segunda-feira, 20 de novembro de 2023

Quando um portista aparece

«Bola no Porto... Passe mortal... Marco Ferreira aparece! Douglas falha! Ninguém para empurrar! Vamos Derlei! Bate! Bate! Bate!...»

O resto é história. Uma história que todos os portistas sabem de cor e que abriu um dos mais belos capítulos de um livro de honra de vitórias sem igual. Sevilha, Gelsenkirchen, Yokohama. O bis na raça de Derlei, a classe de Deco, o olhar de Pedro Emanuel... Mas há um detalhe que antecedeu tudo isto, imortalizado no relato acima citado.


Marco Ferreira «apareceu». Não rematou, não passou, não driblou; não recuperou a bola, não ganhou um ressalto, não se sabe muito bem se chega a tocar nela ou o que fez no lance. Mas o detalhe é este: apareceu. Marco Ferreira apareceu e este lance mudou a história do FC Porto. Bastou aparecer. 

Segunda-feira, 13 de novembro de 2023, os portistas apareceram. Contra muitas expetativas, desejos e planos, apareceram. A ordem de trabalhos visava a aprovação dos novos Estatutos do Clube e a tradicional "meia hora" para discutir assuntos de interesse. Mas cedo se percebeu que as motivações para tal afluência ultrapassavam o desejo de participar num simples sufrágio. 

A cronologia dos eventos já é por demais conhecida entre adeptos, associados e imprensa - os únicos que ainda não a conhecem aparentam ser os próprios responsáveis do FC Porto, que perante os registos das câmaras, os testemunhos de presentes e, pasme-se, os seus próprios olhos continuam sem conseguir identificar responsáveis com vista à abertura de processos disciplinares. Tudo redonda no mesmo: silêncio, indiferença, cobardia, medo.

Medo de quê? Medo de uma derrota anunciada que um grupo de «gratos» fez questão de se esforçar por tentar acelerar. Um atropelo aos mais básicos princípios da democracia e aos direitos e deveres de qualquer sócio do FC Porto. Sim, do FC Porto. O que une, ou deveria unir, todos os associados presentes é o amor ao FC Porto. Ao clube, não a um homem, seja ele qual for. E sobretudo não a um homem que, perante o poder de parar as tristes cenas que despontavam nas bancadas do Dragão Arena, respondeu com desdém e indiferença. Os seus adeptos atacados na sua casa: silêncio de Pinto da Costa e da sua cúpula administrativa.

Foi esta a grande derrota da noite. Pinto da Costa, para muitos, já não é um presidente à altura do FC Porto, mas poucos imaginariam que não seria um presidente à altura dos portistas. Por muito que os adeptos se possam dividir face ao seu futuro no clube, todos concordariam que quando Pinto da Costa pede a palavra, o portista deve o respeito de ouvir. Continua a ser o presidente democraticamente eleito e a figura máxima da história do clube; e o que fez com este estatuto e reconhecimento enquanto portistas eram ameaçados, intimidados e coagidos? Nada. Fechados na mesma redoma com que gerem o dia a dia do clube. 

Tudo isto, e não enganemos ninguém, por causa de um nome: André Villas-Boas. O futuro e único candidato à presidência do FC Porto que realmente inspira receio aos que se querem agarrar ao poder (ou, no caso dos que gritavam «Ingratos!», agarrados aos frutos do poder). Com o devido respeito por Nuno Lobo e José Fernando Rio, não eram nomes temidos por ninguém no FC Porto, mas ainda assim «tiraram» quase um terço dos votos a Pinto da Costa no último ato eleitoral. Se dois nomes pouco cativantes e mediáticos conseguiram isto, o nome Villas-Boas fez soar o alerta no Dragão.

Da candidatura de Villas-Boas nada se sabe publicamente. Nada. Nem quem o acompanha, qual o projeto, nada. Poderíamos dizer o mesmo sobre Pinto da Costa, que é eleito não pelo que faz hoje nem pelo que fará amanhã, mas pelo currículo de décadas passadas. Mas no FC Porto sabe-se (teme-se) o essencial: que Villas-Boas pode efetivamente fazer estragos contra Pinto da Costa.

Uma heresia, dizem aqueles determinados a manter Pinto da Costa na presidência do FC Porto nem que cheguem a uma sequela de Weekend at Bernie's. «Pinto da Costa tem que ser o presidente até ao último dia da sua vida, a não ser que queira sair antes!» Pois. A questão é que Pinto da Costa não quererá sair. Primeiro, porque ama o FC Porto e dedicou a sua vida a esse cargo. Segundo, porque vive fechado numa redoma que o venera e bajula a cada piscar de olhos. Não conhece contestação, discórdia ou insatisfação no seu dia a dia; continua a ser «o melhor presidente do Mundo». Mas não, a presidência de Pinto da Costa não pode ser um desejo do próprio, nem de uma dúzia seletiva, mas sim de uma maioria de portistas.

Pinto da Costa foi uma grande ameaça ao benfiquismo e ao centralismo; agora querem fazer dele uma ameaça ao portismo? Ai, a gratidão! Não, para ser eleito presidente do FC Porto não é preciso um exercício de gratidão. Quem o diz é o próprio Pinto da Costa, que sempre defendeu que a sua liderança assenta em quatro pilares: «Rigor, competência, ambição e paixão». Estes quatro parâmetros estão a ser cumpridos sob a sua presidência? Cada portista terá a sua opinião e cada sócio o seu voto; desde que o possam exercer livremente. 

Mas voltamos ao ponto de partida. A coação, a ameaça e a intimidação estão literalmente instaladas nas bancadas do Dragão. Terá a AG sido uma vez sem exemplo? Não se o FC Porto e os seus dirigentes não agirem em conformidade. Mas para quem tem esperança que tal aconteça, é aconselhável que adotem a mesma postura da administração da SAD enquanto portistas eram agredidos e arrastados para fora do pavilhão: de cadeirinha, para não se cansarem.

«Mas não têm os portistas o direito a continuarem a apoiar Pinto da Costa se quiserem?» Claro que sim. Mas então esforcem-se um pouco por defenderem o vosso candidato preferido. Porque aquilo que os já declarados anti-AVB estão a fazer é a passar um gritante atestado de incompetência a Pinto da Costa. Então querem que Pinto da Costa seja presidente do maior clube português se não é sequer capaz de derrotar um (ex-?)treinador sem experiência no dirigismo? Não confiam na eloquência e no dom da palavra de Pinto da Costa para esgrimir argumentos com AVB num eventual debate? Não tem Pinto da Costa mais dias de FC Porto do que Villas-Boas de vida? Então, qual é o receio da candidatura de AVB? Sinceramente, Pinto da Costa, por tudo o que já fez, merecia mais respeito e consideração por parte dos seus fiéis escudeiros. O presidente do FC Porto tem que ser a pessoa mais poderosa do clube, não alguém que querem esconder de qualquer batalha. 

«O problema são as pessoas que estão por trás da candidatura de AVB!» Pois. Disso, publicamente, ainda nada se sabe, ou se algo há para se saber. Mas uma coisa é certa: não se sabe quem está por trás da candidatura de AVB, mas sabe-se que quem está à frente da SAD deixa muito a desejar. E neste caso nem se fala da performance desportiva ou da saúde financeira (perdão, doença, porque de saúde há pouco), mas sim das mais básicas funções para qualquer presidente eleito democraticamente: assegurar que a mesma democracia que o elegeu não é beliscada sob a vigência. 

A Pinto da Costa e a Villas-Boas, fica o desafio: puxem o melhor Marco Ferreira que há em cada um de vós. Um se quer manter o lugar, outro se quer avançar. Apareçam. Que Villas-Boas apareça, como promete que o vai fazer; e que Pinto da Costa apareça, mesmo que os seus apoiantes não queiram que precise de o fazer. E se antes de Abril pudermos ter um debate televisivo no Porto Canal, perfeito. É que o material de filmagem e edição que foi poupado na última segunda-feira poderia assim finalmente ter uso. 

2 comentários:

  1. Obigado TdD pelo regresso! PF, que venham mais posts! De tudo o que diz, concordo, e quero apenas enfatizar a última frase... "É que o material de filmagem e edição que foi poupado na última segunda-feira poderia assim finalmente ter uso." Pelos vistos todo o sistema foi "poupado".

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  2. Bem vindo de volta. Texto perfeito como sempre pena e é que tenha sido nestas condições do clube uma vergonha que a todos nós entristece que os textos do Tribunal voltam

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