quinta-feira, 13 de setembro de 2018

Um coelho em 23 cajadas: viagens pelo Brasil

O FC Porto B está na sua sétima participação consecutiva na II Liga. Já se sagrou campeão nesse escalão, mas tem estado muito, muito distante daquilo que era idealizado como «viveiro» de jogadores para a equipa A. Uns por falta de oportunidades, outros por falta de qualidade. A determinada altura, por exemplo, era necessário um lateral-esquerdo na equipa principal, estavam a negociar Zakarya com o Belenenses e nessa mesma altura estavam quatro defesas-esquerdos a fazer a pré-temporada na equipa B (Diogo Bessa, Inácio, Oleg e Luís Mata).

André Silva acaba por ser o caso mais bem sucedido desde 2012, na medida em que cumpriu quatro dos cinco patamares que deveriam existir neste processo - a saber, 1) qualidade; 2) promoção; 3) rendimento; 4) êxito coletivo, que acabou por não existir, face à ausência de títulos; 5) transferência/valia financeira.

Mas serve isto como ponto de partida para uma análise diferente, um olhar sobre aquilo que tem sido o FC Porto B desde a sua criação, com particular incidência num mercado que é muito querido ao FC Porto: o Brasil. Desde que a equipa B foi recuperada, já foram recrutados diretamente 23 jogadores a clubes brasileiros. Poderíamos falar de africanos, sul-americanos, portugueses, mas para já vamos analisar apenas uma parcela: o mercado brasileiro com destino à equipa B. 23 jogadores, ou seja, um plantel inteiro. Desses 23 jogadores brasileiros contratados, conseguem adivinhar quantos chegaram a jogadores de equipa A?

...

Um. Otávio. Entre 23 jogadores contratados no Brasil, o FC Porto só acertou num: Otávio, que não foi propriamente um achado, pois já custou 7,5 milhões de euros por 68% do passe (foram cedidos posteriormente 0,5%) e era um jogador sobre o qual havia sentido desportivo em ser aposta. Já tinha  60 jogos de Brasileirão nas pernas e, embora a sua contratação não tivesse passado por um pedido/desejo da equipa técnica da altura, sabíamos que havia ali talento. Caro, mas material para se trabalhar, tanto que com outro treinador poderia até eventualmente ser logo acolhido na equipa A.

Passamos agora um olhar sobre os jogadores que foram contratados a clubes brasileiros nas respetivas épocas:

2012-13: Diogo Mateus, Víctor Luís, Anderson Santos, Guilherme Lopes, Sebá, Dellatorre;
2013-14: -
2014-15: Diego Carlos, Otávio, Roniel, Anderson Dim;
2015-16: Rodrigo Soares, Maurício, Wellington Nascimento, Ronan, Enrick Santos, Gleison;
2016-17: Inácio, Galeno;
2017-18: Luizão, Danúbio, Anderson Canhoto;
2018-19: Diego Landis, Emerson Souza. 

Pergunta: quantos destes jogadores estão, neste momento, a jogar numa I Liga europeia, em clubes minimamente conhecidos ou com presenças nas provas da UEFA? É certo que nem todos estão condenados ao insucesso (Galeno, por exemplo, começou agora a jogar com regularidade no Rio Ave), mas a maioria destes jogadores «desapareceu» do mapa depois de ter representado o FC Porto B.

Otávio contra a maré, à quinta época em Portugal
Otávio é, efetivamente, o único que ficou no plantel principal para ser opção, ao contrário por exemplo de Sebá, que teve um tempo de participação mínimo na equipa A. E o próprio Otávio não só foi uma contratação cara como vai para a quinta época em Portugal, ainda à procura da afirmação. 

Tomemos o exemplo da primeira «fornada». O jogador que mais se destacou, Sebá, acarretava custos completamente injustificados e em boa hora não ficou no FC Porto - está atualmente na China. Dellatorre, que passou a época como titular na posição 9, está agora no APOEL, após ter jogado na Tailândia. Víctor Luís regressou ao Brasil e por lá continua, tendo evoluído ao serviço de Botafogo e Palmeiras. E o que é feito de Diogo Mateus, Anderson Santos e Guilherme Lopes?

O pioneiro de uma saga pouco proveitosa
Anderson Santos, desde que regressou ao Brasil, já esteve dois anos sem clube e está atualmente ao serviço do São Mateus, clube dos escalões inferiores. Diogo Mateus pertence ao Ferroviária, da Série D. E Guilherme Lopes... acabou a carreira. Estamos a falar de um jogador que, ao longo da sua estadia no FC Porto B, jogou o total de... um minuto na II Liga. Um minuto. Regressou ao Brasil e terminou a carreira aos 24 anos.

Mas não foi o único que passa de bom o suficiente para merecer um lugar no FC Porto para tão mau que tem que deixar o futebol. Enrick Santos, contratado em 2015, jogou apenas 23 minutos, na última jornada da época. Na época seguinte não arranjou clube e deixou o futebol aos... 20 anos. Há vidas piores: passam um ano a treinar no FC Porto, com tudo pago, jogam um ou dois jogos e voltam ao Brasil. Não deve haver programas de Erasmus melhores.

Vejamos Anderson Dim, contratado em 2015. Na época seguinte foi logo cedido ao Freamunde. E correu tão bem que ficou sem clube até 2018, ano em que foi contratado pelo Coimbra Esporte Clube. Nada mais, nada menos que o clube ao qual Otávio foi «contratado» e que é controlado pelo bem conhecido BMG. Um talento incompreendido, por certo. Igual exemplo foi o Anderson Canhoto, na época passada. Jogou 20 minutos em toda a época, voltou ao Brasil e está agora no quarto escalão. Ou Ronan, que chegou, jogou dois jogos e está agora no estimável Nova Iguaçu.

É certo que nenhum clube acerta em todas as contratações. O Real Madrid também não vai buscar todos os jogadores ao Castilla, e o Barcelona não dá oportunidades a tudo o que sai de La Masia. Mas isto não é apenas o olhar a dois ou três negócios que correram mal: são 23 jogadores contratados, sete anos de trabalho de scouting/prospeção (?) e dos quais só se aproveita, até hoje, um jogador para a equipa A.

Mas afinal, quem são os responsáveis por tanta importação de jogadores de qualidade duvidosa oriundos do Brasil? Não estamos a falar de jogadores que possamos dizer «olha, tinha talento, mas não se adaptou». Estamos a falar de rapaziada que regressa ao Brasil pela porta pequena, para jogar nos escalões inferiores, e que termina a carreira aos 20s. 

Em Abril de 2016, Pinto da Costa anunciou que estava a dividir a estrutura em seis setores. Passando a citar o presidente do FC Porto: 

«De acordo com os estatutos que foram discutidos e aprovados em Assembleia Geral, e em que eu não interferi em nada, foi decidido que os 14 vice-presidentes passavam a seis e os dez diretores passavam a seis. Nesse sentido, dividi o clube em seis setores: o financeiro, do qual será responsável o dr. Fernando Gomes; o jurídico, que estará a cargo do dr. Adelino Caldeira; o futebol de formação será da responsabilidade do sr. Antero Henrique; o Património será da competência do eng.º Eduardo Valente; as casas, filais e delegações serão da competência do sr. Alípio Jorge. E introduzi um novo setor, que é o do planeamento dos novos projetos e do qual será responsável o professor Emídio Gomes, presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento da Região Norte.»

Portanto, seis setores com intervenção da cúpula da SAD: financeiro, jurídico, formação, património, casas/filiais e novos projetos. Alguém notou a falta de alguma coisa? Prospeção? Contratações? Era sabido que Antero Henrique tinha sido designado o responsável pelo «futebol de formação». Entretanto veio Luís Gonçalves, para ocupar o cargo de Antero, mas sem nunca ter sido especificado/esclarecido se assumiria também todo o controlo da formação. 

Nota: Chidozie é o único jogador do plantel campeão da II Liga que está na equipa A
Então, até quando o próprio FC Porto colocará a si próprio a questão: todo este investimento na equipa B e, em concreto, no mercado brasileiro, valeu a pena? Quem está a identificar estes craques incompreendidos? Como são observados jogadores que, em alguns casos, nem jogam no Brasil? 

E a verdade é que, ao observar estes 23 jogadores, podem observar um padrão um tanto dominante que envolve muitas vezes as mesmas entidades. Começamos pelo Algarve. A SAD do Portimonense tem como accionista maioritário Teodoro Fonseca, que saltou para a ribalta como empresário de Hulk e que enriqueceu/cresceu às custas da proximidade com o FC Porto.

Ora, Maurício, Gleison e Inácio são exemplos de jogadores que chegaram ao FC Porto por via do Portimonense, clube com quem o FC Porto fez o negócio mais estranho do defeso: a compra e consequente dispensa de Ewerton, de volta ao ponto de partida. Ewerton, curiosamente, chegou a Portugal após ter deixado o Desportivo Brasil

O Desportivo Brasil foi fundado pela Traffic, empresa que ficou conhecida em Portugal quando assumiu o controlo do Estoril, e em 2014 foi comprada pelo grupo chinês Luneng. Este mesmo clube foi a porta de entrada de Dellatorre ou Diego Carlos para o futebol português e também serviu o propósito de «armazenar» jogadores até transferi-los para a Europa.

E neste Campeonato, ninguém bate o Grêmio Anápolis, um clube controlado pelo empresário António Teixeira (sim, esse), dono da Promosport e que todos os anos distribui vários jogadores do clube brasileiro por equipas portuguesas. Roniel, Wellington (que nem chegou a jogar pelo FC Porto - foi logo cedido ao Leixões), Rodrigo Soares, Galeno e Danúbio (o nome mais sugestivo da história do futebol) chegaram ao FC Porto através do referido clube. 

No último verão, foi a vez de Diego Landis e Emerson Souza assinarem pelo FC Porto. Landis é oriundo do já mencionado Desportivo Brasil, enquanto Emerson jogou um total de 109 minutos de futebol em 2018. Esteve em Israel, ingressou no Rio Branco de Venda Nova e estava sem jogar praticamente desde o início do ano.

Chegou ao FC Porto B como um ilustre desconhecido e já recebeu guia de marcha, tendo sido emprestado ao Fafe. Como exatamente é que avaliaram um jogador que não jogava, fica a questão, mas o site brasileiro Tribuna Online tem uma versão: «O caminho dele até Portugal começou na Copa São Paulo de Futebol Júnior de 2017, quando atuou pelo Nacional/SP e foi descoberto pelos empresários portugueses Pedro Silva e Jorge Boas, que prepararam um DVD com lances do jogador.» OK. Não jogou em 2018, mas tem um DVD com os lances de 2017. Bem dizem que a qualidade não tem prazo de validade.

Emerson, o 23º brasileiro na equipa B, chegou, viu e já saiu
Mas o que mais há a destacar de Emerson é a sua franca humildade e sinceridade. Estamos numa era em que todos os jogadores querem ganhar mais, procuram melhores condições financeiras e tentam sempre puxar o salário. Uma ambição normal, não só em qualquer futebolista como em qualquer trabalhador de qualquer área. Mas Emerson não. Emerson é um caso único, citando o próprio jogador:

«"Não esperava ganhar tão bem em tão pouco tempo. Todo mês eu ajudo minha família”, comentou o capixaba, que também elogia a estrutura do clube português: “Eles gostam muito de brasileiros e dão todo o suporte”». Ficamos com grande expetativa em acompanhar a evolução de Emerson, o jovem craque que não esperava ganhar tão bem em tão pouco tempo, e de vê-lo espalhar magia no Municipal de Fafe.

Até lá, sobra a questão: que género de scouting é este no mercado brasileiro que se limita a catálogos de três ou quatro clubes/empresários? Um país tão grande, um viveiro de talentos tão conhecidos, e vêm sempre pela mão dos mesmos? Em 23 contratações, ao longo de sete anos, só acertamos num jogador com vista à equipa A? Como é que há jogadores que têm qualidade para atravessarem o Atlântico e assinarem pelo FC Porto, mas logo a seguir nem clube conseguem arranjar e terminam a carreira? Brasileiros e talentos, sim, são bem vindos. Mas a via que os tem trazido e o proveito do passado recente não combinam com o futuro que todos (?) queremos para o FC Porto.

quinta-feira, 6 de setembro de 2018

Reforços ao custo possível

O encerramento do mercado de transferências trouxe duas novas e importantes opções para Sérgio Conceição: um que entra para já como alternativa a Alex Telles, outro que pode dar novas soluções para o meio-campo. Jorge e Bazoer chegam por empréstimo, com opção de compra no final da época, e constituem duas opções de qualidade, que mostram que era possível encontrar boas soluções de baixo custo (pelo menos no médio prazo), mesmo com as prioridades algo trocadas - Jorge só vem porque Zakarya chumbou nos exames médicos e Bazoer chega já depois de Ewerton ter entrado e saído. 

Começamos por Jorge, lateral-esquerdo. Há duas épocas, aos 20 anos, Jorge já era o melhor lateral-esquerdo do Brasileirão, tendo-se destacado ao serviço do Flamengo. Veio para a Europa pela mão de Deco, em parceria com Jorge Mendes, com destino ao AS Mónaco, que se sagrou campeão nessa época. Na temporada passada jogou com uma regularidade interessante, mas uma lesão em janeiro acabou por lhe tirar espaço na segunda metade da época.

Ao contrário do estereótipo comum de lateral brasileiro - melhor a atacar do que defender -, Jorge é um exemplo contrário, destacando-se sobretudo pela solidez defensiva. Na época passada, na Liga francesa, foi o 2º jogador com maior média de interceções por jogo e o oitavo com mais desarmes. Em termos ofensivos, até pela própria estratégia do AS Mónaco, Jorge sempre se revelou bem mais resguardado - embora não nos possamos esquecer que o próprio Alex Telles, aquando da sua chegada ao FC Porto, não era metade do jogador que é neste momento na vertente ofensiva da equipa.

Um «velho» referenciado, melhor a defender do que a atacar
Embora tenha chegado ao FC Porto perto do fecho do mercado, Jorge já é um nome conhecido no Dragão. Já estava referencido quando despontou no Brasil e, inclusive, chegou a ser proposto a título definitivo no início do defeso, mas a um preço incomportável - pediam 12 milhões de euros. Sem colocação, acabou por chegar ao FC Porto por empréstimo e tem um ano para mostrar serviço como alternativa a Alex Telles... e quiçá sucessor, pois no final da época Alex estará certamente na montra para a saída. 

Da mesma forma chegou Bazoer, uma contratação atípica no FC Porto. Não só o FC Porto não costuma apostar em jogadores holandeses (Bruno Martins Indi foi o único até hoje) como é muito raro e difícil contratar na Bundesliga. Mas Bazoer representa um perfil interessantíssimo para o meio-campo, uma vez que é igualmente capaz de encaixar no 4x4x2 e no 4x3x3.

Capaz de jogar a médio-defensivo ou na posição 8 (a ideal para ele neste momento - opinião), Bazoer foi um dos principais talentos a sair das escolas do PSV e do Ajax nos últimos anos e estreou-se na seleção da Holanda quando era ainda sub-19. É um bom distribuidor de jogo, que gosta de jogar em profundidade (como Sérgio Conceição tanto gosta que sirvam os avançados) e que joga com grande amplitude no meio-campo - na Bundesliga, o passe médio de Bazoer é de 19 metros, acima da média habitual de Herrera e Sérgio Oliveira (17 metros no FC Porto). Tem rotinas como médio-defensivo, mas é melhor a distribuir e a avançar do que a proteger meramente a retaguarda. 

Solução para todas as variantes da equipa
É certo que Bazoer não se adaptou da melhor forma à sempre difícil Liga alemã, mas num contexto de campeonato português pode revelar-se uma ótima solução para o meio-campo. Se, tal como Jorge, poderá ser uma opção a título definitivo para lá do fim da época, só o tempo o dirá. 

Certo é que os moldes das contratações de Jorge e Bazoer também acabam por se confirmar o que já se sabia: que não havia disponibilidade financeira imediata na SAD para reforçar o plantel no fecho do mercado. É sempre difícil de compreender como é que há dinheiro para o jogador A e não há para o jogador B, mesmo que a opção B custe menos, mas tem sido algo recorrente nos últimos anos. 

Por exemplo, o FC Porto teve avanços concretos por Daniele Verde e Roger Guedes, opções para o ataque. Mas acabou por não chegar nenhum jogador para a posição de extremo. Certamente que Sérgio Conceição não afirmou «quero o Verde, o Guedes ou então não quero ninguém». O FC Porto negociou estes alvos porque necessitava de soluções para o ataque, mas acabou por não as conseguir - mas lá está, pois não havia condições financeiras para investir, e o Relatório e Contas do primeiro semestre de 2018-19 poderá confirmar que as contas vão ao encontro dos limites traçados pela UEFA e que não havia margem para muito mais. 

O FC Porto também tentou Bissouma e Ntcham, médios na casa dos 10 milhões de euros, mas acabou por ficar com Bazoer. Já a posição de lateral-esquerdo foi sempre sendo secundarizada até perto do fecho do mercado, a ponto de ficarem convencidos com 90 minutos de um lateral de 29 anos recém-contratado pelo Belenenses. 

As continuidades de Herrera e Brahimi, mesmo em final de contrato e com poucas perspetivas de renovação de contrato, acabam também por ser contraproducentes àquilo que eram os planos anteriormente traçados pela SAD. Por exemplo, em outubro de 2018, a SAD terá que pagar 12 milhões de euros ao Novo Banco por um empréstimo que tinha como garantias os passes precisamente de Herrera e Brahimi. A saída do mexicano ou do argelino poderiam gerar uma verba que seria canalizada para o reembolso deste empréstimo, mas ambos continuaram no Dragão, pelo que a SAD terá que gerar receitas por outra via. Mas outubro será mês da SAD publicar o Relatório e Contas de 2017-18 e a proposta de orçamento para a próxima época, oportunidade para uma visão bem mais detalhada e completa sobre o presente e futuro do FC Porto. 

Até lá, boas-vindas a Jorge e Bazoer e oxalá todos estejam a suspirar pela sua continuidade a título definitivo no final da época.

segunda-feira, 3 de setembro de 2018

Três pontos e Danilo

O FC Porto iniciou a corrida atrás do prejuízo causado pela 3.ª jornada da única forma possível: com uma vitória, embora muito pouco convidativa a uma Enologia de qualidade. Olhamos para os 13 golos marcados em 4 jornadas e vemos que o FC Porto não fazia tantos golos desde 1951, embora esta época com a vantagem da calendarização pouco habitual que ditou dois jogos consecutivos no Dragão. 


Mas o momento em que vemos a «roda» formar-se na segunda parte, mesmo com a equipa a vencer por 2x0, é demonstrativa de que a equipa sabia que havia muito mais a merecer a preocupação do que o resultado. Na segunda parte, o que aconteceu não foi muito diferente daquilo que antecedeu os golos de Vitória de Guimarães ou Belenenses: a equipa deixou de ter bola, deixou de controlar o jogo e perdeu soluções na saída para o ataque. O Moreirense não aproveitou, também porque Iker não deixou, mas é a terceira jornada consecutiva em que o FC Porto se coloca a jeito quando a vantagem e a sua superioridade já deveriam deixar a vitória encaminhada.

Valeu, sobretudo, o regresso às vitórias e o de Danilo Pereira, elemento essencial para o ciclo de jogos que se iniciará depois da pausa para as seleções. 




Iker Casillas (+) - Terminou o jogo com mais defesas do que o guarda-redes do Moreirense: três. Com um par de boas intervenções na segunda parte, segurou a vantagem do FC Porto e evitou que o fantasma das jornadas anteriores voltasse a assombrar a equipa (o bom trabalho de Felipe, em estreia com Éder Militão como parceiro, também ajudou). Bem, também, na reposição da bola em campo, sendo neste momento o guarda-redes da Liga com melhor aproveitamento neste capítulo.

Héctor Herrera (+) - Mais uma exibição a encher o campo e a ter que jogar por ele e por Sérgio Oliveira (novamente muito distante do nível exigível para o 11). Inaugurou o marcador num lance oportuno, esteve perto de bisar e assumiu-se sempre como o motor do meio-campo, destacando-se ainda o momento em que puxa da braçadeira para dar um abanão à equipa na segunda parte. Sempre disponível no processo defensivo e a ganhar metros no meio-campo.

As zonas de ação de Héctor Herrera
Otávio (+) - Esteve no lance do 2x0 (muito bem trabalhado por Marega, a ganhar a primeira bola de Casillas, e Aboubakar, no toque para Otávio e na corrida para a grande área), e abriu o livro no último lance da segunda parte, ao ultrapassar dois jogadores antes de servir Marega para o 3x0. Foram os pontos altos de uma exibição na qual Otávio tentou sempre «mostrar-se» ao jogo: foi o jogador que mais duelos disputou (16) e o que mais desarmes conseguiu (4). Pecou pela ausência de tentativas de remate e por algumas más decisões no último terço, mas esta época já teve intervenção direta em quatro golos na I Liga. Em toda a época passada, teve apenas três.




Apanha! (-) - Posse de bola. Bicada para a frente. Posse de bola. Bicada para a frente. Posse de bola. Bicada para a frente. Aconteceu, na segunda parte, aquilo que tanto queremos que o FC Porto evite ao máximo. A determinada altura, parecia que a equipa não sabia o que fazer. Cada posse de bola era uma tentativa de passe longo para Marega. Não houve jogo interior, não houve progressão em posse. A equipa percebeu que não estava bem, Sérgio Conceição reforçou o meio-campo, mas não há necessidade absolutamente nenhuma de jogar assim, até porque raramente o FC Porto consegue criar real perigo quando joga desta forma.

O FC Porto já é a equipa com mais foras-de-jogo no Campeonato, 13 em quatro jornadas. Que indica isto? Que está a tentar forçar muito a entrada na linha defensiva com o último passe, mas também que as defesas adversárias estão a saber «apanhar» o FC Porto nesta armadilha. O regresso de Marega ao 11 coincidiu com um abuso desta fórmula (ou melhor, motivou), que certamente terá o momento de (ter que) ser utilizada ao longo da época. Mas em casa? Contra o Moreirense? A ganhar por 2x0? Quando acabamos um jogo com mais foras-de-jogo do que remates enquadrados com a baliza adversária...

Há também um dado deveras curioso. Pensar em Alex Telles e Brahimi é pensar num flanco ofensivo, criativo, capaz de fabricar diversas ocasiões de golo, certo? Mas estatisticamente, o FC Porto é neste momento a equipa que menos usa o flanco esquerdo para atacar em todo o Campeonato. Nas primeiras quatro jornadas, o FC Porto canalizou apenas 31% dos seus ataques por esse corredor. Em contrapartida, é a equipa que mais usa o direito, com 43% de investidas por esse lado. Já vimos bons momentos e combinações por esse lado nesta época, em particular com Maxi e Otávio, mas isto muito se deve à quantidade de vezes que despejaram a bola pelo lado direito à procura da profundidade. 

E o mais irónico é que, uma vez mais, vemos que o FC Porto não precisa de passes de 40 metros para colocar um elemento nas costas da defesa. O lance do 2x0 é um exemplo: Otávio, com um passe curto e na linha da marca de grande penalidade, conseguiu colocar Marega nas costas da defesa. Não é preciso balões e corridas a partir da linha de meio-campo: só é preciso saber decidir e encontrar o espaço certo no último terço.

Sérgio Conceição sabe isso. A equipa sabe isso e, mais importante, sabe fazê-lo. Então, basta fazer. E repetir.