terça-feira, 9 de agosto de 2016

Quanto tempo esperou Nuno por Depoitre?

Voltemos até 2006. Co Adriaanse queria Jan Vennegoor of Hesselink. O chamado «pinheiro». Pediu-o uma, duas, três vezes. Queria-o tanto que ameaçou bater com a porta. Pinto da Costa disse que não, uma, duas, três vezes. Porque era caro, porque (citando) não podia «hipotecar as contas por este ou aquele jogador», e que «se fosse para tirar os pés do chão iríamos buscar o Deco ou o Ricardo Carvalho». Ou seja, o equivalente a ir buscar o Boly por 6M€, ou o Rafa por 20M€. Se fosse para perder a cabeça, não iria por aí.

Marc Janko Laurent Depoitre
Co Adriaanse não teve o seu pinheiro e depois acabou por sair. E depois dele sair, o futuro deu razão a Pinto da Costa. Hesselink assinou pelo Celtic no mesmo ano e marcou apenas três golos, apesar de ter tido problemas físicos. E desde então, nunca mais se revelou goleador. E de 2006 em diante, o FC Porto foi tricampeão e ninguém sentiu a falta do pinheiro.

Dez anos depois, Nuno teve o que Co Adriaanse não teve. Pediu um pinheiro e teve-o, apesar do desconhecimento total de Pinto da Costa em relação a Laurent Depoitre. Mas importa colocar desde já a questão: quanto tempo esperou Nuno por este pinheiro?

Desde o início da pré-época, Nuno Espírito Santo tem apostado num esquema que dispensa por completo o pinheiro. Ao ponta-de-lança, no caso André Silva, é pedida maior mobilidade, que descaia muitas vezes para os flancos, que tenha capacidade para levar a bola e encaixar numa transição rápida, seja com bola no espaço ou no pé. Depoitre não corresponde, de todo, a estas caraterísticas.

Depoitre encaixa num esquema que não foi trabalhado pelo FC Porto nos jogos de pré-época. Falta saber porquê. Nuno só se lembrou agora que quer ter soluções numa dinâmica diferente, que implique o tal tanque perto da grande área, ou está desde o início da pré-época à espera que lhe deem esse pinheiro? E Depoitre acaba por ir direto à lista de inscritos da UEFA, sem treinar, empurrando para fora da lista Aboubakar (se sair, o FC Porto necessita de um terceiro avançado - Gonçalo Paciência seria uma boa e pertinente aposta, a nível desportivo e financeiro), que fez toda a pré-época. Tudo soa a má preparação/gestão, ou pelo menos bem tardia. 

Experimentar um esquema com um homem de área, um ponta-de-lança mais fixo, quiçá até enquadrando André Silva para um 4x4x2, deveria ter sido algo preparado desde o início da pré-época. Neste caso, o pinheiro só chega depois de terminada a pré-época - a mesma pré-época que supostamente teria sido iniciada em abril.

Felizmente, numa coincidência tremenda, Luciano D'Onofrio apareceu para - citando o presidente - desbloquear o negócio. Foi uma sorte Nuno Espírito Santo querer um ponta-de-lança que estivesse no raio de ação de D'Onofrio, que todos os defesos vai fazendo negócios com o FC Porto. Salutar coincidência. 

Antes de falar do jogador, podemos já notar um dos padrões deste defeso. João Carlos Teixeira, Felipe e Depoitre foram todos apresentados ao lado de Pinto da Costa. Zé Manuel (para todos os efeitos uma contratação neste defeso) e Alex Telles não. Mas João Carlos, Felipe e Depoitre têm todos algo em comum: Pinto da Costa diz que foram todos contratados mediante a preferência de Nuno Espírito Santo.

Sobre João Carlos, Pinto da Costa disse que foi um dos nomes pedidos por Nuno na primeira reunião de preparação para esta época. Sobre Filipe, disse que Nuno estava sempre a telefonar para saber quando chegava. E agora, sobre Depoitre, diz que nem conhecia o jogador, mas que era um pedido de Nuno. Por outras palavras, se correr bem, Nuno Espírito Santo recolhe o mérito, por ter olho para o jogador; se correr mal, Pinto da Costa já responsabilizou o treinador pelas escolhas. É uma abordagem bem diferente da feita com Lopetegui, na qual Pinto da Costa só falou do subrendimento de Imbula ou Campaña depois de Lopetegui sair. Neste caso, já todos ficam a saber que são pedidos de Nuno Espírito Santo. Qual Mateus 27:24-25.

Pinto da Costa também mostra uma postura diferente da sua última entrevista. «Contratei jogadores que não conhecia, só por causa do parecer dele», disse, sobre Lopetegui, dando depois do exemplo de Campaña e garantindo que não voltaria a contratar jogadores sem os conhecer. Neste caso, assumiu sem rodeios o contrário em relação a Depoitre. 

E agora aí temos Depoitre. E não vale de muito aprofundar a análise individual sobre Depoitre. Pois é simples: será tão útil quanto o caudal ofensivo do FC Porto e as bolas que lhe derem na grande área. Depoitre é um jogador limitado tecnicamente, que está na grande área para finalizar, para servir de referência, para arrastar os centrais. Não pode fazer quase nada do que André Silva fez na pré-época, embora não seja tão lento quanto a sua estampa física possa sugerir. O rendimento de Depoitre vai depender da dinâmica do FC Porto, e de uma abordagem totalmente diferente da que foi feita na pré-época. A partir daí pode dar um Vinha, pode dar um Tiago Caeiro, pode dar um Graziano Pellè.

O FC Porto não revelou o custo de Depoitre. Desmentir os 12M€ que a RTBF, a RTP lá do sítio, avançou já seria um bom começo (embora possa enquadrar-se no tão patético que nem merece resposta). Já os valores noticiados em Portugal, 4+2,5 milhões de euros, também parecem francamente elevados. O FC Porto é o primeiro clube a pagar alguma coisa por Depoitre, que nunca foi dado como hipótese concreta para outro clube, tirando os habituais rumores da imprensa inglesa (falaram em Stoke, WBA e Tottenham no início do ano, mas nada durante a pré-época), que quase nunca podem ser levados a sério.

O percurso de Depoitre
Senão vejamos. Do top 10 da liga belga, Depoitre foi o que de mais tempo precisou para marcar, com um golo a cada 207 minutos. Considerando todos os avançados que chegaram à dezena de golos, Depoitre teve mesmo a segunda pior média na relação minuto/golo (pior só Zinho Gano, outro pinheiro).

Depoitre fez a sua melhor época em 2014-15, quando foi essencial para que o Gent conquistasse o primeiro título da sua história. Na altura, o Transfermarkt, o site que muitos usaram para o avaliar em 6,5M€, avaliava-o em 2,5M€. Esta época, Depoitre fez 14 golos na liga belga e um na Champions. Foi isso que justificou que o seu passe valha agora três vezes mais? Certamente que não. Terá sido o único jogo que fez pela Bélgica? Improvável, pois o valor de Licá também não triplicou quando fez o seu único jogo por Portugal. É de facto intrigante avaliar Depoitre em 6,5M€, tendo em conta que o Gent nunca vendeu um jogador por tanto dinheiro.

A valorização de Depoitre, Transfermarkt
Quem não se lembra de Vossen, avançado belga que chegou a ser uma paixão de pré-época de adeptos do FC Porto? Vossen, em três épocas no Genk, fez 78 golos. O dobro dos que Depoitre marcou nos últimos 3 anos. Mais barato, mais experiente, mais qualidade, e que talvez seria mais útil ao FC Porto do que Depoitre. É certo que nenhuma estatística vai abonar a favor de Depoitre, que teve números modestos no Gent e começou a carreira profissional já tarde. Janko, por exemplo, tinha muito mais serviço mostrado e custou 3M€ no mercado de inverno (quando os preços estão mais inflacionados) de 2012 ao FC Porto. E teve logo colocação no fim da época, após ter ajudado a chegar ao título.

André Silva é um jogador que pode envolver-se na construção da equipa. Já Depoitre é um jogador que precisa que construam para ele. Fisicamente é forte, segura bem a bola, é bom de cabeça. Mas não lhe peçam para ganhar uma bola nas costas da defesa, para conduzir um contra-ataque, para se destacar no 1x1. Depoitre está lá para tentar encostar o que lhe derem. Mas isso não pode ser a mesma coisa que jogar exclusivamente para a pontaria de um ponta-de-lança, coisa que o FC Porto não faz desde os tempos de Jardel. Esse não será nunca o caminho.

E agora? Agora é esperar que as bolas cheguem a Depoitre e que chamar-lhe «tronco» seja uma coisa positiva.

PS: Post publicado antes do FC Porto informar que Depoitre não pode jogar o play off da Champions.

domingo, 7 de agosto de 2016

Não desistam da Paciência

Os talentos de hoje nem sempre são os de amanhã. Mas muitas vezes, o que separa a promessa da concretização é uma simples oportunidade. André Silva está a tê-la e a aproveitá-la, e agora percebem o porquê deste post, de julho de 2014, em que O Tribunal do Dragão defendia como prioridade segurar André Silva para o futuro.

O futuro já chegou, e agora André Silva é o ponta-de-lança do presente. Neste caso, não se trata do presente para António Teixeira, mas sim para a época 2016-17 do FC Porto, na qual André Silva está pronto para ser o 9, apesar de ter ficado com a camisola 10, honrando o antigo ídolo Deco. 

Mas não é de André Silva que falamos desta vez, mas sim de Calleri, atualmente nos Jogos Olímpicos e que fez um bonito golo na sua estreia. Ups, afinal não foi Calleri, foi Gonçalo Paciência a marcar. Mas o que se diria se aquele golo tivesse sido de Calleri? 

É interessante que, nos habituais plantéis virtuais que os adeptos formam e partilham em fóruns e redes sociais nas pré-épocas, Calleri tenha sido um nome muito utilizado. Provavelmente, muitos não o incluiriam se o seu nome não tivesse aparecido na imprensa. Mas o mais inquietante é que muitos o admitam apesar do valor exigido pelos investidores por Calleri: 20 milhões de euros, fosse por transferência ou empréstimo com opção de compra.

Calleri, que vai para o West Ham, e Gonçalo Paciência são jogadores de caraterísticas totalmente distintas. Mas é apenas um dado indicativo do quão pode ser diferente o tratamento/expetativa em relação a um jogador que chega, por exemplo, da América do Sul e outro que venha da formação.

Não é que o FC Porto não tenha tido grande sucesso no recrutamento de avançados sul-americanos - ninguém recusaria um Lisandro, um Falcao ou um Jackson -, mas a diferença é notória. O avançado estrangeiro tem o direito a ser muito caro, a ter período de adaptação e entrar em plantéis virtuais quando muitos nem sequer o viram jogar além de um best-off no Youtube. O jogador da formação não tem essa sorte.

Se calhar, alguns esperavam que Gonçalo Paciência chegasse a uma Académica ultradefensiva, mal trabalhada a todos os níveis, e que marcasse 20 golos. Quiçá os mesmos que iam torcendo o nariz em relação a André Silva até à final da Taça de Portugal. Nada se consegue sem paciência... e sem o contexto correto. 

Apesar da afirmação de André Silva, o FC Porto continua a necessitar de mais um ponta-de-lança, sem dúvida - e se Aboubakar sair, então poderão ser dois. É verdade que a juventude de André Silva recomenda uma alternativa mais experiente, mas a bem da verdade não é tarefa fácil contratar um avançado já mais rotinado, que garanta 15 ou 20 golos por época e que não venha ganhar mais do que André Silva. Isto além de ter que ser uma solução simultaneamente capaz de aceitar o banco enquanto dê garantias a titular. Um Aboubakar confiante e sem o bloqueio psicológico resolveria muitos problemas (o facto de ter sido apresentado, ao contrário de Indi, indicia que ficará no plantel se não houver uma boa proposta)... E aí, porque não Gonçalo Paciência?

De facto, há que compreender as caraterísticas de Gonçalo Paciência. Ao contrário de André Silva, Gonçalo não é jogador para receber a bola em profundidade, descair para os flancos e assumir o 1x1 ainda longe da grande área. Os jogos de pré-época deixaram claro que Nuno vai pedir isso aos avançados (o FC Porto vai ter menos posse de bola, controlar menos os jogos e depender mais da aceleração no último terço do terreno, tipo de futebol que não é propriamente o cartão de visita das equipas que têm ganho campeonatos).

Gonçalo não é um ponta-de-lança muito veloz, como nunca o foram Ibrahimovic, Sheringham ou Berbatov. Se lhe pedirem para jogar em profundidade, vai ter sempre dificuldade. Gonçalo tem um perfil diferente. Tem que jogar mais perto da grande área, com menor amplitude de jogo, pois Gonçalo é fortíssimo a segurar a bola, de costas para a baliza, a descobrir os espaços em drible curto e em arrastar os defesas. É forte fisicamente, tem um remate potente e ótimo no jogo aéreo. Gonçalo Paciência precisa de uma equipa que o «deixe» jogar mais perto da grande área... mas o FC Porto de Nuno Espírito Santo parece necessitar de avançados mais velozes e móveis.

Ainda assim, e cada vez mais no futebol português, haverá alturas em que os avançados terão que encostar aos centrais, bem perto da grande área, e aí faria todo o sentido confiar em Gonçalo Paciência. É curioso que Pepijn Lijnders, que trabalhou Gonçalo no Projeto Jogador de Elite, tenha dito isto sobre ele: «É um jogador capaz do impossível, que por vezes falha mais no possível». É uma grande verdade. Gonçalo Paciência é um jogador capaz de inventar a mais incrível jogada, coisas que a maioria dos avançados não consegue fazer, mas depois tem faltado o tal killer instinct. Mas trabalhar avançados para encostar é bem mais fácil do que ter o talento nato que Gonçalo tem, a capacidade de inventar quando os jogos estão fechados.

Se tivesse um toque mais hispânico no nome, um Gonzalo Paciencia, viesse da América do Sul e alguém tivesse compilado o seus melhores momentos e publicado um vídeo no Youtube com o título «El Nuevo Ibrahimovic», se calhar fazia correr mais água na boca. Mas sendo portista e nosso, o que deveria contribuir para haver ainda mais confiança, parece haver o sentido contrário.

Depois dos Jogos Olímpicos, sabe que tem as portas do seu «pai no futebol», Nuno Capucho, abertas no Rio Ave. Mas que ninguém pense em fechar-lhe as do FC Porto, seja nesta época ou na próxima. Fica o conselho, o mesmo sobre André Silva há dois anos. Basta ter um pouco de Paciência.

sábado, 6 de agosto de 2016

Loucura

Vamos à matemática. Quanto dá loucura x 10? É a conta que se impõe depois do FC Porto ter, no treino aberto aos adeptos, conseguido colocar quase 20 mil portistas no Dragão, apesar da pré-época estar a ser, na sua globalidade, mal preparada e gerida. Não necessariamente no plano técnico-tático, mas na construção e redefinição do plantel, com o efeito dominó resultante da ausência de vendas e da queda de receitas na UEFA.

Ter 20 mil portistas em apoio aos jogadores e ao treinador, nesta fase, é louvável. Poderíamos dizer que foi uma «loucura azul», mas isso seria mentir. «Loucura» foi quando o jornal A Bola se rendeu aos «milhares de adeptos» presentes no treino aberto do Sporting. E por milhares, entenda-se pouco mais de 2 mil.



Mas a «loucura» pode significar muito mais. «Loucura» foi quando o Benfica, que ao contrário do FC Porto atravessa um dos melhores períodos do seu historial, abriu as portas aos adeptos. E neste caso, por loucura entenda-se isto, segundo o JN: «Cerca de 2700 adeptos».


Portanto, se ter 2000 ou 2700 adeptos num treino é uma «loucura», o que dizer de 20 mil? Mais: os que foram ao Dragão não foram movidos por vitórias ou por uma boa fase do FC Porto. Foram adeptos que querem começar já a puxar pela equipa para a nova época. Neste caso, não é a equipa a puxar pelos adeptos, é o contrário.

É mais que óbvio que, à 3ª jornada do campeonato, as opiniões dos portistas já serão revistas, seja pela negativa ou pela positiva. É sempre assim. Nuno Espírito Santo, não deixando nunca de ter sido uma aposta de enorme risco, tem sido genericamente bem acolhido pela massa adepta, mas no final de agosto, depois do jogo com o Sporting e do playoff com a Roma, já haverá muita gente a mudar de opinião. Para o bem ou para o mal.

Não é fácil preparar uma época com tantas indefinições. Os adeptos não podem nunca ser insensíveis ao facto de treinador e jogadores não terem culpa do atraso na (re)definição do plantel (no caso do treinador, não pode dispensar um jogador se não tiver garantias de que virá outro). Agora só podemos contar com uma coisa: é com este treinador, e com estes jogadores, que o FC Porto terá que se bater para tentar entrar na fase de grupos da Liga dos Campeões.

Não vale a pena pensar em reforços-surpresa hoje ou em contratações-relâmpago até segunda-feira. É com quem já cá está que o FC Porto terá que tentar bater a Roma, favorita - aquela palavra que o FC Porto aprendeu a ultrapassar na sua história - para o playoff.

Nuno Espírito Santo, por mais limitações que possa ter, já tem que saber com que o 11 o FC Porto vai começar a luta contra a Roma. É impensável que um jogador seja contratado e que, com 1 ou 2 treinos, entre logo para um playoff - a não ser que se tratasse de alguém que já trabalhou com NES e que saiba o que o treinador quer.

Isso não invalida em nada a má preparação da SAD desta época. Pinto da Costa assumiu, no início de abril, que a época anterior tinha acabado e que os jogadores estavam numa espécie de «pré-época» para esta temporada. Cinco meses depois, a uma semana do arranque da época, o FC Porto não só tem posições carenciadas como não conseguiu nenhuma venda relevante.

O plantel foi avisado, no início de abril, que a preparação para a época 2016/17 já tinha começado. Mas talvez tivesse sido boa ideia afixar o mesmo aviso na SAD.

E agora? Agora vamos com as armas que temos. É o ideal? À partida não. Mas se Pinto da Costa afirmou que «já todos perceberam que esta será uma equipa à Porto», então não temos motivos para estar preocupados. A Roma que se cuide, pois Pinto da Costa não é senhor de se limitar a chavões e frases de ordem só para apaziguar as águas. Pois não? Isso sim, seria uma «loucura».

quinta-feira, 4 de agosto de 2016

Três semanas depois

Três semanas após o último post, as contas do plantel do FC Porto só tiveram subtrações. Desde a confirmação da compra de Alex Telles, Nuno Espírito Santo tem passado as semanas e jogos de pré-época a riscar quem considera que não serve, quem realmente não serve, a treinar quem no dia seguinte poderá já não estar no clube e à espera de reforços seus.

Não surpreende, na medida em que era facílimo prever, através do orçamento projetado para a última época e do R&C do terceiro trimestre, que não haveria compras significativas no FC Porto enquanto não houvesse vendas (desde a saída de Alex Sandro que o FC Porto não gera uma mais-valia considerável). É normal que os adeptos questionem, então, como é que Alex Telles e Felipe chegam por mais de 12M€. Simples, negócios com condições específicas, só possíveis através de determinado parceiro. E esperamos que, com a chegada de Alex, a defesa do FC Porto não se torne numa escola de samba, como dizia Pedroto.

De certa forma, até também por ser tratar de uma operação ligada ao BMG (em forma nesta pré-temporada), fazem lembrar o caso de Otávio, um dos jogadores que mais têm agradado na pré-temporada. Otávio assinou contrato no final de agosto de 2014, mas no seu primeiro ano não custou um cêntimo ao FC Porto. Assinou não porque a SAD tivesse disponibilidade para investir no jogador naquele momento (até porque não era um pedido do treinador), mas porque permitia assegurar desde logo um miúdo com talento, sem grandes implicações financeiras no ano que se seguia (algo que por vezes pode correr mal, como foi o caso com Adrián López, mas estava em causa um valor bem mais reduzido), e negociando com parceiros habituais. 

Entretanto, no segundo trimestre de 2015-16, a SAD pagou os 2,5M€ (correspondentes a 33% do passe - a SAD tem agora 32,5%) ao Coimbra Esporte Clube, clube usado pelo BMG para transferir jogadores. Otávio não deixará nunca de ser um jogador caro (os 2,5M€ por 33% do passe não significam que o jogador estava avaliado em 7,5M€ - era ainda mais caro, pois a opção de compra de mais 35% do passe é de 5M€), mas foi um exemplo de um negócio sem custos imediatos, conseguido só através de determinada parceria.

Além de Felipe e Alex Telles, só Miguel Layún foi comprado para a nova época (João Carlos Teixeira, uma aposta interessante, chegou a custo zero e Zé Manuel, o dono da velocidade vertiginosa, foi uma contratação que só pode envergonhar quem o levou para o FC Porto). A opção de compra por Layún previa que o FC Porto teria que pagar 3M€ agora e mais 3M€ até o final de 2016-17. Valia bem o investimento, tendo em conta que o FC Porto já poderia ter lucrado com Layún (numa espécie de Iturbe-Hellas-Roma). Se não o fez, é porque tem bons planos para o jogador.

De resto, ainda não houve compras, mas houve saídas de jogadores que haviam sido anunciados como reforços. Depois de Rafa, foi a vez de Josué e Hernâni receberem guia de marcha, deixando assim Otávio como o único jogador prometido por Pinto da Costa que vai, de facto, integrar o plantel principal. E não deixa de ser (pausa para encontrar a palavra mais apropriada)... Discutível como é que, da equipa do FC Porto B que ganhou a Segunda Liga, não há nenhum jogador promovido definitivamente à equipa A (Chidozie e André Silva foram promovidos a meio da última época).
Contrato até 2019

Mas as dispensas mais recentes - Josué, Hernâni e Quintero - merecem uma análise mais profunda. Começando por Hernâni, jogador cuja contratação ao Guimarães foi na altura avaliada negativamente pel'O Tribunal do Dragão, por considerar que Hernâni estava para aquele Guimarães como Licá estava para o Estoril. Assim foi, sem surpresa, pois Hernâni nunca revelou ter caraterísticas para jogar no FC Porto, nem para valer o investimento de mais de 3M€. Há muitos portistas que tinham/têm algum apreço por Hernâni, mas talvez por de facto nunca ter tido assim tantas oportunidades. Ainda assim, não é surpresa nenhuma que esteja desde já condenado a empréstimos sucessivos. O FC Porto, em alguns casos, tem-se deixado entusiasmar muito por pouco com alguns jogadores em Guimarães. Assim foi com Tiago Rodrigues, assim foi com Hernâni. Que não se volte a cometer o mesmo erro já neste mercado.

Contrato até 2017
O caso de Josué também tem um desfecho previsível, mas por motivos diferentes. É um jogador com qualidade e caraterísticas que são úteis para ser ter num plantel. Mas o FC Porto decidiu prescindir dele, e após três empréstimos diferentes, Josué tem todo o direito de recusar um quarto. E fossem todos assim: não faz sentido o FC Porto andar a renovar sucessivamente com jogadores para os emprestar. Que haja mais Hugos Leais - após meio ano cedido à Académica, percebeu logo que não tinha futuro no FC Porto e quis sair, apesar de ter mais três anos de contrato. E a única coisa que pediu para rescindir foi três lugares no camarote, abdicando de todo o dinheiro que teria a receber. E seguiu o seu caminho. 

Veja-se o exemplo de Mikel, que já tem mais renovações de contrato do que jogos na equipa A. Ou Abdoulaye, que anda desde 2010 a ser emprestado e que voltou a renovar contrato para continuar a rodar por outros clubes. Lá para 2024 deve estar no ponto para resolver os problemas na defesa.

Josué está no seu direito de não querer renovar. Vai fazer 26 anos, já fez três empréstimos, já fez parte do plantel principal e, neste caso, ouviu da boca de Pinto da Costa que iria fazer parte do plantel. Quem tem que decidir quem faz parte do plantel é o treinador, não é o presidente, mas Josué cresceu num FC Porto em que a palavra de Pinto da Costa sempre foi sagrada e suprema. Se ouve o presidente garantir-lhe um lugar no plantel e acaba dispensado, é normal que não sinta motivação em renovar. Josué, provavelmente, nunca conheceu um FC Porto em que a palavra de Pinto da Costa não fosse cumprida. 

Se marcou na final da Taça, a culpa foi de quem o deixou ir para Braga, pois um jogador, quando está em campo, defende a camisola que tem vestida, não o clube que tem o seu passe. Josué poderia ser útil ao plantel, embora dificilmente tivesse espaço cativo na equipa titular. Resta tentar garantir o melhor encaixe possível com uma venda imediata - eventualmente garantindo uma parte significativa de uma futura transferência, pois é um jogador que se pode valorizar, e estando a um ano do final do contrato nenhum clube vai querer pagar muito por ele.

E com isto chegamos a Quintero, com vontade de bofetear uma cabeça que não faz jus aos pés que tem. Nuno Espírito Santo tentou, mas Quintero não quer saber. Sobra a questão: como é que, desde 2013, houve tanta incapacidade em antecipar que Quintero era um caso perdido e o porquê de tanto investimento progressivo num jogador que não correspondia?

Contrato até 2021
O caso mais preocupante já nem é a compra dos restantes 50% do passe, por 4,5M€, durante a curta (e única) boa sequência de jogos que Quintero fez com Lopetegui. O problema foi, em janeiro, renovar com Quintero por mais 4 anos, para ele logo depois ser afastado pelo Rennes. Foram cerca de 10M€ investidos num jogador sem retorno. E a renovação de contrato já não vai ao encontro da teoria da proteção do investimento, pois a SAD já pagou tudo o que tinha a pagar por Quintero. Concluir que Quintero não ia a lado nenhum era algo que deveria ter acontecido antes de se renovar por mais 4 anos e ter mais despesas com uma renovação de contrato, não depois de se ter reforçado, por duas vezes, o investimento nele.

E agora? O que se faz a um jogador com contrato por mais 5 anos que desperdiçou todas as oportunidades que lhe foram dadas no FC Porto? Dá para garantir royalties com todos os CDs de reggaeton que lançar até 2021? Já se recuperava uma parte do investimento. Neste caso, neste momento não resta mais do que tentar recuperar tanto quanto possível o investimento feito em Quintero. Até lá, metam-lo a dar voltas ao Olival e liguem o sistema de rega. Pode ser que a cabeça refresque.

Pergunta(s): Concordam com o afastamento de Quintero, Josué e Hernâni? Que temas gostariam de ver serem abordados nos próximos posts?

quinta-feira, 14 de julho de 2016

Velocidade vertiginosa

É mais ou menos consensual que falta um extremo ao plantel do FC Porto para atacar a época 2016-17. Um extremo, ou o extremo. Mas que falta ali alguém, falta. Agora imaginemos que era possível contratar um extremo com as seguintes caraterísticas:

a) Alta velocidade;
b) Dono de assinaláveis recursos técnicos;
c) Muito destemido no momento de arriscar o um-contra-um;
d) Faz habitualmente a diferença;
e) Aparece com sucesso em zonas de finalização.

Parece, sem dúvida, interessante. Agora imaginemos que esse extremo já estava no plantel do FC Porto. E não se trata de Brahimi, Corona ou Varela. Trata-se de Zé Manuel, pois foi com todas estas caraterísticas que o reforço jogador contratado a custo zero foi apresentado no site do FC Porto, com destaque para esta frase: «Se o sistema da carta de condução por pontos se aplicasse nos relvados, Zé Manuel já teria perdido muitos por excesso de velocidade».

Sami  Zé Manuel
Nenhum portista vai poder ver essa velocidade vertiginosa de Zé Manuel no Dragão, pois já foi, sem qualquer tipo de surpresa, dispensado. Desde do primeiro dia que toda a gente sabe que Zé Manuel iria ser dispensado. Não é uma questão de adaptação, de esperar para ver, de afirmação tardia, de utilidade, de oportunidade de negócio... É simplesmente um jogador sem qualidades para jogar no FC Porto. E isso estava aos olhos de toda e qualquer pessoa que visse jogos do Boavista. Ou, pelos vistos, nem de todas. 

Ninguém, ninguém acerta nas análises a todos os jogadores. Mas há casos tão flagrantes, tão claros, que choca que possam ver o contrário. Não é por acaso que nunca ninguém imaginou que o FC Porto tivesse uma dupla de centrais formada por Sérgio Lomba e Alfredo Bóia. 

De todos os aspetos que possam tentar justificar esta contratação, nenhum se enquadra no campo desportivo. É até de questionar o porquê de Felipe e João Carlos Teixeira terem tido direito a apresentação no Dragão, com direito a foto com o presidente. Já Zé Manuel não teve direito ao mesmo tratamento. Apareceu por lá no primeiro treino, discretamente. Indisponibilidade do presidente para se apresentar ao lado de Zé Manuel (neste caso, Alex Telles não teve a companhia do presidente por Pinto da Costa estar de férias)? Ou ninguém se quis mostrar ao lado desta contratação?

Estamos a falar de um jogador que teve um contrato de cinco anos quando até tinha dificuldades para se impor numa equipa cuja concorrência era Luisinho ou Renato Santos. Quem achou que Zé Manuel era jogador para o FC Porto? Só resta uma teoria possível: era um pedido de José Peseiro e, com a saída do treinador, o Zé Manuel ficou ali caído nos braços. Os portistas questionam qual será então o propósito da contratação de Zé Manuel. Ou então o propósito terá sido cumprido no dia da assinatura do seu contrato.


Entretanto o FC Porto confirmou a contratação de Alex Telles. E é interessante ver a forma como o brasileiro se descreveu nas apresentação: um «lateral de vocação ofensiva», que sobressai nas «assistências, cruzamentos e nas bolas paradas». Ou seja, esta descrição é perfeita para... Miguel Layún.

Bom. Necessário?
Como se pode então enquadrar esta compra? É sabido que Nuno Espírito Santo prefere que os seus laterais deem profundidade, em vez de procurarem o jogo interior. Ora um dos pontos fortes de Layún é o jogo interior, o que faz com que Layún nunca vá conseguir exibir à direita a influência, em termos ofensivos, que tem quando joga à esquerda, por ser destro. Alex Telles (cujo custo leva o FC Porto, uma vez mais, a bater recordes - é a 4ª maior venda da história do Galatasaray, que nunca tinha vendido um defesa por tanto dinheiro) representa um perfil diferente, que se enquadra mais no que deseja o treinador.

Alex Telles é um lateral bastante razoável, de qualidade, uma boa opção. É muito rápido, sobe bem, apoia bem o extremo, progride com bola e procura a linha. E é um jogador que já está no mapa do FC Porto há 3/4 anos, na altura quando a Juventude, em parceria com o banco BMG, já negociava outros voos para o lateral, referenciado como possível sucessor de Alex Sandro. Ou seja, não é nenhuma descoberta de Nuno Espírito Santo, pois é um jogador já há muito conhecido pelo FC Porto. 

Mas embora que seja um jogador que cruza razoavelmente bem, Alex Telles faz poucas assistências e é um lateral que não tem golo (Layún marcou e assistiu mais esta época do que Alex em toda a sua carreira). Não é muito forte fisicamente e, por vezes, falta-lhe alguma agressividade e maior critério a soltar a bola. Terá capacidade para dar mais do que Layún deu em 2015-16? 

Até porque Alex Telles, quando se apresenta, destaca sobretudo o seu papel no ataque, não defensivamente. E há muitos portistas que consideram que Layún, defensivamente, não dá garantias. Resta torcer para que, no final da época, não estejamos a dizer o mesmo sobre Alex Telles: bom a atacar, inseguro a defender. 

Embora seja uma boa contratação, o timing lança naturalmente dúvidas. Isto porque a posição de lateral-esquerdo era das poucas que não estava carenciada no plantel. O FC Porto já estava servido, e bem, com Layún e Rafa (que sai depois de ter sido garantido, pelo presidente, que faria parte do plantel). Logo, se a SAD ainda vai investir 6,5M€ num lateral-esquerdo, escolham uma das quatro: a) má gestão de recursos; b) precaver uma venda de Layún a curto ou médio prazo; c) falta de confiança em Rafa; d) não falta dinheiro à SAD, por isso até pode começar por gastar 6,5M€ numa posição que não está carenciada. 

O FC Porto decidiu avançar para a compra de Layún no final de maio, numa altura em que já se limavam as arestas para que Nuno Espírito Santo fosse o novo treinador do FC Porto. Logo, comprando nessa altura Layún, o FC Porto já tem que saber que planos Nuno teria para ele no plantel. A contratação de Alex Telles não pode mudar nada.

Rafa era, é, um projeto perfeito para pegar de estaca no FC Porto. Vai jogar um ano no Rio Ave, um bom clube para rodar (mãos à obra, mister Capucho), embora considere que já estaria pronto para integrar e ter responsabilidades no plantel principal.

Só tem 4 meses de primeira liga, sim. É pouco? Bem, imaginemos que em 2009 o FC Porto teria achado o mesmo em relação a Cissokho. Não teria preenchido uma grande carência no plantel (na altura a concorrência era fraca, com Benítez e Lino - havia Fucile para jogar à esquerda); não teria tido um papel importante na luta pelo título; não teria feito jogaços contra Atlético e Manchester na sua estreia na UEFA; e não teria saído por 15M€. 

Com a diferença que Cissokho tinha pouca experiência de futebol sénior, sem grande percurso nos escalões de formação, enquanto Rafa está há anos, época após época, a demonstrar que tem tudo para ser o lateral do futuro. Oxalá que o futuro esteja reservado para o final da época, pois o presente já bateu à porta.

Boas vindas a Alex Telles, boa sorte a Rafa e felicidades a Zé Manuel, que nunca poderá deixar de estar grato o suficiente a quem o levou a assinar pelo FC Porto. Quem o fez viu o que mais ninguém viu e que ninguém chegará a ver. Velocidade vertiginosa, só mesmo na rapidez com que recebeu guia de marcha. 

sexta-feira, 8 de julho de 2016

Um crime, disse Bruno de Carvalho

«É crime assediar um jogador que tem contrato». Estas sábias palavras pertencem ao presidente do Sporting, Bruno de Carvalho, proferidas em 2013 a propósito de Bruma, que tinha contrato.

Na altura, Bruma estava a ser assediado por outros clubes. Um direito que não assistia a esses clubes, pois era um jogador com contrato com o Sporting. 


E hoje somos surpreendidos pela afirmação do jornal O Jogo, que diz que o Sporting já abordou Helton e que o guarda-redes até já teve conhecimento do salário que lhe seria proposto em Alvalade. 

Podemos citar novamente Bruno de Carvalho: «Eu vou lendo os jornais. Umas coisas devem ser mentira e outras verdade». Mas para os mais esquecidos, cá vai: Helton tem contrato com o FC Porto até 2017. Ainda que não faça parte do plantel, é um profissional com contrato com o FC Porto.

Contrato até 2017
Logo, se o Sporting abordou diretamente Helton sem a autorização devida do FC Porto, então, citando Bruno de Carvalho, cometeu «um crime». 

Não é raro ver jogadores saírem do FC Porto para o Sporting, como foram exemplo Fernando Gomes, Jaime Pacheco ou António Sousa, ou até Rui Jorge ou Hélder Postiga. Em comum, têm todos isto: não tiveram um décimo do sucesso que Augusto Inácio, Paulo Futre ou João Moutinho tiveram após terem trocado o Sporting pelo FC Porto (como Pacheco e Sousa no seu regresso em 86). 

Mas Helton só sai se o FC Porto deixar. A partir do momento em que Helton for um jogador livre, pode jogar onde quiser, de acordo com a sua própria consciência. Mas enquanto está sob contrato com o FC Porto, é o clube quem tem a palavra. 

E se o Sporting quiser, então apresentem lá uma proposta. Certamente que seria uma mais-valia, com muito para ensinar. Afinal Helton foi 7 vezes campeão pelo FC Porto, mais do que o Sporting nas últimas 5 décadas; numa só época ganhou tantos títulos europeus com o Sporting em toda a sua história; e sozinho, tem mais títulos de campeão nacional que todos os jogadores do Sporting juntos. 

Sem dúvida, um poço de experiência... e com contrato com o FC Porto. Se o Sporting contactou Helton sem autorização do FC Porto, cometeu «um crime». Se o quiser, então paguem.

Jornal O Jogo, 08-07-2016

sexta-feira, 1 de julho de 2016

Não há cláusula para a mística

Pela terceira vez em 5 anos, a SAD fechou uma época financeira com prejuízo. Depois dos 35,7M€ de 2011-12 e dos 40,7M€ em 2013-14, intercalados com resultados positivos de 20,3M€ em 2012-13 e 19,3M€ em 2014-15, a SAD vai voltar a apresentar um dos prejuízos mais elevados da sua história. 

Por norma, o FC Porto não se pronuncia sobre os resultados financeiros no fecho imediato da época. Por isso, o balanço só deverá ser feito em outubro, e isso inclui o enquadramento do fair-play financeiro, sobre o qual há muito ninguém do FC Porto se pronuncia. Embora só em outubro se devam conhecer os números finais do Relatório e Contas da época 2015-16, já é possível prever uma parte significativa. 

A venda de jogadores no período de 2015-16 foi francamente negativa. O FC Porto chegou ao último trimestre com apenas 29,98M€ dos 72,59M€ necessários nos resultados com transações de passes de jogadores. Faltavam à partida 42,6M€, e o FC Porto não comunicou ao mercado nenhuma venda relevante durante os últimos três meses.

Ou seja, a única boa venda declarada no período de 2015-16 acabou por ser Alex Sandro, que saiu no mercado de verão e gerou uma mais-valia de 21,3 milhões de euros. O FC Porto precisava de vender até 30 de junho, não o fez (o FC Porto não comunicou, ainda, a venda de Maicon, portanto ou a venda ainda não foi totalmente fechada ou a SAD considerou que o valor gerado não era relevante para o mercado), e os resultados estão - melhor, estarão em outubro - à vista. 

A insuficiência na rúbrica de venda de jogadores junta-se aos 15,73M€ que já estavam em falta face ao orçamento de 2015-16 nas receitas da UEFA. Tendo em conta que a SAD já fechou o terceiro trimestre com prejuízo de 37,904M€ e a atividade trimestral da SAD não é, por norma, autossustentável, por as receitas operacionais serem sempre inferiores aos gastos (e com o agravamento de não termos o prémio de 12M€ da UEFA que deveria entrar no último trimestre), o prejuízo será elevadíssimo.
Deixem-lo chamar
Dito isto, recuperemos o tema que marcou o último dia. O Jogo noticiou que o mercado (infelizmente não era o Bolhão) chamava por Rúben Neves: O Tribunal do Dragão fez a coisa mais simples do mundo, que foi colocar uma citação de Pinto da Costa, a propósito dos planos para Rúben Neves no FC Porto, sem acrescentar comentários ou considerações. A partir daqui, multiplicaram-se os comentários e as considerações. Todos na caixa de comentários, nenhum no texto do blogue. Conclusivo.

Mas podemos entrar na discussão: o que poderia significar uma venda de Rúben Neves? Certamente que não faltariam motivos válidos para defender a sua saída. Se algum dia acontecer, não faltará quem lembre que rende mais dinheiro do que Paredes, Costinha, Paulo Assunção e Fernando, seus antecessores, juntos; que nunca foi verdadeiramente um titular indiscutível no FC Porto; que é mais importante manter Danilo; que o FC Porto é, e sempre foi, um clube vendedor e exportador, que depende sucessivamente da venda de jogadores e refaz ciclicamente o plantel. 

Não concordar não significa deixar de compreender. Mas neste caso, a saída de Rúben Neves não poderia acontecer. Por estas palavras:

«Espero que ele fique muitos anos no FC Porto. O Rúben tem contrato até 2019 e não até 2017, como por vezes vejo escrito, e nós gostaríamos de o manter no clube, como uma espécie de João Pinto. Ou seja, que ele fosse um símbolo da transmissão da mística por várias gerações. Nunca quererei que saia do FC Porto». Isto não é um recado ao mercado. Isto não é um o FC Porto só vende pela cláusula. Não é um se faltar um euro para a cláusula do Quaresma, eu meto esse euro. Pinto da Costa não estava a falar para os compradores. Estava a falar para os portistas. 

Sim, objetivamente, se Rúben Neves rendesse mais dinheiro do que Paredes, Costinha, Paulo Assunção ou Fernando juntos seria fantástico. Sendo um talento de enorme futuro, nunca foi um titular verdadeiramente indiscutível; não esteve numa base de um FC Porto campeão. Mas com 19 anos, seria suposto o quê?

A permanência de Rúben Neves era essencial. Pinto da Costa prometeu que o FC Porto, com o novo contrato de direitos televisivos, iria apostar num modelo de continuidade de jogadores, ao invés de contratar já a pensar na saída. E apresentou Rúben Neves como a bandeira para passar a mística, como novo João Pinto. Não podia, por isso, nunca sair ontem. Nem amanhã. Nem a 31 de agosto. 

Capitão João Pinto
Por um momento, imaginem que na história do FC Porto não há o João Pinto a levar pedrada no Jamor (vídeo para os mais confusos); não há o João Pinto agarrado à Taça dos Campeões Europeus; não há o João Pinto para levantar a Intercontinental e a Supertaça Europeia; não há o João Pinto que ganhou 9 campeonatos; não há o João Pinto que é o recordista de jogos pelo FC Porto. Imaginem que João Pinto tinha saído aos 19 anos.

Não sabemos se Rúben Neves conseguirá, algum dia, ter o sucesso que João Pinto teve no FC Porto. Não sabemos se algum jogador, algum dia, o terá. Mas sabemos que Rúben Neves foi apresentado como sucessor de João Pinto na mística e história do FC Porto, pela palavra do presidente. Não há milhões que paguem a história do FC Porto. E Rúben Neves ainda mal começou a escrever a sua história no FC Porto. 

A época 2016-17 será a primeira de Rúben Neves enquanto futebolista sénior. Com a mesma idade, João Pinto ainda nem se tinha estreado, e só à sua sexta época de sénior João Pinto conquistou o primeiro campeonato pelo FC Porto. Rúben Neves não é João Pinto, mas poderá começar a ganhar bem mais cedo. Que Rúben Neves seja um dos alicerces do sucesso desportivo do FC Porto e não um ativo para tapar buracos nas contas SAD. A mística não tem cláusula de rescisão.