Depois da ausência de contas no primeiro trimestre, a SAD, seguindo a data limite imposta pela CMVM, deu a conhecer os primeiros detalhes do desenrolar da época financeira 2016-17. O R&C do primeiro semestre compreende todas as operações da SAD efetuadas entre 1 de julho e 31 de dezembro de 2016 (exclui portanto o fim do pagamento do Estádio do Dragão e todas as operações do mercado de inverno). Passemos então à análise, tendo sempre presente aquilo que é previsto no orçamento desta época.
A SAD chegou ao final dos seis primeiros meses da época com 29,58M€ de prejuízo. Está orçamentado um resultado positivo de 2,7M€ no final da temporada. O prejuízo é explicado por a SAD ainda não ter gerado qualquer mais-valia com transferências de jogadores no período em análise.
É de recordar que a SAD, no orçamento, definiu a necessidade de «Proveitos com transações de passes de jogadores» no valor de 115,781 milhões de euros (para fazer face a custos de 47,2M€). Tendo em conta que a alínea das alienações de passes ficou em branco no primeiro trimestre, isso já deixa claro sobre o que será necessário até ao final de junho. Mas quem afirmou sem rodeios que recusou uma proposta de 30M€ por Héctor Herrera não há-de ter problema nenhum em fazer essas vendas antes do final de junho. Pois não?
Os proveitos operacionais atingiram os 58,76M€ nos primeiros seis meses. Todas as rubricas estão relativamente dentro do previsto - na Liga dos Campeões o FC Porto já atingiu os seus objetivos, e mesmo que seja afastado pela Juventus vai atingir os previstos 30M€ em receitas da UEFA. Há a assinalar que a SAD conseguiu, até ao momento, 42,9% das receitas de publicidade previstas, por isso a receita terá que aumentar significativamente no que resta da temporada.
Proveitos do primeiro semestre 2016-17 |
Em relação aos custos, destaque para o facto de o plantel desta época ser mais caro do que o da temporada passada, pelo menos nos primeiros 6 meses da temporada. Os custos com pessoal foram de 38,90M€ até ao final de dezembro, sensivelmente mais 2M€ do que na época passada. Os custos aumentaram nas seis alíneas especificadas no ponto 19, desde os órgãos sociais aos seguros.
Este valor não vai propriamente ao encontro do que estava previsto no orçamento, que eram custos com pessoal de 69,51M€. Se os custos dobrassem no segundo semestre, isso resultaria em gastos de 77,8M€, muito acima do que estava orçamentado. Com os ajustes no mercado de inverno, veremos se esta rubrica será cumprida. Quanto aos restantes custos operacionais, tudo dentro da expetativa e do que estava orçamentado.
Custos operacionais do primeiro semestre 2016-17 |
Nos resultados operacionais sem transferências de jogadores, o prejuízo é de 4,96M€, bem inferior aos 19,64M€ do primeiro semestre de 2015-16. A diferença está essencialmente nas receitas da UEFA.
Chegamos então ao capital próprio e a um dos focos mais negativos deste R&C: todos os efeitos gerados pela operação Euroantas, de incorporação do Estádio do Dragão na SAD, já se esfumaram. A SAD voltou a apresentar capitais próprios negativos, de 3,449M€. Há dois anos, depois da operação Euroantas, os capitais próprios eram de 56,6M€. E no final da temporada 2014-15, chegaram aos 83,1M€, um valor excelente. Neste momento, a SAD, com capitais próprios negativos, volta a pairar numa situação de falência técnica, o que infelizmente mostra que a operação Euroantas não foi mais do que aquilo que se temia na altura - um empurrar de problemas com a barriga. Uma situação que terá que ser retificada não só até ao final de junho, como nos exercícios seguintes.
O ativo mantém-se praticamente inalterado face há um ano, no valor de 374M€. A principal alteração está nos ativos correntes, agora situados em 97,7M€. E chegamos a outro problema: à subida abrupta do passivo, que está a chegar a números preocupantes.
O passivo estava, no final de dezembro, fixado em 377,5M€. No final da época 2012-13, a última em que o FC Porto foi campeão nacional, o passivo era de 220 milhões de euros. Ou seja, o passivo aumentou 71% desde a última conquista de um campeonato. Em 2010, por exemplo, o passivo era de apenas 160M€. Estamos a falar de um aumento de mais do dobro desde que se iniciou a dourada época de 2010-11, em que o FC Porto começou a gerar vendas milionárias como nunca, de Hulk a Falcao, de Mangala a James, etc. Resultado? Mais do dobro do passivo.
O passivo, dirão alguns, não se paga, gere-se. Sim, até ao dia. O presidente Pinto da Costa afirmou, em 2013, que «quem vier a seguir basta não estragar». Desde essa afirmação o passivo da SAD aumentou mais de 150 milhões de euros. E desde esse ano, nem um título para amostra.
Quanto às aquisições, o FC Porto gastou 47,47M€, com comissões de 4,2M€, em seis jogadores: Óliver, Alex Telles, Boly, Depoitre, Otávio e Govea.
Óliver começa por ser uma surpresa. Primeiro, por os 20M€ corresponderem a apenas 85% do passe. Segundo, por a SAD já ter incluído a compra de Óliver nas contas do primeiro semestre, indicando que o seu passe foi comprado em setembro. Um tanto confuso, tendo em conta que só anunciaram a sua compra a 9 de fevereiro. Boly e Alex Telles custaram 6,5M€ cada por 100% do passe, enquanto Depoitre custou 6M€ por 90%, valores já esperados.
O caso de Otávio também é uma surpresa, com a SAD a ter comprado mais 20% do seu passe por 2,257M€. A SAD já tinha a opção de comprar mais 20% à GE Assessoria Esportiva e 15% do pai de Otávio. A soma destes 35%, no acordo oficial, custariam mais 5M€ ao FC Porto. Para já, a SAD passa a ter 52,5% de Otávio. Destaque também para a compra de Govea, por 2M€ ao América, pela totalidade do passe. Uma compra que obriga a que Govea seja pelo menos incluído nos trabalhos de pré-temporada da equipa principal para 2017-18. Govea tem revelado valor acima da média na equipa B, apesar da má época que está a ser feita pela equipa na Segunda Liga.
Uma vez mais, a SAD declara mais do que uma entidade por jogador (pelo menos entre os que são declarados neste R&C) na hora do pagamento de serviços de intermediação. Voltaremos a eles numa análise futura, mas assinale-se já a curiosidade de a Energy Soccer receber 244 mil euros de comissão pelo empréstimo de Aboubakar ao Besiktas. Uma vez mais, a Energy Soccer aparece como intermediária de um jogador que não representa.
A SAD tem a receber pouco mais de 40M€ de outros clubes por venda de jogadores, dos quais apenas 8M€ do São Paulo (sem surpresa) não são uma verba corrente. É possível ver dívidas de 190 mil euros do Villarreal (por Adrián), 250 mil do Trabzonspor (por Suk) e 600 mil do Espanyol (por Reyes), mas mantém-se a curiosidade em torno da Doyen: mantém-se uma dívida de 2,788M€, pela alienação do passe de Brahimi. Por norma, a alienação de passes permite assegurar receitas para o curto prazo; neste caso, alienou-se o passe de Brahimi à Doyen para nada, pois a SAD não tinha tocado neste 2,788M€ até ao final de dezembro (importa no entanto lembrar que a dívida ao Granada, ex-clube de Brahimi, também se mantém nos 3,332M€ - o que não será de todo uma coincidência).
Por outro lado, a SAD tem ainda a pagar mais de 75M€ a outros clubes/entidades por jogadores já presentes no plantel, dos quais 52M€ no prazo de um ano. É possível desde já constatar que a SAD terá a pagar 5M€ ao Atlético de Madrid até dezembro de 2017. Tendo em conta que, tecnicamente, o contrato de Óliver com a SAD só seria efetivado a partir de 1 de janeiro de 2018... Confuso. A situação dos restantes Fornecedores será merecedora de uma análise mais detalhada futuramente.
Em relação à situação bancária, a SAD abriu cinco novos contratos de factoring entre outubro e dezembro, que superam os 35 milhões de euros e apenas um será liquidado ainda na corrente época - 6M€ ao já bem conhecido Bankhaus Bodensee. E o reembolso será, precisamente, a verba a receber da UEFA pela eliminatória contra a Juventus, uma prática já muito recorrente na gestão da SAD, de tentar antecipar o máximo de receitas possível - e com isso nunca tirar o máximo de proveito das mesmas, na medida em que há sempre juros a pagar.
Mas além do Bankhaus, a SAD fechou um empréstimo de 6M€ com o Novo Banco e um de 18,578M€ com o Ectonian AG, este último com termo em 2019. E é aqui que entram as maiores preocupações. Em ambos os casos, a liquidação está prevista com o dinheiro dos direitos televisivos: a PPTV no caso do Novo Banco, dentro de seis meses, e o maior contrato de factoring já através da Altice, com o dinheiro de «épocas futuras», diz a SAD.
E no que toca ao adiantamento de receitas, o maior destaque neste R&C é este:
O contrato com a Altice, pelos direitos televisivos e de exploração, só tem início a 1 de julho de 2018. Mas a SAD já dá conta de um adiantamento bastante significativo. Estamos a falar do recurso a 12,5% do valor total do contrato com a Altice um ano e meio antes do mesmo entrar em vigor.
Fernando Gomes chegou a afirmar que o contrato com a Altice/PT ia permitir «gerir o FC Porto de maneira diferente». Pois. Diferente é a palavra, mas não para melhor.
O FC Porto "parou" no tempo...desportivamente...e no resto. E as duas coisas estão intimamente ligadas - Se não começarmos a ganhar novamente, estamos lixados. Além das receitas de jogadores, que receitas e investimento conseguiremos atrair para darmos um pulo qualitativo. Não sei se os outros andam depressa (duvido...), mas nós parece que estagnamos.
ResponderEliminarOu seja, a SAD precisa de dinheiro como de pão para a boca (a SAD também come, sim). Temos de ser campeões e vender metade da equipa.
ResponderEliminarO valor total de 57 M da Altice, é pelos direitos de tv de um ano certo TdD ? Por ano vamos receber mais de 50 M pelos direitos de tv, a partir de 2018 ? Isso é muito dinheiro. Com uma gestão com cabeça e baseada na prospecção, sem jogadores a ganhar salários proibitivos, o caminho seria hoje em dia bem mais fácil do que quando tínhamos receitas de terceiro mundo. Problemas de novo rico é o que é.
ResponderEliminarFui googlar a Ecotonian AG para saber o que era porque se trata de um montante bastante elevado!
ResponderEliminarNa Financial Market Supervisory Authority - FINMA - não aparece portanto não é um banco...
Our focus is advise and development of innovative concepts and approaches for business opportunities and finance in sports and entertainment.
o que quer isto dizer?
Luis Pinheiro.
Se nada mudar e terá que mudar radicalmente estamos indo rapidamente em direção ao abismo.
ResponderEliminarCuriosidades várias que me chamaram a atenção:
ResponderEliminarPágina 57: "Por forma a reduzir a sua exposição à volatilidade das taxas de juro, o Grupo contrata “swaps” de taxa de juro." - Também se brinca aos ricos por aqui.
O valor a pagar pelos empréstimos obrigacionistas já vai nos 80 milhões de euros, sendo que (se percebi bem) quase 50 milhões vencem na próxima época.
Por um lado temos empréstimos a juros loucos ("A taxa média anual dos empréstimos bancários e obrigacionistas à data de 31 de dezembro de
2016 é de 6,04 %"), por outro lado pagamos adiantadamente o final de um empréstimo cuja taxa de juro rondava 4%.
Quase não me admirava se o nosso ex "boy" do PS tivesse feito isto para poder agora hipotecar o estádio ou começar a apresentá-lo como garantia nos empréstimos bancários..
Está muita gente assustada com os adiantamentos mas isso é só a consequencia.
ResponderEliminarO problema é a causa.
A causa é que a actividade é altamente deficitaria ou seja a receita não cobre o custo.
Neste momento o custo da actividade é quase 50% superior á receita.Obviamente que gera defices que o clube tende a colmatar com receita extraordinaria.
Mas como a receita extraordinaria(transferencias)normalmente não são recebidas a pronto, há sempre necessidades de tesouraria(salarios, pagamentos a fornecedores) que tem de ser colmatadas.
Solução:pedir emprestimos ou adiantamentos.
Basicamente em termos estruturais actualmente tudo funciona mal.
O FCP tá em vias de bater record de custos com pessoal(tudo indica que baterá os 78 milhoes)quando sustentavelmente os custos com pessoal deveriam estar nos 55 milhoes.
Temos 170 milhoes de eur em emprestimos com juro medio de 6%...
É uma gestão incomportavel
Preocupante! Incrível como se desmantelou uma equipa ganhadora e resultados financeiros aceitáveis em.apenas 5/6 anos...
ResponderEliminarQuo vadis FC Porto
enfim no comments nao sou economista
ResponderEliminarSe a Autoridade da Concorrência anular os contratos, como vai ser?
ResponderEliminarPresumo que a SAD teria de apresentar novas garantias baseadas num contrato muito mais curto, o que seria catastrófico.
Chama-se a isto brincar com o fogo.
Começo por dizer que a nível técnico, sou um zero à esquerda na burocracia da feitura dos R&C. Aquilo que sei é que a TAP, PT, On Going, BPN, BES... também faziam R&C bem feitos e foi o que se sabe.
ResponderEliminarPara mim R&C são apenas um emaranhado de teias de aranha, túneis e escapatórias para driblar a realidade do dia a dia, da gaveta vazia.
Os 57 Milhões da Altice são um apêndice, um extra, pois na realidade o Contrato verdadeiro seria de 400 Milhões. Logo no Big Deal. E é obvio que a nível legal, cada contrato com a Altice/PT/MEO terá a duração de 3 anos, assim manda a lei.
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O que eu queria no entanto dizer, voltando ao tema dos R&C muito bem feitos, esgalhados no papel, em teoria é o seguinte:
O nosso rival, que está 10 anos adiantado, à nossa frente nesta matéria (manipulação de contas) usa alguns subterfúgios, trapaças que o FCP não utiliza. Desde logo a venda e compra em Bitcoins, Pizzis, Pilins e Mendilhões que como se sabe são moedas com valor facial virtual. E até se dão ao luxo de já estar a prevenir, antecipar o R&C das Contas anuais de 30 Junho..
""De realçar que este resultado foi obtido num período em que não ocorreram alienações de direitos de atletas de valor significativo,
dado que as transferências dos jogadores Gonçalo Guedes e Hélder Costa, que ascenderam a um montante global de 45 milhões de euros e que irão representar um impacto positivo em resultados próximo dos 38,9 milhões de euros, ocorreram após 31 de Dezembro de 2016, pelo que não se encontram reflectidas no resultado deste semestre."
Ou seja, estão mesmo 10 anos à nossa frente, pois já têm o R&C Anual de 2017 fechado :-)
E reparem bem como se faz um R&C a dar positivo....
Em Resultados, Proveitos Operacionais inventam-se receitas de 'Outros' na ordem de 6 Milhões nos resultados operacionais, ou seja, 10 vezes mais que o FCP faz !!
E depois empola-se, exagera-se no valor dos 'Activos INTANGÍVEIS' na ordem de 80 Milhões. É óbvio que se o FCP fizesse igual... de certeza que já não dava 29 Milhões negativo :-)
Ou então, dizer que só pagou 16,7 milhões pelo Rafa e depois noutra alínea á parte fala em 4 milhões para o Braga e 1 Milhão para a OnSocccer!!
E também gostei daquela dos 6,3 milhões do Sidney a receber do Dep. Corunha.. que nunca na vida irá receber ou a dos apenas 3,4 milhões relativos a 25% de mais valias do André Gomes da venda do Valência para o Barcelona, quando o Barça pagou 35 Milhões por ele!!
Claro que assim é fácil os R&C darem positivo.
Enfim, se o Fisco deixou passar 10.000 Milhões para o Panama só em 4 anos.. ao todo foram 30 Mil Milhões em 15 anos... e se os R&C da PT, da On Going, do BPN, do BES também eram bem feitos, qual a dúvida de que alguns clubes de futebol não fazem o mesmo?!