Trivia: qual era, à entrada para a 29ª jornada, o melhor ataque do FC Porto em casa dos últimos 20 anos? A resposta pode chocar: este. Este mesmo FC Porto, ontem incapaz de fazer um golo ao Feirense, mas que tinha, em igualdade com o FC Porto de Villas-Boas, o melhor aproveitamento de golos em jogos em casa (40).
O mesmo FC Porto que acabou a seco em jogos contra Tondela, Setúbal, Belenenses, Paços de Ferreira e Feirense, que joga um futebol limitado desde as ideias que iam sendo trabalhadas na pré-época (por vezes disfarçado por bolas paradas e pelo talento individual dos jogadores, mas a base foi sempre inegável e nunca mostrou uma equipa com estofo de campeão), tinha o melhor ataque no Dragão.
Em 30 jornadas, apenas uma derrota. A melhor defesa do Campeonato, que se mantém. E fora de casa, o segundo menor número de golos sofridos dos últimos 30 anos. Como é que uma equipa com estes predicados chega a esta fase a jogar tão sofrível futebol?
O mais frustrante é isto: este FC Porto joga pouco. Mas tinha, tem, condições para ser campeão nacional. É frustrante que numa época de tão pobre futebol, de tão pobres e inconsequentes ideias do seu treinador, de uma série de apostas falhadas (e outras ganhas, com mérito, essencialmente com reforços brasileiros), o título ter estado ali sempre ao virar da esquina, ao alcance.
Nos últimos 5 jogos, o FC Porto ganhou um. Desperdiçou 8 pontos. Esses 8 pontos já teriam arrumado a discussão da luta pelo título, e fariam do FC Porto um relativamente inesperado campeão em 2016-17.
Este jogo contra o Feirense foi, novamente, um espelho da época. Uma equipa que não jogando particularmente bem não deixou de criar as suas oportunidades, de ter todas as condições para ganhar o jogo. Agora, não digam que estão a fazer tudo para serem campeões, pois quem serve oito pontos de bandeja em cinco jornadas, na decisiva reta final do campeonato, pode ter a ambição, mas não mostra estofo para tal.
Nuno Espírito Santo e os jogadores não têm, é claro, culpa de mais uma arbitragem prejudicial com dois lances de penalty, nem que Brahimi e Corona tenham estado ausentes quando havia (ou então devia haver!) planos para o regresso ao 4x3x3. Mas olhar para campo e ver uma equipa tão mal preparada, sem fio de jogo, com dificuldades contra qualquer equipa do campeonato português, com jogadores desviados das suas posições sem benefício para atletas e equipa...
Esta não foi uma época preparada para fazer do FC Porto campeão - basta recordar todas as incidências da pré-época, desde o atraso na chegada de reforços, as indefinições nas saídas, as lacunas que ficaram por colmatar e as ideias que NES ia demonstrando querer implementar -, mas no final das contas havia hipóteses de lá chegar. E provavelmente foram goradas nas últimas semanas.
Faltam quatro jornadas. E a maior incógnita não é saber se o Benfica vai perder pontos. É saber se o FC Porto não vai desperdiçar os que sobram. Lutar pelo título até ao fim sempre foi a ambição e, admita-se, algo que a determinada altura da época pareceu impossível. O problema é não notarmos que o fim talvez já aí esteja.
Movimentos de Maxi e Alex |
Laterais (+) - O mapa ao lado é altamente ilustrativo: Maxi Pereira e Alex Telles passaram o jogo no meio-campo adversário, fizeram quilómetros e corresponderam na perfeição àquilo que NES sempre quis para os seus laterais (máxima profundidade). O problema é que sobem quase sempre numa missão solitária, sem os apoios apropriados no jogo interior, e assistiram a um festival de desperdício entre os 30 (!!) cruzamentos que conseguiram fazer para a grande área. Mas atenção: entre estes 30 cruzamentos, só um resultou num remate à baliza e outros quatro chegaram a zonas de perigo. O problema é que para um cruzamento ser perigoso, há que ter um avançado pronto para finalizar. Se André Silva e Soares andam ocupados a passear-se pelos flancos ou longe da grande área, nada feito.
Que os adeptos não percebam as ideias de NES é uma coisa. Não é para os adeptos perceberem: é para a equipa perceber, render e ganhar jogos através delas. Que os adeptos não percebam, não há problema. Que os jogadores em campo não pareçam perceber, já é grave. Fica a grande nota de mérito para Maxi Pereira e Alex Telles: por eles, o resultado seria outro.
Raio de ação de Danilo |
Danilo Pereira (+) - O raio de ação de Danilo Pereira diz tudo: esteve em todo o lado, sempre à procura do primeiro momento de construção. Ganhou metros no terreno para empurrar a equipa para cima do Feirense, mas sempre em vão. Ganhou todos os lances pelo ar, tentou descomplicar, a determinada altura tentou ele subir no terreno, procurando um atalho que evitasse que a bola passasse por um miolo sem capacidade para encontrar espaço e servir os avançados.
Mourinho chegou a dizer que com 11 Paulos Ferreiras ganha-se um campeonato. Com 11 Danilos talvez não fosse diferente.
Tudo em redor de André Silva (-) - E, consequentemente, o próprio André Silva. Sim, não havia Corona e Brahimi, o que dificultou a tarefa para as alas. Mas uma vez mais, NES quer fazer dos avançados o que eles não são. Desta vez, André Silva até esteve mais vezes em zona interior (Soares caiu mais sobre a esquerda), mas nada, nada funcionou e a exibição de André Silva foi uma nulidade: tocou 2 vezes na bola na grande área, fez 7 passes, não ganhou nenhum lance pelo ar, fez dois dribles (na zona do meio-campo) e não fez um único remate (exceção ao golo anulado por fora de jogo). Alex Telles rematou mais, Casillas tocou mais vezes na bola e Karamanos, o ponta-de-lança do Feirense, fez mais passes e ganhou mais bolas divididas do que André Silva.
Um dos mais promissores pontas-de-lança da Europa, que andou a carregar a equipa às costas na primeira metade da época, não está a render absolutamente nada nos últimos jogos. O que mudou? Não o jogador, mas a missão que agora lhe dão dentro de campo. Não há milagres, sobretudo recordando o quão felizes foram os avançados de Rio Ave e Valência no passado recente.
Cruzar, repetir! (-) - Ponto prévio: o FC Porto teve oportunidades, várias, para ganhar o jogo. E quando um jogador se exibe ao nível de Vaná, torna-se difícil. O FC Porto fez 14 remates na grande área, o recorde desta época. Mas isto não é um caso de «se uma bola tivesse entrado ninguém falava disso». Não. Foi dito o mesmo em jogos anteriores, onde a bola parada, André Silva, Brahimi ou Soares davam a pincelada que disfarçava muita coisa.
Foi mais um desses jogos. O FC Porto teve oportunidades, mas os meios para os fins são sofríveis. André André e Óliver Torres poucas vezes encontraram os avançados, a equipa não se entendia no jogo interior, os avançados atropelavam-se no mesmo espaço e tudo acabou por resultar no mesmo: tentar meter a bola diretamente na grande área, usando e abusando da profundidade que Maxi e Alex Telles davam (e deram-la muito bem).
Neste FC Porto não há ideias no espaço interior, há poucas desmarcações, poucas tabelas que abram o espaço, uma equipa que reagiu várias vezes mal ao momento da perda (algo que já fez bem esta temporada) e incapacidade para aproveitar todo o caudal que, com mais ou menos qualidade, foi levado à grande área.