção ao politicamente correto chama-se Jorge Jesus, que à sexta época no Benfica está finalmente à beira de conseguir fazer aquilo que Jesualdo Ferreira fez em 3 anos de FC Porto: ganhar três campeonatos. Com a diferença que Jesualdo, nos 4 anos à frente do FC Porto, passou sempre a fase de grupos da Champions, coisa que Jorge Jesus só fez uma vez, e não teve túneis nem colinho. É um facto que Jorge Jesus goza de uma proteção que nunca um treinador em Portugal teve. Agride jogadores adversários, agentes de segurança, tem justificações e desculpas para recorrentes falhas ao serviço do Benfica e ainda continua a ser aclamado como mestre da táctica, um treinador de 60 anos que só uma vez na carreira meteu os pés nos 1/8 da Champions. E depois de tanta preocupação face à falta de títulos de Lopetegui em 2014-15, que dizer de um treinador que entre 2010 e 2013 recebeu 12 milhões de euros brutos, sempre com orçamentos na casa 100 milhões, para depois ver o FC Porto ser tricampeão com apenas uma derrota? Ah, Lopetegui ameaçou que lhe dava um puñetazo? Foi fraquito. Jorge Jesus não se fica pelas ameaças: soca logo.
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Lopetegui fala a título pessoal |
Lopetegui deu a Jorge Jesus o tratamento que este fez por merecer. O que disseram após o clássico só ambos saberão. Mas só um dos treinadores decidiu ir meter uma acha e chorar um bocadinho junto do Sol. Percebe-se, foi importante para o treinador do Benfica apresentar logo publicamente a sua versão dos factos, não fosse Lopetegui fazê-lo primeiro e entalá-lo. Adiante, esta é apenas mais uma prova de que com Lopetegui não há subserviência, nem mesmo num clube cuja estrutura (ou parte dela) pensou, nos últimos anos, que o treinador era quase um mero adereço e que no FC Porto qualquer um é campeão. Como se sabe, Pinto da Costa é um grande admirador de Jorge Jesus. E não foi isso que inibiu Lopetegui de, uma vez mais, não ter papas na língua.
Para terminar, Lopetegui vai-se tornando num case study face às reações de muitos adeptos do FC Porto. Todos conhecem a expressão «jogador à Porto», mas há diferentes formas de o explicar. Mas por norma, todos concordam que um profissional à Porto é alguém que dá o peito às balas na defesa do FC Porto, que se insurge contra a injustiça e desvalorização que muitos fazem perante o nosso clube, que demonstra raça, determinação, vontade de vencer. Ora Lopetegui demonstrou tudo isto ao longo da época do FC Porto. Por isso, pode-se concluir que na cabeça de muitos adeptos um jogador/treinador à Porto é simplesmente alguém que ganha (a única coisa que faltou a Lopetegui esta época - também a mais importante). Se não ganha, então não presta. E isso não é um adepto do FC Porto, é um adepto de vitórias.
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Balanço e expetativas |
Ninguém pode estar satisfeito com 2014-15, pois é, faltando 2 jornadas para o fim do campeonato, uma época sem títulos. Será necessariamente uma época má? O FC Porto fez uma óptima Liga dos Campeões, não só de grande valia desportiva como financeira. Fez um campeonato em termos de pontuação e percentagem de vitórias muito acima da média, que só não nos dá a liderança porque, depois de 2011-13, há outro Vítor Pereira talhado para o campeonato nacional (na Europa é que já não consegue/pode fazer muito). Na Taça de Portugal, estivemos mal, embora os clássicos sejam os jogos onde há mais possibilidades de perder e o jogo que o Sporting fez só aconteça uma vez em 10 (prova disso foi a sua segunda visita ao Dragão). Sobra a Taça da Liga, mas depois de Pinto da Costa ter dito que esta o Benfica podia ganhar todas, é a Lopetegui que vão cobrar a factura por não termos ganho esta competição?
Temos razões para crer que 2015-16 será uma época melhor. Em relação a Lopetegui não havia apenas dúvidas no plano técnico-táctico. É um treinador que não estava habituado a lidar com nada daquilo que é o quotidiano de um técnico do FC Porto e de qualquer outro clube: gestão do balneário, definição de um 11 base, contacto semanal com imprensa, um ou dois jogos por semanas, extensão de uma equipa B/camadas jovens, pressão por ter que manter uma equipa competitiva enquanto tem que lançar outras opções para valorizar, evoluir e vender, ter poder e responsabilidades no mercado de transferências, saber o que é ter um clube rival, lidar com más arbitragens, jogar em campos com declive (...). Resumidamente, o FC Porto talvez nunca teve um treinador tão pouco preparado para estas funções como Lopetegui. Ainda assim, brilhámos na Europa e em Portugal os 78 pontos que somamos chegavam e sobravam para chegar ao título em épocas anteriores. Tudo isto enquanto Lopetegui teve que ser permanentemente a voz de defesa ao FC Porto, muitas vezes sem que fosse defendido ou escudado pela estrutura.
É o homem certo no lugar certo. 2015-16 será a época certa para o provar.
PS: Após tantos meses,
alguém acordou, depois de tanto disparte que foi escrito. Mais vale tarde que nunca, não é? No fim da época logo se verá se continuamos a meter gasolina cara, à espera que o motor arranque, ou se devolvemos ao
stand.
PS2: Empréstimo obrigacionista sobe para 45M€. Um valor que representa 50% das receitas operacionais que estavam previstas pelo FC Porto para 2014-15. Como prognósticos no fim do jogo são fáceis, alerte-se agora: isto é desafiar os limites do risco e o cinto tem que apertar. Tal como devemos ser criteriosos no uso da palavra no Dragões Diário, teremos que o ser no ataque ao mercado no próximo defeso. Lopetegui saberá que terá que encurtar a lista de compras. E a SAD também.